quarta-feira, 8 de março de 2023

 QUARESMA PASSO A PASSO - 2023  

Quinta-feira II – dia 14 –09/03/2023

Evangelho Lc 16, 19-31

«Eles têm Moisés e os Profetas: que os oiçam.»

Esta parábola mostra-nos um homem que tem a sua vida assente em vestes de linho fino e banquetes esplêndidos, mas que apesar disso não tem nome. Mostra-nos também um pobre que apenas tem nome. Tudo o resto é sofrimento: está doente, tem fome, vive na rua e é ignorado. Os dois morrem, e sendo iguais na morte não são iguais na sorte. Um é enterrado e o outro levado pelos anjos. Na nova situação o rico vê, pela primeira vez, o pobre Lázaro e até sabe o nome dele. Conhece Abraão e chama-lhe pai mas, apesar disso, existe um abismo entre eles que não lhes permite passar de um lado para o outro. A conclusão é simples: “lembra-te que recebeste os teus bens em vida e Lázaro apenas os males”. E para todos fica o aviso: “Se não dão ouvidos a Moisés e aos Profetas, também não se deixarão convencer, se alguém ressuscitar dos mortos”.

aliturgia.com

"Naquele tempo, disse Jesus aos fariseus: «Havia um homem rico, que se vestia de linho fino e se banqueteava esplendidamente todos os dias. Um pobre chamado Lázaro jazia junto do seu portão, coberto de chagas. Bem desejava ele saciar-se com os restos caídos da mesa do rico; mas até os cães vinham lamber-lhe as chagas. Ora sucedeu que o pobre morreu e foi colocado pelos Anjos ao lado de Abraão. Morreu também o rico e foi sepultado. Na mansão dos mortos, estando em tormentos, levantou os olhos e viu Abraão com Lázaro a seu lado. Então ergueu a voz e disse: ‘Pai Abraão, tem compaixão de mim. Envia Lázaro, para que molhe em água a ponta do dedo e me refresque a língua, porque estou atormentado nestas chamas’. Abraão respondeu-lhe: ‘Filho, lembra-te que recebeste os teus bens em vida e Lázaro apenas os males. Por isso, agora ele encontra-se aqui consolado, enquanto tu és atormentado. Além disso, há entre nós e vós um grande abismo, de modo que, se alguém quisesse passar daqui para junto de vós, não poderia fazê-lo’. O rico exclamou: ‘Então peço-te, ó pai, que mandes Lázaro à minha casa paterna – pois tenho cinco irmãos – para que os previna, a fim de que não venham também para este lugar de tormento’. Disse-lhe Abraão: ‘Eles têm Moisés e os Profetas: que os oiçam’. Mas ele insistiu: ‘Não, pai Abraão. Se algum dos mortos for ter com eles, arrepender-se-ão’. Abraão respondeu-lhe: ‘Se não dão ouvidos a Moisés e aos Profetas, também não se deixarão convencer, se alguém ressuscitar dos mortos’»."

Percebo que Jesus me diz para olhar as riquezas como um bem que se partilha. Os bens em si mesmos não são bons nem maus, mas podem tornar-se maus para mim se, por causa deles, me tornar egoísta e pensar apenas em mim, ao ponto de nem sequer ver o meu irmão. Crer em Deus e reconhecê-lo como Pai, não me adianta muito se não reconhecer o meu semelhante como um irmão. De facto, o caminho para o reino passa pelo irmão, é isto que a Palavra (Moisés e os profetas) me revela.

Que pobreza, Senhor, se um dia me conhecerem como aquele que veste roupas de marca e participa em grandes banquetes. Que pobreza, Senhor, não ter outro nome que o das roupas que visto e dos importantes com quem me banqueteio. De facto, é muito pouco ser conhecido pelo que se tem e não pelo que se é. Ensina-me, Senhor, a descobrir a essência da vida no coração partido pelos irmãos, em especial pelos que sofrem. Que o meu coração se ajoelhe junto dos mais pequenos para entrar com eles na vida eterna.

aliturgia.com

Glória ao Pai e ao Filho e ao espírito Santo. Como era no princípio, agora e sempre. Ámen.

(...)

Esta é uma verdade: «Pobres, sempre os tereis convosco». Os pobres estão aqui. Há muitos: há os pobres que vemos, mas esta é a mínima parte; o grande número de pobres são aqueles que não vemos: os pobres escondidos. E não os vemos porque entramos na cultura da indiferença que é negacionista e negamos: “Não, não, não são muitos, não se veem; sim, aquele caso...”, diminuindo sempre a realidade dos pobres. Mas há muitos, muitos.

Ou então, se não entrarmos nesta cultura da indiferença, há o hábito de ver os pobres como ornamentos de uma cidade: sim, estão ali, como estátuas; sim, existem, veem-se; sim, aquela velhinha a pedir esmola, aquela outra... Mas como se fosse uma coisa normal. Os pobres fazem parte da ornamentação da cidade. Mas a grande maioria são pobres vítimas das políticas económicas, das políticas financeiras. Algumas estatísticas recentes resumem isto desta forma: há muito dinheiro nas mãos de poucos e muita pobreza em muitos, em tantos. E esta é a pobreza de tantas pessoas que são vítimas da injustiça estrutural da economia mundial. E há pobres que se envergonham de mostrar que não chegam ao fim do mês; tantos pobres da classe média, que secretamente vão à Caritas, pedem e sentem vergonha. Os pobres são muito mais numerosos do que os ricos; muito, muito... E o que Jesus diz é verdade: “Pobres, sempre os tereis convosco”. Mas eu vejo-os? Estou  consciente desta realidade? Especialmente da realidade oculta, aqueles que se envergonham de dizer que não conseguem chegar ao fim do mês.

Recordo que em Buenos Aires me disseram que o edifício de uma fábrica abandonada, vazio há anos, era habitado por cerca de quinze famílias que tinham chegado nos últimos meses. Fui lá. Eram famílias com filhos e cada um tinha usado uma parte da fábrica abandonada para viver. E, olhando para eles, vi que cada família tinha mobília boa, móveis da classe média, televisão, mas foram para lá porque não podiam pagar a renda. Os novos pobres que têm de abandonar a casa porque não podem pagar, foram para lá. É essa injustiça da organização económica ou financeira que os leva a isso. E são tantos, tantos,  encontra-los-emos no juízo. A primeira pergunta que Jesus nos fará será: “Como te comportaste com os pobres? Deste-lhes de comer? Quando estavam na prisão, visitaste-os? No hospital, viste-os? Ajudaste a viúva, os órfãos? Porque  eu estava neles”. E sobre isso seremos julgados. Não seremos julgados pelo luxo ou pelas viagens que fazemos nem pela importância social que temos. Seremos julgados pela nossa relação com os pobres. Mas se eu hoje ignorar os pobres, os puser de lado, considerando que eles não existem, o Senhor irá ignorar-me no Dia do Juízo. Quando Jesus disser: “Pobres, sempre os tereis convosco” significa “Eu estarei sempre convosco nos pobres. Neles estarei presente”. E isto não é ser comunista, isto é o centro do Evangelho: seremos julgados por isto.

Papa Francisco

(CAPELA DA CASA SANTA MARTA -6 de abril de 2020)

Vale a pena ler também:

https://www.vatican.va/content/francesco/pt/audiences/2016/documents/papa-francesco_20160518_udienza-generale.html

Sem comentários:

Enviar um comentário