sábado, 30 de março de 2024

  DOMINGO DE PÁSCOA DA RESSURREIÇÃO DO SENHOR

Aleluia! Hoje acordamos nosso coração com a maior das esperanças. Porque Ele está VIVO, Ele está aqui no meio de nós, Ele continua a caminhar no meio dos seus. E por isso, como aos discípulos, o nosso coração arde. Hoje é esse dia, em que o coração se enche desse entusiasmo, desse ardor. Porque compreendemos que na Ressurreição de Jesus é a nossa vida que se amplia, é a nossa vida que se ilumina, é a nossa vida que ganha uma outra forma. Ela passa a ser mais de Deus, ela passa a ser o triunfo de Deus.

Uma das antífonas mais repetidas nesta época de Páscoa nos serve como um poderoso contraforte para a fé. É esta: ‘Resurrexit sicut dixit’. Jesus ressuscitou como havia prometido. Também é bom pensar na variação que um copista medieval introduziu, talvez por engano, talvez devido a um esforço de aprofundamento teológico. Deus realmente escreve certo em nossas pobres linhas tortas. Um amanuense escreveu: ‘Resurrexit sicut dilexit’. Ele ressuscitou como amou. Ele ressuscitou não apenas como havia predito a seus discípulos, mas de acordo com a constante qualidade de seu amor. Para aquele Filho “obediente até a morte e a morte da cruz”, Deus permanece fiel com todo o seu amor. E amar é dizer ao outro: você não morrerá. Esta é a garantia de Deus, seu gesto definitivo que recria a história.

Queridos irmãs e irmãos, Aleluia. Como dirá o autor da Carta aos Colossenses: “Nós morremos, e a nossa vida está escondida com Cristo em Deus”, essa vida nova, que agora se vai revelar num tempo novo, marcado por este acontecimento inamovível da história que é a Ressurreição de Cristo.

Sejamos dignos desta verdade, sejamos dignos desta palavra “Aleluia”, que de nenhuma maneira é uma palavra banal, que não é uma palavra das nossas línguas, mas é uma palavra recebida.

A grande palavra humana: “Aleluia!” Aquela certeza de que o alto se fez baixo. E que, tomando, abraçando o rés da terra, de novo se elevou até Deus. Aleluia!

— Cardeal D. José Tolentino Mendonça (Domingo de Páscoa da Ressurreição do Senhor).

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As leituras do Domingo de Páscoa introduzem-nos no mistério maior da nossa fé, a Ressurreição de Jesus. Mergulhados no imenso Amor de Deus, que Seu Filho nos revela, percebemos que a partir da ressurreição de Jesus tudo passa a ser diferente, a vida ganha outro sentido. Sabemos, agora, o quanto somos preciosos para Deus, o quanto Deus ama cada um de nós, a ponto de sermos redimidos pelo Seu Único e Muito Amado Filho. Agora podemos branquear a nossa alma n’Ele, que de braços abertos nos acolhe e estreita contra o Seu peito. Deixemo-nos habitar por este Amor sem fim, para que também os que connosco convivem, ou se cruzam nas estradas da vida, possam sentir-se totalmente amados por Deus.

Na 1ª leitura (At.10,34a,37-43), escutamos Pedro, completamente entregue à missão que Jesus lhe confiou, proclamando a Boa Nova de Jesus ressuscitado com todo o desassombro e coragem, que, só quem se sente verdadeiramente amado pelo Senhor, tem, apesar de  saber os riscos que corria.

“Naqueles dias, Pedro tomou a palavra e disse: «Vós sabeis o que aconteceu em toda a Judeia, a começar pela Galileia, depois do batismo que João pregou: Deus ungiu com a força do Espírito Santo a Jesus de Nazaré, que passou fazendo o bem e curando a todos os que eram oprimidos pelo Demónio, porque Deus estava com Ele. Nós somos testemunhas de tudo o que Ele fez no país dos judeus e em Jerusalém; e eles mataram-n'O, suspendendo-O na cruz. Deus ressuscitou-O ao terceiro dia e permitiu-Lhe manifestar-Se, não a todo o povo, mas às testemunhas de antemão designadas por Deus, a nós que comemos e bebemos com Ele, depois de ter ressuscitado dos mortos. Jesus mandou-nos pregar ao povo e testemunhar que Ele foi constituído por Deus juiz dos vivos e dos mortos. É d'Ele que todos os profetas dão o seguinte testemunho: quem acredita n’Ele recebe pelo seu nome a remissão dos pecados».”

Na 2ª leitura (Col. 3, 1-4) S.Paulo reintroduz-nos no nosso batismo, pelo qual recebemos o Espírito Santo e a garantia da ressurreição. N’Ele somos exortados a viver conforme Jesus nos ensinou, afeiçoando-nos às coisas do alto e não às da terra.

“Irmãos: Se ressuscitastes com Cristo, aspirai às coisas do alto, onde Cristo Se encontra, sentado à direita de Deus. Afeiçoai-vos às coisas do alto e não às da terra. Porque vós morrestes e a vossa vida está escondida com Cristo em Deus. Quando Cristo, que é a vossa vida, Se manifestar, então também vós vos haveis de manifestar com Ele na glória.”

No Evangelho (Jo 20,1-9) acompanhamos, primeiro Maria Madalena e depois João e Pedro na ida ao sepulcro, onde estava depositado o corpo de Jesus. As reações são diferentes, mas, com maior ou menor dificuldade, cada um ao seu jeito, acabam por acreditar que Jesus ressuscitou. Se, para alguns deles, que tinham convivido diariamente com Jesus, foi difícil acreditar que Ele tinha ressuscitado, não admira que, ainda hoje, haja muita gente que não acredite na ressurreição de Cristo. Que, pelo nosso testemunho e oração, testemunhemos que Jesus ressuscitou, está vivo, nos habita por inteiro e que o Seu Amor por cada um de nós não tem fim.

“No primeiro dia da semana, Maria Madalena foi de manhãzinha, ainda escuro, ao sepulcro e viu a pedra retirada do sepulcro. Correu então e foi ter com Simão Pedro e com o outro discípulo que Jesus amava e disse-lhes: «Levaram o Senhor do sepulcro e não sabemos onde O puseram». Pedro partiu com o outro discípulo e foram ambos ao sepulcro. Corriam os dois juntos, mas o outro discípulo antecipou-se, correndo mais depressa do que Pedro, e chegou primeiro ao sepulcro. Debruçando-se, viu as ligaduras no chão, mas não entrou. Entretanto, chegou também Simão Pedro, que o seguira. Entrou no sepulcro e viu as ligaduras no chão e o sudário que tinha estado sobre a cabeça de Jesus, não com as ligaduras, mas enrolado à parte. Entrou também o outro discípulo que chegara primeiro ao sepulcro: viu e acreditou. Na verdade, ainda não tinham entendido a Escritura, segundo a qual Jesus devia ressuscitar dos mortos.” 

Senhor, eu te louvo e bendigo por nos amares tão infinitamente. A ti o louvor a glória a honra e o poder pelos séculos sem fim.

Queridos irmãos e irmãs, Cristo ressuscitou!

Hoje proclamamos que Ele, o Senhor da nossa vida, é «a ressurreição e a vida» (Jo 11, 25) do mundo. É Páscoa, que significa «passagem», porque, em Jesus, realizou-se a passagem decisiva da humanidade, ou seja, a passagem da morte à vida, do pecado à graça, do medo à confiança, da desolação à comunhão. N’Ele, Senhor do tempo e da história, quero, com o coração repleto de alegria, dizer a todos: feliz Páscoa!

Seja ela para cada um de vós, queridos irmãos e irmãs, em particular para os doentes e os pobres, os idosos e quantos atravessam momentos de provação e dificuldade, uma passagem da tribulação à consolação. Não estamos sozinhos: Jesus, o Vivente, está connosco para sempre. Alegrem-se a Igreja e o mundo, porque hoje as nossas esperanças já não se quebram contra o muro da morte, mas o Senhor abriu-nos uma ponte para a vida. Sim, irmãos e irmãs! Na Páscoa, mudaram as sortes do mundo, e hoje (dia que coincide com a data mais provável da ressurreição de Cristo) podemos alegrar-nos de celebrar, por pura graça, o dia mais importante e belo da história.

Cristo ressuscitou, ressuscitou verdadeiramente: como se proclama nas Igrejas do Oriente. O termo verdadeiramente diz-nos que a esperança não é uma ilusão; é verdade! E que, a partir da Páscoa, o caminho da humanidade assinalado pela esperança é percorrido com passo mais rápido. Assim no-lo mostram, com o seu exemplo, as primeiras testemunhas da Ressurreição. Os Evangelhos narram aquela pressa boa com que, no dia de Páscoa, «as mulheres correram a dar a notícia aos discípulos» (Mt 28, 8). E ainda que Maria de Magdala, «correndo, foi ter com Simão Pedro» (Jo 20, 2); e em seguida João e o próprio Pedro «corriam os dois juntos» (20, 4) para chegar ao lugar onde Jesus estivera sepultado. E ao entardecer daquele dia de Páscoa, depois de terem encontrado o Ressuscitado no caminho para Emaús, os dois discípulos «voltaram imediatamente para Jerusalém» (Lc 24, 33) percorrendo a toda a pressa vários quilómetros em subida e na escuridão da noite, movidos pela alegria irrefreável da Páscoa que inflamava os seus corações (cf. 24, 32). A mesma alegria pela qual Pedro, ao ver Jesus ressuscitado nas margens do lago da Galileia, não pôde demorar-se no barco com os outros, mas lançou-se logo à água nadando velozmente ao encontro d’Ele (cf. Jo 21, 7). Em suma, na Páscoa, acelera-se o passo na caminhada que se torna uma corrida, porque a humanidade vê a meta do seu percurso, o sentido do seu destino, Jesus Cristo, e é chamada a apressar-se ao encontro d’Ele, esperança do mundo.

Apressemo-nos, também nós, a crescer num caminho de confiança recíproca: confiança entre as pessoas, entre os povos e as nações. Deixemo-nos surpreender pelo anúncio feliz da Páscoa, pela luz que ilumina as trevas e obscuridades em que demasiadas vezes se encontra envolvido o mundo.

Apressemo-nos a superar os conflitos e as divisões, e a abrir os nossos corações aos mais necessitados. Apressemo-nos a percorrer sendas de paz e fraternidade. Alegremo-nos com os sinais concretos de esperança que nos chegam de tantos países, a começar daqueles que oferecem assistência e hospitalidade a quantos fogem da guerra e da pobreza.

Entretanto, ao longo do caminho, há ainda muitas pedras de tropeço, que tornam árduo e fadigoso este apressarmo-nos para o Ressuscitado. Supliquemos-Lhe: Ajudai-nos a correr ao vosso encontro! Ajudai-nos a abrir os nossos corações!

Ajudai o amado povo ucraniano no caminho para a paz, e derramai a luz pascal sobre o povo russo. Confortai os feridos e quantos perderam os seus entes queridos por causa da guerra e fazei que os prisioneiros possam voltar sãos e salvos para as suas famílias. Abri os corações de toda a Comunidade Internacional para que se esforcem por fazer cessar esta guerra e todos os conflitos que ensanguentam o mundo, a começar pela Síria, que ainda espera a paz. Sustentai quantos foram atingidos pelo violento terremoto na Turquia e na própria Síria. Rezemos por aqueles que perderam familiares e amigos e ficaram sem casa: possam receber conforto de Deus e ajuda da família das nações.

Neste dia confiamo-Vos, Senhor, a cidade de Jerusalém, primeira testemunha da vossa Ressurreição. Expresso profunda preocupação com os ataques dos últimos dias que ameaçam o desejado clima de confiança e respeito mútuo, necessário para se retomar o diálogo entre israelenses e palestinos, de modo que a paz reine na Cidade Santa e em toda a região.

Ajudai, Senhor, o Líbano, ainda à procura de estabilidade e unidade, para que supere as divisões e todos os cidadãos trabalhem, juntos, pelo bem comum do país.

Não Vos esqueçais do querido povo da Tunísia, especialmente dos jovens e daqueles que sofrem por causa dos problemas sociais e económicos, a fim de não perder a esperança e colaborar na construção dum futuro de paz e fraternidade.

Olhai para o Haiti, que há vários anos está a sofrer uma grave crise sociopolítica e humanitária, e sustentai o empenho dos atores políticos e da Comunidade Internacional na busca duma solução definitiva para os inúmeros problemas que afligem aquela população tão atribulada.

Consolidai os processos de paz e reconciliação empreendidos na Etiópia e no Sudão do Sul e fazei cessar as violências na República Democrática do Congo.

Sustentai, Senhor, as comunidades cristãs que hoje celebram a Páscoa em circunstâncias particulares, como sucede na Nicarágua e na Eritreia, e lembrai-Vos de todos aqueles a quem é impedido professar, livre e publicamente, a sua fé. Dai conforto às vítimas do terrorismo internacional, especialmente no Burkina Faso, Mali, Moçambique e Nigéria.

Ajudai o Myanmar a percorrer caminhos de paz e iluminai os corações dos responsáveis para que o martirizado povo roynga encontre justiça.

Confortai os refugiados, os deportados, os prisioneiros políticos e os migrantes, especialmente os mais vulneráveis, bem como todos aqueles que sofrem com a fome, a pobreza e os efeitos nocivos do narcotráfico, do tráfico de pessoas e de toda a forma de escravidão. Inspirai, Senhor, os responsáveis das nações, para que nenhum homem ou mulher seja discriminado e espezinhado na sua dignidade; para que, no pleno respeito dos direitos humanos e da democracia, se curem estas chagas sociais, se procure sempre e só o bem comum dos cidadãos, se garanta a segurança e as condições necessárias para o diálogo e a convivência pacífica.

Irmãos, irmãs, voltemos também nós a encontrar o gosto do caminho, aceleremos o pulsar da esperança, saboreemos a beleza do Céu! Tiremos deste Dia as energias para continuar ao encontro do Bem que não desilude. E, se «o maior pecado – como escreveu um antigo Padre – é não acreditar nas energias da Ressurreição» (Santo Isaac de Nínive, Sermões ascéticos, I, 5), hoje acreditemos! «Sim, temos a certeza: verdadeiramente Cristo ressuscitou» (Sequência). Acreditamos em Vós, Senhor Jesus, acreditamos que convosco renasce a esperança, o caminho continua. Vós, Senhor da vida, encorajai os nossos caminhos e repeti, também a nós, como aos discípulos na noite de Páscoa: «A paz esteja convosco» (Jo 20,19.21)

Papa Francisco

( Mensagem Urbi et Orbi, 9 de abril de 2023)

Jesus está vivo! Ressuscitou! Aleluia!

 

sexta-feira, 29 de março de 2024

QUARESMA PASSO A PASSO

Semana Santa  

2024 - Ano B

Sábado da Semana Santa – dia 40 – 30/04/2024

Sábado Santo, antes da Vigília.

É o terceiro dia do Tríduo Pascal. Na Sexta-Feira Santa, é a Páscoa de Cristo crucificado, no Sábado Santo, a de Cristo no sepulcro, e, no Domingo, a de Cristo ressuscitado.
Para este dia não há nenhuma celebração sacramental prevista. A comunidade cristã só celebra a Liturgia das Horas, com uma especial recomendação de que, neste dia, o povo seja convidado para a oração de Laudes ou do ofício de Leitura (cf. IGLH 210)Todo o dia tem um tom de silêncio contemplativo do mistério de Cristo que baixou «ao lugar dos mortos», ao «descanso» do sepulcro, ao aniquilamento absoluto e ao seu misterioso encontro com os antepassados, onde pregou «aos espíritos que estavam na prisão da morte» (cf. 1Pe 3,19).

No caminho catecumenal, este dia era dedicado aos últimos atos preparatórios da grande noite batismal da Páscoa: os exorcismos, as unções, a «redditio» ou a recitação do símbolo, as renúncias, etc. Com os séculos, foi-se empobrecendo o sentido do Sábado Santo, até que o papa Pio XII, em 1951, reformou a Vigília Pascal e, em 1955, o resto da Semana Santa. Então, restituiu-se a este dia a sua característica primitiva de dia *alitúrgico, devolvendo a Vigília Pascal – que desde o século XVI se celebrava na manhã do sábado, convertendo este dia em «sábado de aleluia» – ao seu lugar verdadeiro, na noite entre o sábado e o domingo. Agora, «a Igreja permanece junto do sepulcro do Senhor, meditando a sua Paixão e morte, abstendo-se da Missa até à solene Vigília ou espera noturna da Ressurreição».

Uma característica muito antiga de Sábado Santo é o jejum pascal: já desde o século II se prolongava também neste dia o jejum de Sexta-Feira Santa, um jejum não tanto penitencial, mas cúltico, «pascal», um jejum que «se celebra». «Tenha-se como sagrado o jejum pascal: a celebrar em toda a parte na Sexta-Feira da Paixão e Morte do Senhor e a prolongar também no Sábado Santo, se for oportuno, para se chegar às alegrias do Domingo da Ressurreição com elevação e abertura de espírito» (SC 110).

José Aldazábal

(in Dicionário Elementar de Liturgia - Secretariado Nacional da Liturgia)

D.Tolentino disse:

Hoje é o dia da nudez, hoje é o dia em que olhamos para as mãos vazias e não temos nada, vale tanto estar aqui como noutro sítio qualquer, nada nos distingue das outras mulheres e dos outros homens da terra. Nenhum sinal nós ostentamos senão as nossas mãos vazias.

Essa é a nossa forma de oração neste dia, este dia e o dia de amanhã são os dias do ano em que não há Eucaristia, em que as Igrejas estão assim, como lugares vazios, como terra desolada. Essa é a lição da cruz.
“Tudo está consumado” quer dizer que se chegou à plenitude, que o destino, que o desígnio se realizou. O que a cruz nos grita, o que a cruz nos diz é: ama até ao fim, ama até ao fim, consuma a tua vida, consuma, realiza, plenifica a tua existência. Não vivas a 50%, a 40%.
Como se leu hoje na Carta aos Hebreus, nós temos um Sumo-Sacerdote capaz de se compadecer dos nossos sofrimentos, porque Ele próprio carregou a nossa culpa, carregou a nossa iniquidade.
Ninguém se sinta só, ninguém se sinta só.
Muitas vezes até nos infernos que escolhemos percorrer é importante sentir que Ele está lá. Uma das frases mais extraordinárias aplicadas a Jesus pela Igreja primitiva e que nós encontramos no Evangelho é dizer: “Ele foi contado entre os malfeitores.” Ele foi contado, éramos um grupo de malfeitores e Ele foi contado entre nós, éramos um
grupo de maldizentes e ele foi contado entre nós, éramos um grupo de miseráveis e Ele foi contado entre nós, éramos um grupo de condenados e Ele foi contado entre nós. Ele está sempre a ser contado entre nós porque é solidário com a fragilidade, com a vulnerabilidade humana. Esta solidariedade de Cristo ajuda-nos a ser, é a âncora, é a mão estendida à nossa humanidade mas é também um desafio a nós ajudarmos Deus.
— Cardeal D. José Tolentino Mendonça (homilia / Sexta-feira Santa, Celebração da Paixão do Senhor).

SEXTA-FEIRA SANTA
«PAIXÃO DO SENHOR»

VIA-SACRA

COLISEU
ROMA, 29 DE MARÇO DE 2024

VIA-SACRA 2024: «Em oração com Jesus, no caminho da cruz»


Introdução

Senhor Jesus, olhamos para a vossa cruz e compreendemos que destes tudo por nós. Dedicamo-Vos este tempo. Queremos passá-lo ao pé de Vós, que rezastes desde o Getsémani até ao Calvário. No Ano de Oração, unimo-nos ao vosso caminho de oração.

Evangelho segundo São Marcos (14, 32-37)

Chegaram a uma propriedade chamada Getsémani (…). Tomando consigo Pedro, Tiago e João, começou a sentir pavor e a angustiar-Se. E disse-lhes: «(...) Ficai aqui e vigiai». Adiantando-Se um pouco, caiu por terra e orou (…): «Abbá, Pai! Tudo Te é possível; afasta de Mim este cálice! Mas não se faça o que Eu quero, e sim o que Tu queres». Depois, foi ter com os discípulos, encontrou-os a dormir e disse a Pedro: «(…) Nem uma hora pudeste vigiar!»

Senhor, preparastes com a oração cada uma das vossas jornadas e agora, no Getsémani, preparais a Páscoa. Abbá, Pai! Tudo Te é possível – dizeis Vós –porque a oração é antes de tudo diálogo e intimidade; mas é também luta e súplica: afasta de Mim este cálice! E é abandono e oferta: mas não se faça o que Eu quero, e sim o que Tu queres. Assim, em oração, entrastes pela porta estreita do nosso sofrimento e atravessaste-la profundamente. Sentistes medo e angústia (cf. Mc 14, 33): medo diante da morte, angústia sob o peso do nosso pecado que experimentastes sobre Vós, enquanto Vos invadia uma amargura infinita. Mas, no apogeu da luta, rezastes «mais instantemente» (Lc 22, 44): assim transformastes a veemência do sofrimento em oferta de amor.

Uma coisa apenas nos pedistes: ficar convosco, vigiar. Não nos pedis o impossível, mas a proximidade. No entanto, quantas vezes me distanciei de Vós! Quantas vezes, como os discípulos, em vez de vigiar dormi, quantas vezes não tive tempo ou vontade de rezar porque cansado, anestesiado pelas comodidades, ensonado na alma. Jesus, repeti novamente para mim, para nós, vossa Igreja: «Levantai-vos e orai» (Lc 22, 46). Acordai-nos, Senhor, despertai-nos do torpor do coração, porque também hoje, sobretudo hoje, precisais da nossa oração. 

1. Jesus é condenado à morte

O Sumo Sacerdote ergueu-se no meio da assembleia e interrogou Jesus: «Não respondes nada ao que estes testemunham contra Ti?» Mas Ele continuava em silêncio e nada respondia. (…) Pilatos interrogou-o de novo, dizendo: «Não respondes nada? Vê de quantas coisas és acusado!» Mas Jesus nada mais respondeu, de modo que Pilatos estava estupefacto (Mc 14, 60-61; 15, 4-5).

Jesus, sois a vida, e acabais condenado à morte; sois a verdade, e suportastes um processo cheio de falsidades. Mas por que não reclamais? Por que não levantais a voz e explicais as vossas razões? Por que não refutais os eruditos e os poderosos, como sempre fizestes com tanto sucesso? A vossa reação é surpreendente, Jesus: no momento decisivo, não falais; calais-Vos. Porque, quanto mais forte é o mal, mais radical é a vossa resposta. E a vossa resposta é o silêncio. Mas o vosso silêncio é fecundo: é oração, é mansidão, é perdão, é o caminho para redimir do mal, para converter o que sofreis num dom que ofereceis. Jesus, dou-me conta de Vos conhecer pouco, porque não conheço suficientemente o vosso silêncio; porque no frenesim de correr e fazer, absorvido pelas coisas, tomado pelo medo de não continuar a figurar ou pela mania de me pôr no centro, não encontro tempo para parar e ficar convosco: para Vos deixar agir a Vós, Palavra do Pai que trabalhais no silêncio. Jesus, o vosso silêncio mexe comigo: ensina-me que a oração não nasce dos lábios que se movem, mas dum coração que sabe permanecer à escuta: porque rezar é fazer-se dócil à vossa Palavra, é adorar a vossa presença.

Rezemos dizendo: Falai ao meu coração, Jesus

Vós que respondeis ao mal com o bem

 

Falai ao meu coração, Jesus

Vós que extinguis o clamor com a mansidão

 

Falai ao meu coração, Jesus

Vós que detestais a crítica e as lamentações

 

Falai ao meu coração, Jesus

Vós que me conheceis intimamente

 

Falai ao meu coração, Jesus

Vós que me tendes mais amor do que me amo eu próprio

 

Falai ao meu coração, Jesus

2. Jesus carrega a cruz

Subindo ao madeiro, Ele levou os nossos pecados no seu corpo, para que, mortos para o pecado, vivamos para a justiça: pelas suas chagas fomos curados (1 Ped 2, 24).

Jesus, também nós carregamos cruzes, às vezes muito pesadas: uma doença, um acidente, a morte dum ente querido, uma desilusão afetiva, um filho que anda perdido, o emprego que falta, uma ferida interior que não cura, o fracasso dum projeto, a milésima expetativa para nada... Jesus, como se faz então para rezar? Como fazer quando me sinto esmagado pela vida, quando um fardo me pesa no coração, quando estou sob pressão e já não tenho força para reagir? A vossa resposta reside numa proposta: «Vinde a Mim, todos os que estais cansados e oprimidos, que Eu hei de aliviar-vos» (Mt 11, 28). Vir a Vós… mas eu fecho-me em mim: passo e repasso, sinto pena de mim mesmo, afundo na condição de vítima, um campeão de negatividade. Vinde a Mim: dizê-lo, não foi suficiente! Então vindes ao nosso encontro e carregais aos ombros a nossa cruz, para nos tirar de cima o seu peso. Desejais que lancemos sobre Vós fadigas e preocupações, pois quereis que nos sintamos livres e amados em Vós. Obrigado, Jesus! Uno a minha cruz à vossa, trago-Vos o meu cansaço e as minhas misérias, lanço sobre Vós todos os pesos do meu coração.

Rezemos dizendo: Venho a Vós, Senhor

Com a minha história

 

Venho a Vós, Senhor

Com as minhas canseiras

 

Venho a Vós, Senhor

Com as minhas limitações e fragilidades

 

Venho a Vós, Senhor

Com os meus temores

 

Venho a Vós, Senhor

Depondo toda a confiança no vosso amor      

 

Venho a Vós, Senhor

 

3. Jesus cai pela primeira vez

Em verdade, em verdade vos digo: se um grão de trigo, lançado à terra, não morrer, fica ele só; mas, se morrer, dá muito fruto (Jo 12, 24).

Caístes, Jesus! Em que pensais, como rezais com a face no pó? Mas sobretudo o que é que Vos dá a força para Vos levantardes? Enquanto estais com o rosto por terra, não podendo já ver o céu, imagino-Vos a repetir no coração: Pai, que estais nos céus. O olhar amoroso do Pai, que pousa sobre Vós, é a vossa força. Mas imagino também que, enquanto beijais a terra árida e fria, estejais a pensar no homem, tirado da terra, a pensar em nós, que estamos no centro do vosso coração; e repitais as palavras do vosso Testamento: «Isto é o meu corpo, que vai ser entregue por vós» (Lc 22, 19). O amor do Pai por Vós, e o vosso por nós. O amor: aqui está a mola que Vos faz levantar e prosseguir. Porque, quem ama, não fica por terra, recomeça; quem ama, não se cansa, corre; quem ama, voa. Jesus, peço-Vos sempre muitas coisas, mas só preciso duma: saber amar. Cairei na vida, mas, com o amor, poderei levantar-me e continuar para diante, como fizestes Vós, que sois perito em quedas. De facto a vossa vida foi um cair contínuo ao nosso encontro: de Deus para homem, de homem para servo, de servo para crucificado, até ao túmulo; caístes na terra como semente que morre; caístes para nos reerguer da terra e levar para o Céu. Vós que levantais do pó e fazeis renascer a esperança, dai-me forças para amar e recomeçar.

Rezemos dizendo: Jesus, dai-me a força de amar e recomeçar 

Quando prevalece a desilusão

 

Jesus, dai-me a força de amar e recomeçar

Quando caiem sobre mim os juízos dos outros

 

Jesus, dai-me a força de amar e recomeçar

Quando nada funciona e me torno impaciente

 

Jesus, dai-me a força de amar e recomeçar

Quando sinto que não aguento mais

 

Jesus, dai-me a força de amar e recomeçar

Quando me oprime o pensamento de que nada mudará

 

Jesus, dai-me a força de amar e recomeçar

 

4. Jesus encontra sua mãe

Então Jesus, ao ver ali ao pé a sua mãe e o discípulo que Ele amava, disse (...) ao discípulo: «Eis a tua mãe!» E, desde aquela hora, o discípulo acolheu-a como sua (Jo 19, 26-27).

Jesus, os vossos abandonaram-Vos, Judas traiu-Vos, Pedro renegou-Vos: ficastes sozinho com a cruz. Mas está lá a vossa mãe. Não são necessárias palavras, bastam os seus olhos, que sabem enfrentar o sofrimento e ocupar-se dele. Jesus, no olhar de Maria cheio de lágrimas e de luz, encontrais a memória da ternura, das carícias, dos braços amorosos que sempre Vos acolheram e sustentaram. O olhar materno é o olhar da memória, que nos fundamenta no bem. Não se pode prescindir duma mãe que nos traz ao mundo, mas também não podemos prescindir duma mãe que nos ponha direitos, no mundo. Vós o sabeis e, da cruz, dais-nos a vossa própria mãe. Eis a tua mãe – dizeis ao discípulo, a cada um de nós: depois da Eucaristia, dais-nos Maria, a dádiva extrema antes de morrer. Jesus, no vosso caminho, serviu-Vos conforto a recordação do seu amor; também o meu caminho precisa de se fundar na memória do bem. Dou-me conta, porém, que a minha oração é pobre de memória: rápida, apressada, uma lista de necessidades para hoje e amanhã. Maria, detende a minha corrida! Ajudai-me a fazer memória: a guardar a graça, a lembrar o perdão e os prodígios de Deus, a reavivar o primeiro amor, a saborear as maravilhas da providência, a chorar de gratidão.

Rezemos dizendo: Senhor, reavivai em mim a recordação do vosso amor

Quando reaparecem as feridas do passado

 

Senhor, reavivai em mim a recordação do vosso amor

Quando extravio o sentido e o fio das coisas

 

Senhor, reavivai em mim a recordação do vosso amor

Quando perco de vista os dons que recebi

 

Senhor, reavivai em mim a recordação do vosso amor

Quando perco de vista o dom que sou

 

Senhor, reavivai em mim a recordação do vosso amor

Quando me esqueço de Vos agradecer

 

Senhor, reavivai em mim a recordação do vosso amor

5. Jesus é ajudado pelo Cireneu

Quando [os soldados] O iam conduzindo, lançaram mão de um certo Simão de Cirene, que voltava do campo, e carregaram-no com a cruz, para a levar atrás de Jesus (Lc 23, 26).

Jesus, quantas vezes, diante dos desafios da vida, presumimos de os superar sozinhos! Como é difícil pedir uma mão, com medo de dar a impressão de não estarmos à altura, temos sempre a preocupação de bem parecer e nos exibir! Não é fácil fiar-se, e menos ainda entregar-se. Mas quem reza sabe que é um necessitado e Vós, Jesus, estais habituado a entregar-Vos na oração. Assim não desprezais a ajuda do Cireneu. Expondes as vossas fragilidades a ele, um homem simples, um agricultor que volta do campo. Obrigado porque, fazendo-Vos amparar na necessidade, apagais a imagem dum deus invulnerável e distante. Não sois imóvel no poder, mas invencível no amor, e ensinais-nos que amar significa socorrer os outros precisamente nisto: nas fragilidades de que se envergonham. Então as fragilidades transformam-se em oportunidades. Assim aconteceu ao Cireneu: a vossa fragilidade mudou a sua vida; e um dia dar-se-á conta de ter socorrido o seu Salvador, ter sido redimido através daquela cruz que levou. Para que a minha vida também mude, peço-Vos, Jesus: ajudai-me a baixar as defesas e deixar-me amar por Vós, precisamente no ponto onde tenho mais vergonha de mim mesmo.

Rezemos dizendo: Curai-me, Jesus!

De toda a presunção de autossuficiência

 

Curai-me, Jesus!

De pensar que consigo sem Vós e sem os outros

 

Curai-me, Jesus!

Da mania do perfeccionismo

 

Curai-me, Jesus!

Da relutância em entregar-Vos as minhas misérias

 

Curai-me, Jesus!

Da pressa frente aos necessitados que encontro no caminho

 

Curai-me, Jesus!

6. Jesus é confortado pela Verónica que Lhe enxuga o rosto

Bendito seja Deus (…) o Pai das misericórdias e o Deus de toda a consolação! Ele nos consola em toda a nossa tribulação, para que também nós possamos consolar aqueles que estão em qualquer tribulação (…). Na verdade, assim como abundam em nós os sofrimentos de Cristo, também, por meio de Cristo, é abundante a nossa consolação (2 Cor 1, 3-5).

Jesus, muitos acompanham o espetáculo bárbaro da vossa execução e, sem Vos conhecer nem conhecer a verdade, proferem sentenças e condenações, lançando sobre Vós infâmia e desprezo. O mesmo acontece hoje, Senhor, e nem sequer é preciso um cortejo macabro: basta um teclado para insultar e publicar sentenças. Mas, enquanto muitos gritam e condenam, abre caminho no meio da multidão uma mulher. Não fala; age. Não insulta; compadece-se. Vai contracorrente: sozinha, com a coragem da compaixão, arrisca por amor, encontra forma de passar por entre os soldados apenas para Vos dar o conforto duma carícia no rosto. O seu gesto passará à história, e é um gesto de consolação. Quantas vezes invoco a vossa consolação, Jesus! Mas a Verónica lembra-me que também Vós precisais da consolação: Vós, um Deus próximo, pedis a minha proximidade; Vós, meu consolador, quereis ser consolado por mim. Amor não amado, também hoje procurais no meio da multidão corações sensíveis ao vosso sofrimento, à vossa amargura. Procurais verdadeiros adoradores que, em espírito e verdade (cf. Jo 4, 23), permaneçam convosco (cf. Jo 15), Amor abandonado. Jesus, acendei em mim o desejo de estar convosco, de Vos adorar e consolar. E fazei que eu seja, em vosso nome, consolação para os outros.

Rezemos dizendo: Tornai-me testemunha da vossa consolação

Deus de misericórdia, próximo de quem tem o coração ferido

 

Tornai-me testemunha da vossa consolação

Deus de ternura, que Vos comoveis por nós

 

Tornai-me testemunha da vossa consolação

Deus de compaixão, que detestais a indiferença

 

Tornai-me testemunha da vossa consolação

Vós que ficais triste quando aponto o dedo contra os outros

 

Tornai-me testemunha da vossa consolação

Vós que não viestes para condenar, mas para salvar

 

Tornai-me testemunha da vossa consolação

7. Jesus cai de novo sob o peso da cruz

[O filho mais novo], caindo em si, disse: (…) Levantar-me-ei, irei ter com o meu pai e vou dizer-lhe: «Pai, pequei (…)». E, levantando-se, foi ter com o pai. Quando ainda estava longe, o pai viu-o e, enchendo-se de compaixão, correu a lançar-se-lhe ao pescoço e cobriu-o de beijos. O filho disse-lhe: «Pai, pequei (…); já não mereço ser chamado teu filho». Mas o pai disse (...): «Este meu filho estava morto e reviveu, estava perdido e foi encontrado» (Lc 15, 17-18.20-22.24).

Jesus, a cruz pesa! Carrega o peso da derrota, do fracasso, da humilhação. Compreendo-o quando me sinto esmagado pelas coisas, metralhado pela vida e incompreendido pelos outros; quando sinto o peso excessivo e enervante da responsabilidade e do trabalho, quando estou comprimido pelas garras da ansiedade, assaltado pela melancolia, enquanto um pensamento sufocante me vai repetindo: não vais sair desta, desta vez não te erguerás. Mas há pior. Dou-me conta de tocar o fundo, quando volto a cair no mesmo: quando caio de novo nos meus erros, nos meus pecados, quando me escandalizo dos outros e depois apercebo-me de que não sou diferente. Não há nada pior do que ficar desiludido consigo mesmo, esmagado pelo sentimento de culpa. Mas Vós, Jesus, caístes várias vezes sob o peso da cruz, para estar perto de mim quando volto a cair. Convosco a esperança nunca acaba e, depois de cada queda, levanto-me outra vez, porque, quando erro, não Vos cansais de mim, mas ainda mais Vos aproximais. Obrigado por esperardes por mim; obrigado porque volto a cair tantas vezes e me perdoais infinitas vezes: sempre. Recordai-me que as quedas podem tornar-se momentos cruciais no caminho, porque me levam a compreender a única coisa que importa: que preciso de Vós. Jesus, gravai no meu coração a certeza mais importante: que só me levanto verdadeiramente quando Vós me levantais, quando me libertais dos pecados. Porque a vida não recomeça das minhas palavras, mas do vosso perdão.

Rezemos dizendo: Levantai-me, Jesus!

Quando, paralisado pela difidência, sinto tristeza e desânimo

 

Levantai-me, Jesus!

Quando vejo a minha inadequação e me sinto inútil

 

Levantai-me, Jesus!

Quando prevalecem a vergonha e o medo de não conseguir

 

Levantai-me, Jesus!

Quando me sinto tentado a perder a esperança

 

Levantai-me, Jesus!

Quando esqueço que a minha força está no vosso perdão

 

Levantai-me, Jesus!

8. Jesus encontra as mulheres de Jerusalém

Seguiam Jesus uma grande multidão de povo e umas mulheres que batiam no peito e se lamentavam por Ele (Lc 23, 27).

Jesus, quem é que Vos segue até ao fim pelo caminho da cruz? Não os poderosos, que Vos esperam no Calvário, nem os espetadores que estão longe, mas as pessoas simples, grandes aos vossos olhos e pequenas aos do mundo. São as mulheres a quem destes esperança: não têm voz, mas fazem-se ouvir. Ajudai-nos a reconhecer a grandeza das mulheres, daquelas que foram fiéis e estiveram perto de Vós na Páscoa, mas também daquelas que ainda hoje são descartadas, sofrendo ultrajes e violências. Jesus, as mulheres que encontrais batem no peito e choram por Vós. Não choram por si mesmas, mas por Vós; choram pelo mal e o pecado do mundo. A sua oração feita de lágrimas chega ao vosso coração. E a minha oração sabe chorar? Comovo-me diante de Vós, crucificado por mim, diante do vosso amor manso e ferido? Choro as minhas falsidades e a minha inconstância? À vista das tragédias do mundo, o meu coração permanece gelado ou enternece-se? Como reajo à loucura da guerra, a rostos de crianças que já não sabem sorrir, a mães que as veem desnutridas e famintas e não têm mais lágrimas para derramar? Vós, Jesus, chorastes por Jerusalém, chorastes pela dureza do nosso coração. Sacudi-me no meu íntimo, dai-me a graça de chorar rezando e de rezar chorando.

Rezemos dizendo: Jesus, enternecei o meu coração endurecido

Vós que conheceis os segredos do coração

 

Jesus, enternecei o meu coração endurecido

Vós que Vos entristeceis face à dureza dos ânimos

 

Jesus, enternecei o meu coração endurecido

Vós que amais os corações humildes e contritos

 

Jesus, enternecei o meu coração endurecido

Vós que enxugastes com o perdão as lágrimas de Pedro

 

Jesus, enternecei o meu coração endurecido

Vós que transformais o choro em canto

 

Jesus, enternecei o meu coração endurecido


9. Jesus é despojado das suas vestes

«Senhor, quando foi que Te vimos com fome e Te demos de comer, ou com sede e Te demos de beber? Quando Te vimos peregrino e Te recolhemos, ou nu e Te vestimos? E quando Te vimos doente ou na prisão, e fomos visitar-Te?» E o Rei vai dizer-lhes, em resposta: «Em verdade vos digo: Sempre que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, a Mim mesmo o fizestes» (Mt 25, 37-40).

Jesus, estas palavras disseste-las antes da Paixão. Agora compreendo a vossa insistência em identificar-Vos com os necessitados: Vós estivestes encarcerado; Vós sois tratado como estrangeiro, levado até fora da cidade para ser crucificado; Vós estais nu, despojado das vestes; Vós, doente e ferido; Vós, sedento na cruz e faminto de amor. Fazei que Vos veja nos atribulados e veja os atribulados em Vós, porque Vós estais neles, em quem é despojado de dignidade, nos cristos humilhados pela prepotência e a injustiça, por lucros iníquos obtidos à custa dos outros na indiferença geral. Olho para Vós, Jesus, despojado das vestes, e compreendo que me convidais a despojar-me de tantas exterioridades. Porque Vós não olhais para as aparências, mas para o coração. E não quereis uma oração estéril, mas caritativamente fecunda. Deus despido, desnudai-me também a mim. Porque é fácil falar, mas será que Vos amo de verdade nos pobres, a vossa carne ferida? Rezo por quem está despojado de dignidade? Ou rezo apenas para acudir às minhas necessidades e rodear-me de segurança? Jesus, a vossa verdade desnuda-me e leva-me a centrar no que importa: Vós crucificado e os irmãos crucificados. Dai-me a graça de o compreender agora, para não ser encontrado despojado de amor quando me apresentar diante de Vós.

Rezemos dizendo: Despojai-me, Senhor Jesus!

Do apego às aparências

 

Despojai-me, Senhor Jesus!

Da couraça da indiferença

 

Despojai-me, Senhor Jesus!

De julgar que não toca a mim socorrer os outros

 

Despojai-me, Senhor Jesus!

Dum culto feito de respeitabilidade e exterioridade

 

Despojai-me, Senhor Jesus!

Da convicção de que a vida corre bem, se eu estiver bem

 

Despojai-me, Senhor Jesus!

10. Jesus é pregado na cruz

Quando chegaram ao lugar chamado Calvário, crucificaram-No a Ele e aos malfeitores, um à direita e outro à esquerda. Jesus dizia: «Perdoa-lhes, Pai, porque não sabem o que fazem» (Lc 23, 33-34).

Jesus, trespassam-Vos braços e pés com cravos, dilacerando-Vos as carnes; mas é agora, quando o sofrimento físico é mais atroz, que brota dos vossos lábios a oração impossível: perdoais a quem Vos está cravando os pregos nos pulsos. E não apenas uma vez mas muitas, como recorda o Evangelho com esta forma verbal que indica uma ação repetida: dizíeis «Perdoa-lhes, Pai…». Convosco, Jesus, também eu posso encontrar a coragem de escolher o perdão, que liberta o coração e relança a vida. E, Senhor, não Vos basta perdoar-nos, quereis também desculpar-nos diante do Pai: não sabem o que fazem. Assumis a nossa defesa, fazeis-Vos nosso advogado, intercedeis por nós. Agora que as vossas mãos, com que abençoáveis e curáveis, estão pregadas, e que os vossos pés, com que leváveis a boa nova, já não podem caminhar, agora, na impotência, revelais-nos a omnipotência da oração. No cimo do Gólgota, manifestais-nos a sublimidade da oração de intercessão, que salva o mundo. Jesus, que eu reze não só por mim e pelos meus entes queridos, mas também por quem não me quer bem e me faz mal; que eu reze, segundo os desejos do vosso coração, por quem vive longe de Vós; que eu reze para reparar e interceder em favor de quantos, ignorando-Vos, não conhecem a alegria de Vos amar e ser perdoados por Vós.

Rezemos dizendo: Pai, tende misericórdia de nós e do mundo inteiro

Pela dolorosa paixão de Jesus

 

Pai, tende misericórdia de nós e do mundo inteiro

Pelo poder das suas chagas

 

Pai, tende misericórdia de nós e do mundo inteiro

Pelo seu perdão na cruz

 

Pai, tende misericórdia de nós e do mundo inteiro

Por quantos perdoam por vosso amor

 

Pai, tende misericórdia de nós e do mundo inteiro

Por intercessão de quantos creem, adoram, esperam e Vos amam

 

Pai, tende misericórdia de nós e do mundo inteiro

11. Jesus grita o seu abandono

Desde o meio-dia até às três da tarde, as trevas envolveram toda a terra. Cerca das três horas da tarde, Jesus clamou com voz forte: «Eli, Eli, lemà sabactàni?», isto é, «Meu Deus, meu Deus, porque Me abandonaste?» (Mt 27, 45-46).

Jesus, eis a oração inaudita! Gritais ao Pai o vosso abandono. Vós, Deus do céu, não trovejais respostas, mas perguntais porquê? No auge da Paixão, sentis a distância do Pai; e já nem O chamais Pai – como sempre –, mas Deus, como se já não conseguísseis identificar o seu rosto. Por que é que sucede isto? Para mergulhardes até ao fundo no abismo do nosso sofrimento. Fizeste-lo por mim, para que, quando vir apenas escuridão, quando experimentar o colapso das certezas e o naufrágio da vida, já não me sinta só, mas acredite que Vós estais lá comigo: Vós, Deus da comunhão, que experimentais o abandono para não mais me deixar refém da solidão. Quando gritastes o vosso porquê, fizeste-lo com um Salmo: assim trouxestes à oração a desolação mais extrema. Eis o que se deve fazer nas tempestades da vida: em vez de calar e guardar dentro, gritar por Vós. Glória a Vós, Senhor Jesus, porque não fugistes da minha confusão, mas viveste-la profundamente; louvor e glória a Vós que, assumindo todas as distâncias, fizestes-Vos próximo de quem está mais longe de Vós. E, na escuridão dos meus porquês, encontro-Vos a Vós, Jesus, luz na noite. E, no grito de tantas pessoas sozinhas e excluídas, oprimidas e abandonadas, revejo-Vos a Vós, meu Deus: fazei que Vos reconheça e Vos ame.

Rezemos dizendo: Jesus, fazei que Vos reconheça e vos ame

Nas crianças não nascidas e nas abandonadas

 

Jesus, fazei que Vos reconheça e vos ame

Em tantos jovens à espera de alguém que ouça o seu grito de dor

 

Jesus, fazei que Vos reconheça e vos ame

Nos inúmeros idosos descartados

 

Jesus, fazei que Vos reconheça e vos ame

Nos presos e em quem vive sozinho

 

Jesus, fazei que Vos reconheça e vos ame

Nos povos mais explorados e esquecidos

 

Jesus, fazei que Vos reconheça e vos ame

12. Jesus morre entregando-Se ao Pai e dando ao bom ladrão o Paraíso

[Um dos malfeitores crucificado] disse: «Jesus, lembra-Te de mim quando estiveres no teu Reino». Ele respondeu-lhe: «Em verdade te digo: hoje estarás comigo no Paraíso». (…) Dando um forte grito, Jesus exclamou: «Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito». Dito isto, expirou (Lc 23, 42-43.46).

Jesus, um malfeitor no Paraíso!!! Ele confia-Se a Vós, e Vós O confiais juntamente convosco ao Pai. Deus do impossível, dum ladrão fazeis um santo. Mais: no Calvário, mudais o curso da história. Fazeis da cruz, emblema do suplício, o ícone do amor; do muro da morte, uma ponte para a vida. Transformais as trevas em luz, a separação em comunhão, o sofrimento em dança, e o próprio túmulo – última estação da vida – no ponto de partida da esperança. Mas estas inversões, realizai-las connosco, nunca sem nós. Jesus, lembrai-Vos de mim: esta oração sincera permitiu-Vos fazer maravilhas na vida daquele malfeitor. Força inaudita da oração. Às vezes penso que a minha oração não seja ouvida, mas o essencial é perseverar, ter constância, recordar-se de Vos dizer: «Jesus, lembrai-Vos de mim». Lembrai-Vos de mim e o meu mal já não será última paragem, mas um recomeço. Lembrai-Vos, isto é, colocai-me de novo no vosso coração, mesmo quando me afastar, quando me perder na roda da vida que gira loucamente. Lembrai-Vos de mim, Jesus, porque ser recordado por Vós – assim no-lo mostra o bom ladrão – é entrar no Paraíso. Sobretudo lembrai-me, Jesus, que a minha oração pode mudar a história.

Rezemos dizendo: Jesus, lembrai-Vos de mim

Quando a esperança se desvanece e reina a desilusão

 

Jesus, lembrai-Vos de mim

Quando sou incapaz de tomar uma decisão

 

Jesus, lembrai-Vos de mim

Quando perco a fé em mim e nos outros

 

Jesus, lembrai-Vos de mim

Quando perco de vista a grandeza do vosso amor

 

Jesus, lembrai-Vos de mim

Quando penso que minha oração seja inútil

 

Jesus, lembrai-Vos de mim

13. Jesus é descido da cruz e posto nos braços de Maria

Simeão (...) disse a Maria, sua mãe: «Este menino está aqui para queda e ressurgimento de muitos em Israel e para ser sinal de contradição; uma espada trespassará a tua alma» (Lc 2, 34-35).

Maria, depois do vosso «sim», o Verbo fez-Se carne no vosso ventre; agora, reclinada sobre o vosso ventre, está a sua carne torturada: aquele menino que trazíeis nos braços é um cadáver dilacerado. E todavia, agora no momento mais doloroso, resplandece a vossa oferta: uma espada trespassa-Vos a alma e a vossa oração continua a ser um «sim» a Deus. Maria, nós somos pobres de «sins e ricos de «ses»: se tivesse tido pais melhores, se tivesse sido mais compreendido e amado, se a minha carreira tivesse corrido melhor, se não tivesse havido aquele problema, se eu ao menos deixasse de sofrer, se Deus me ouvisse... Ao perguntar-nos perpetuamente pelo porquê das coisas, sentimos dificuldade em viver o presente com amor. Vós teríeis muitos «ses» para dizer a Deus, mas ainda dizeis «sim». Forte na fé, acreditais que o sofrimento, permeado pelo amor, produz frutos de salvação; que o sofrimento com Deus não tem a última palavra. E, enquanto segurais nos braços Jesus inanimado, ressoam em Vós as últimas palavras que Ele Vos dirigiu: Eis o teu filho. Mãe, sou eu aquele filho! Acolhei-me nos vossos braços e debruçai-Vos sobre as minhas feridas. Ajudai-me a dizer «sim» a Deus, «sim» ao amor. Mãe de piedade, vivemos num tempo cruel e precisamos de compaixão: Vós, terna e forte, ungi-nos de mansidão: dissolvei as resistências do coração e os nós da alma.

Rezemos dizendo: Tomai-me pela mão, Maria

Quando cedo a recriminações e a fazer a vítima

 

Tomai-me pela mão, Maria

Quando deixo de lutar aceitando conviver com as minhas falsidades

 

Tomai-me pela mão, Maria

Quando vou adiando e não encontro a coragem de dizer «sim» a Deus

 

Tomai-me pela mão, Maria

Quando sou indulgente comigo mesmo e inflexível com os outros

 

Tomai-me pela mão, Maria

Quando quero que a Igreja e o mundo mudem, mas eu não mudo

 

Tomai-me pela mão, Maria

14. Jesus é colocado no túmulo de José de Arimateia

Ao cair da tarde, veio um homem rico de Arimateia, chamado José; que também se tornara discípulo de Jesus. Foi ter com Pilatos e pediu-lhe o corpo de Jesus. (...) José tomou o corpo, envolveu-o num lençol limpo e depositou-o num túmulo novo, que tinha mandado talhar na rocha (Mt 27, 57-60).

José: o nome que juntamente com o de Maria está no alvorecer do Natal, marca também a aurora da Páscoa. José de Nazaré sonhou e corajosamente levou Jesus para O salvar de Herodes; tu, José de Arimateia, tomas o corpo d’Ele, sem saber que um sonho impossível e maravilhoso se vai realizar lá mesmo, no túmulo que deste a Cristo quando pensavas que Ele não poderia fazer mais nada por ti. Ao contrário, é mesmo verdade que toda a dádiva feita a Deus recebe uma recompensa maior. José de Arimateia, és o profeta da coragem ousada. Para dar o teu dom a um morto, vais ter com o temido Pilatos e fazes-lhe um pedido, para poderes oferecer a Jesus o túmulo que fizeras construir para ti. O teu pedido é tenaz, e às palavras seguem-se as obras. Tu, José, recordas-nos que a oração insistente dá fruto e atravessa até a escuridão da morte; que o amor não fica sem resposta, mas oferece novos começos. O teu túmulo – único na história – será fonte de vida: era novo, há pouco escavado na rocha. E eu, o que dou de novo a Jesus nesta Páscoa? Um pouco de tempo para estar com Ele? Um pouco de amor para os outros? Os meus medos e as minhas misérias sepultadas, que Cristo espera lhe sejam oferecidos como fizeste tu com o túmulo? Será verdadeiramente Páscoa se der algo de meu Àquele que por mim deu a sua vida: pois é dando que se recebe; a vida é encontrada quando se perde, e é possuída quando se dá.

Rezemos dizendo: Tende piedade, Senhor

De mim, preguiçoso para me converter

 

Tende piedade, Senhor

De mim, que gosto muito de receber e pouco de dar

 

Tende piedade, Senhor

De mim, incapaz de me render ao vosso amor

 

Tende piedade, Senhor

De nós, prontos a servir-nos das coisas, mas lentos em servir os outros

 

Tende piedade, Senhor

Do nosso mundo, infestado pelos túmulos do egoísmo

 

Tende piedade, Senhor

Invocação final (do nome de Jesus, 14 vezes)

Senhor, nós Vos suplicamos como aqueles necessitados, frágeis e doentes do Evangelho que Vos invocavam com a palavra mais simples e familiar, isto é, com o vosso nome.

Jesus, o vosso nome salva, porque Vós sois a nossa salvação.

Jesus, sois a minha vida e, para não perder o rumo no caminho, preciso de Vós, que perdoais e ergueis, que curais o meu coração e dais sentido ao meu sofrimento.

Jesus, tomastes sobre Vós o meu mal e, da cruz, não me acusais, mas abraçais-me; Vós, manso e humilde de coração, curai-me do rancor e do ressentimento, libertai-me da suspeita e da desconfiança.

Jesus, olho para Vós na cruz e vejo escancarar-se diante dos meus olhos o amor, sentido do meu ser e meta do meu caminho: ajudai-me a amar e a perdoar, a superar a impaciência e a indiferença, a não me lamentar.

Jesus, na cruz tivestes sede, e é sede do meu amor e da minha oração; precisais disso para realizar plenamente os vossos projetos de bem e de paz.

Jesus, agradeço-Vos por todos aqueles que respondem ao vosso convite e são perseverantes na oração, têm a coragem de acreditar e a constância para avançar nas dificuldades.

Jesus, apresento-Vos os pastores do vosso povo santo: a sua oração sustenta o rebanho; que eles encontrem tempo para estar diante de Vós, conformem o seu coração ao vosso.

Jesus, bendigo-Vos pelas contemplativas e os contemplativos, cuja oração, escondida do mundo e agradável a vossos olhos, guarde a Igreja e a humanidade.

Jesus, trago à vossa presença as famílias e as pessoas que rezaram esta noite nas suas casas, os idosos, especialmente os que estão sozinhos, os doentes, joias da Igreja que unem os seus sofrimentos ao vosso.

Jesus, que esta oração de intercessão alcance as irmãs e os irmãos que, em muitas partes do mundo, sofrem perseguições por causa do vosso nome; aqueles que sofrem o drama da guerra e quantos, com a força que lhes vem de Vós, carregam cruzes pesadas.

Jesus, com a vossa cruz fizestes de todos nós um só: uni os crentes em comunhão, infundi sentimentos fraternos e pacientes, ajudai-nos a colaborar e a caminhar juntos; guardai a Igreja e o mundo na paz.

Jesus, juiz santo que me chamareis pelo nome, livrai-me dos juízos temerários, da crítica e das palavras violentas e ofensivas.

Jesus, antes de morrer dissestes «tudo está consumado» (Jo 19, 30). Incompleto como estou, não poderei dizer o mesmo; mas confio em Vós, porque sois a minha esperança, a esperança da Igreja e do mundo.

Jesus, quero dizer-Vos ainda uma palavra e ficar repetindo-a: obrigado! Obrigado, meu Senhor e meu Deus.