sábado, 18 de março de 2023

 QUARESMA PASSO A PASSO - 2023 

Semana IV da Quaresma 

Domingo IV – 19/03/2023

EVANGELHO – Forma longa  –  Jo 9, 1-41     

"«Vai lavar-te à piscina de Siloé»; Siloé quer dizer «Enviado». Ele foi, lavou-se e ficou a ver."

Em momentos tão “escuros” como os que agora atravessamos, as leituras deste domingo guiam-nos através da Luz, que é o Senhor Jesus. Bem precisamos da Sua luz nestes tempos conturbados! Se, na semana passada, Jesus nos matou a sede, hoje, quando se faz encontro com cada um de nós, revela-se-nos como a Luz, que nos ilumina e conduz até Deus. Só o Senhor é a Luz, só Ele nos pode guiar. Deixemo-nos iluminar por Ele.

Na 1ªleitura (1 Sam 16, 1b.6-7.10-13a) o profeta Samuel deixa-se  guiar por Deus na escolha do ungido do Senhor, David. Só o Senhor sabe quem é cada um de nós, no mais íntimo do seu coração, no mais profundo da sua alma e não olha apenas para o nosso aspeto exterior. Mesmo assim, sabendo do que somos capazes, para o bem e para o mal, ama-nos infinitamente e escolhe-nos no Amor, para O servirmos e n’Ele estarmos ao serviço dos outros.

“Naqueles dias, o Senhor disse a Samuel: «Enche a âmbula de óleo e parte. Vou enviar-te a Jessé de Belém, pois escolhi um rei entre os seus filhos». Quando chegou, Samuel viu Eliab e pensou consigo: «Certamente é este o ungido do Senhor». Mas o Senhor disse a Samuel: «Não te impressiones com o seu belo aspeto, nem com a sua elevada estatura, pois não foi esse que Eu escolhi. Deus não vê como o homem; o homem olha às aparências, o Senhor vê o coração». Jessé fez passar os sete filhos diante de Samuel, mas Samuel declarou-lhe: «O Senhor não escolheu nenhum destes». E perguntou a Jessé: «Estão aqui todos os teus filhos?». Jessé respondeu-lhe: «Falta ainda o mais novo, que anda a guardar o rebanho». Samuel ordenou: «Manda-o chamar, porque não nos sentaremos à mesa, enquanto ele não chegar». Então Jessé mandou-o chamar: era ruivo, de belos olhos e agradável presença. O Senhor disse a Samuel: «Levanta-te e unge-o, porque é este mesmo». Samuel pegou na âmbula do óleo e ungiu-o no meio dos irmãos. Daquele dia em diante, o Espírito do Senhor apoderou-Se de David.”

Na 2ªleitura (Ef 5, 8-14) S.Paulo convida-nos a vivermos como filhos da Luz e a deixarmos que a Luz de Cristo, por nós recebida no Batismo, realize em cada um de nós obras da Luz. Desafia-nos a despertamos e a deixarmos que , nestes dias tão difíceis e negros, a Luz de Cristo ilumine o mundo em que vivemos.

“Irmãos: Outrora vós éreis trevas, mas agora sois luz no Senhor. Vivei como filhos da luz, porque o fruto da luz é a bondade, a justiça e a verdade. Procurai sempre o que mais agrada ao Senhor. Não tomeis parte nas obras das trevas, que nada trazem de bom; tratai antes de as denunciar abertamente, porque o que eles fazem em segredo até é vergonhoso dizê-lo. Mas todas as coisas que são condenadas são postas a descoberto pela luz, e tudo o que assim se manifesta torna-se luz. É por isso que se diz: «Desperta, tu que dormes; levanta-te do meio dos mortos e Cristo brilhará sobre ti».”

No evangelho (Jo 9, 1-41) Jesus, perante os nosso olhos, realiza obras de Amor, obras de Luz: cura um cego de nascença. Ao longo deste evangelho, vemos todo um processo de crescimento, na aproximação e entrega a Deus, por parte deste homem: primeiro, é a cura física, com a perplexidade natural face ao acontecimento; depois, é a força do testemunho perante os fariseus - impressionante o desassombro com que fala do que aconteceu e desafia os "doutores da lei"; por fim, um ato de fé total, reconhecendo Jesus como o Filho de Deus - é o único culminar possível, pois este homem já estava todo entregue a Deus e através dele é o Espírito Santo que se manifesta. Deixemo-nos encontrar por esta Luz de Amor, que é o Senhor Jesus e abramos-lhe o nosso coração, para com Ele progredirmos na fé. 

“Naquele tempo, Jesus encontrou no seu caminho um cego de nascença. Os discípulos perguntaram-Lhe: «Mestre, quem é que pecou para ele nascer cego? Ele ou os seus pais?». Jesus respondeu-lhes: «Isso não tem nada que ver com os pecados dele ou dos pais; mas aconteceu assim para se manifestarem nele as obras de Deus. É preciso trabalhar, enquanto é dia, nas obras d’Aquele que Me enviou. Vai chegar a noite, em que ninguém pode trabalhar. Enquanto Eu estou no mundo, sou a luz do mundo». Dito isto, cuspiu em terra, fez com a saliva um pouco de lodo e ungiu os olhos do cego. Depois disse-lhe: «Vai lavar-te à piscina de Siloé»; Siloé quer dizer «Enviado». Ele foi, lavou-se e ficou a ver. Entretanto, perguntavam os vizinhos e os que antes o viam a mendigar: «Não é este o que costumava estar sentado a pedir esmola?». Uns diziam: «É ele». Outros afirmavam: «Não é. É parecido com ele». Mas ele próprio dizia: «Sou eu». Perguntaram-lhe então: «Como foi que se abriram os teus olhos?». Ele respondeu: «Esse homem, que se chama Jesus, fez um pouco de lodo, ungiu-me os olhos e disse-me: ‘Vai lavar-te à piscina de Siloé’. Eu fui, lavei-me e comecei a ver». Perguntaram-lhe ainda: «Onde está Ele?». O homem respondeu: «Não sei». Levaram aos fariseus o que tinha sido cego. Era sábado esse dia em que Jesus fizera lodo e lhe tinha aberto os olhos. Por isso, os fariseus perguntaram ao homem como tinha recuperado a vista. Ele declarou-lhes: «Jesus pôs-me lodo nos olhos; depois fui lavar-me e agora vejo». Diziam alguns dos fariseus: «Esse homem não vem de Deus, porque não guarda o sábado». Outros observavam: «Como pode um pecador fazer tais milagres?». E havia desacordo entre eles. Perguntaram então novamente ao cego: «Tu que dizes d’Aquele que te deu a vista?». O homem respondeu: «É um profeta». Os judeus não quiseram acreditar que ele tinha sido cego e começara a ver. Chamaram então os pais dele e perguntaram-lhes: «É este o vosso filho? É verdade que nasceu cego? Como é que ele agora vê?». Os pais responderam: «Sabemos que este é o nosso filho e que nasceu cego; mas não sabemos como é que ele agora vê, nem sabemos quem lhe abriu os olhos. Ele já tem idade para responder; perguntai-lho vós». Foi por medo que eles deram esta resposta, porque os judeus tinham decidido expulsar da sinagoga quem reconhecesse que Jesus era o Messias. Por isso é que disseram: «Ele já tem idade para responder; perguntai-lho vós». Os judeus chamaram outra vez o que tinha sido cego e disseram-lhe: «Dá glória a Deus. Nós sabemos que esse homem é pecador». Ele respondeu: «Se é pecador, não sei. O que sei é que eu era cego e agora vejo». Perguntaram-lhe então: «Que te fez Ele? Como te abriu os olhos?». O homem replicou: «Já vos disse e não destes ouvidos. Porque desejais ouvi-lo novamente? Também quereis fazer-vos seus discípulos?». Então insultaram-no e disseram-lhe: «Tu é que és seu discípulo; nós somos discípulos de Moisés. Nós sabemos que Deus falou a Moisés; mas este, nem sabemos de onde é». O homem respondeu-lhes: «Isto é realmente estranho: não sabeis de onde Ele é, mas a verdade é que Ele me deu a vista. Ora, nós sabemos que Deus não escuta os pecadores, mas escuta aqueles que O adoram e fazem a sua vontade. Nunca se ouviu dizer que alguém tenha aberto os olhos a um cego de nascença. Se Ele não viesse de Deus, nada podia fazer». Replicaram-lhe então eles: «Tu nasceste inteiramente em pecado e pretendes ensinar-nos?». E expulsaram-no. Jesus soube que o tinham expulsado e, encontrando-o, disse-lhe: «Tu acreditas no Filho do homem?». Ele respondeu-Lhe: «Quem é, Senhor, para que eu acredite n'Ele?». Disse-lhe Jesus: «Já O viste: é quem está a falar contigo». O homem prostrou-se diante de Jesus e exclamou: «Eu creio, Senhor». Então Jesus disse: «Eu vim a este mundo para exercer um juízo: os que não veem ficarão a ver; os que veem ficarão cegos». Alguns fariseus que estavam com Ele, ouvindo isto, perguntaram-Lhe: «Nós também somos cegos?». Respondeu-lhes Jesus: «Se fôsseis cegos, não teríeis pecado. Mas como agora dizeis: ‘Nós vemos’, o vosso pecado permanece».”

Senhor, ilumina-me com a Tua Luz. Converte-me Senhor.

O Evangelho de hoje apresenta-nos o episódio do homem cego de nascença, a quem Jesus confere a vista. Esta longa narração tem início com um cego que começa a ver e termina — isto é curioso — com alguns presumíveis videntes que continuam a ser cegos na alma. O milagre é narrado por João em apenas dois versículos, porque o evangelista quer chamar a atenção não apenas para o prodígio em si mesmo, mas para aquilo que acontece em seguida, para os debates que isto suscita; e também para o falatório, pois muitas vezes uma obra, um gesto de caridade provoca murmurações e debates, porque alguns não querem ver a verdade. O evangelista João quer chamar a atenção para aquilo que acontece até nos dias de hoje, quando se realiza uma obra boa. O cego curado é primeiro interrogado pela multidão admirada — viram o milagre e interrogam-no — e depois pelos doutores da lei, que interrogam também os seus pais. No final, o cego curado chega à fé, a maior graça que lhe é concedida por Jesus: não apenas de ver, mas de O conhecer, de O ver como «a luz do mundo» (Jo 9, 5).

Enquanto o cego se aproxima gradualmente da luz, os doutores da lei, ao contrário, afundam cada vez mais na sua cegueira interior. Fechados na sua presunção, já julgam possuir a luz; por isso, não se abrem à verdade de Jesus. E fazem de tudo para negar a evidência. Põem em dúvida a identidade do homem curado; em seguida, negam a obra de Deus na cura, alegando como desculpa que Deus não age aos sábados; chegam até a duvidar que aquele homem fosse cego de nascença. O seu fechamento à luz torna-se agressivo e acaba na expulsão do homem curado para fora do templo.

Ao contrário, o caminho do cego é um percurso por etapas, que começa com o conhecimento do nome de Jesus. Nada mais sabe dele; com efeito, diz: «Aquele homem que se chama Jesus fez lodo e ungiu-me os olhos» (v. 11). A seguir às perguntas insistentes dos doutores da lei, considera-o primeiro um profeta (v. 17) e em seguida um homem que está próximo de Deus (v. 31). Depois de ter sido afastado do templo, excluído da sociedade, Jesus encontra-se novamente com ele e «abre os seus olhos» pela segunda vez, revelando-lhe a sua própria identidade: «Eu sou o Messias», assim lhe diz! Nesta altura, aquele que era cego exclama: «Creio, Senhor!» (v. 38), e prostra-se diante de Jesus. Trata-se de um trecho do Evangelho que mostra o drama da cegueira interior de muitas pessoas, inclusive da nossa, porque às vezes também nós vivemos momentos de cegueira interior.

Às vezes a nossa vida é semelhante à existência do cego que se abriu à luz, que se abriu a Deus, que se abriu à sua graça. Por vezes, infelizmente, é um pouco como a vida dos doutores da lei: do alto do nosso orgulho julgamos os outros, e até o próprio Senhor! Hoje, somos convidados a abrir-nos à luz de Cristo para dar fruto na nossa vida, para eliminar os comportamentos que não são cristãos; todos nós somos cristãos, mas todos nós — todos! — às vezes temos comportamentos não cristãos, atitudes que são pecados. Devemos arrepender-nos disto, eliminar estes comportamentos para caminhar decididamente pela vereda da santidade. Ela tem a sua origem no Baptismo. Com efeito, também nós fomos «iluminados» por Cristo no Baptismo, como no-lo recorda são Paulo, a fim de nos podermos comportar como «filhos da luz» (Ef 5, 8), com humildade, paciência e misericórdia. Aqueles doutores da lei não tinham humildade, nem paciência e nem sequer misericórdia!

Hoje, quando voltardes para casa, sugiro-vos que pegueis no Evangelho de João para ler este trecho do capítulo 9. Isto far-vos-á bem, porque assim vereis este caminho da cegueira para a luz, e a outra senda errada, rumo a uma cegueira ainda mais profunda. Interroguemo-nos: como é o nosso coração? Tenho um coração aberto ou fechado? Aberto ou fechado para Deus? Aberto ou fechado para o próximo? Temos sempre em nós mesmos algum fechamento que nasce do pecado, dos equívocos, dos erros. Não devemos ter medo! Abramo-nos à luz do Senhor! Ele espera-nos sempre para nos levar a ver melhor, para nos dar mais luz, para nos perdoar. Não podemos esquecer isto! Confiemos à Virgem Maria o caminho quaresmal para que também nós, como o cego curado, com a graça de Cristo, possamos «vir à luz», progredir rumo à luz e renascer para uma vida nova.

Papa Francisco

(in ANGELUS, 30 de Março de 2014)

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