QUARESMA PASSO A PASSO - 2022
Domingo IV da Quaresma - dia 26- 27/03/2022
EVANGELHO Lc 15, 1-3.11-32
«Pai, pequei contra o Céu e contra ti. Já não mereço ser chamado teu filho.»
As leituras deste quarto domingo da quaresma como que nos colocam perante o
exercício da misericórdia de Deus, ontem hoje e sempre. Em Deus experimentamos
o que é Amar assim perdidamente, infinitamente cada um dos Seus filhos e, ao
mesmo tempo, a humanidade inteira. É Ele quem vem ao nosso encontro, quem nos
procura, sempre, sempre, sempre. Ele tem a iniciativa, mas depois deixa-nos
livres para n’Ele nos entregarmos de coração aberto, ou de O rejeitarmos.
Podemos querer, ou não, ser amados por Deus! A opção de dizer sim, ou não, ao
Amor de Deus é da nossa inteira responsabilidade. Ao dizermos sim, entramos na
dinâmica da vivência e da comunicação do Amor de Deus a todos os que se cruzam
nos nossos caminhos, ou aos que vivem connosco diariamente.
Na primeira leitura (Jos 5, 9a.10-12) “vemos” como o povo de Deus
experimenta a misericórdia de Deus e celebra a Páscoa da libertação da
escravidão, no Egito e a sua entrada na Terra Prometida. Também nós Senhor te
damos graças e louvamos pelo teu infinito amor e te pedimos que nos libertes
das nossas escravidões, do nosso pecado, e nos conduzas ao Pai.
“Naqueles dias, disse o Senhor a Josué: «Hoje tirei de vós o opróbrio do
Egipto». Os filhos de Israel acamparam em Gálgala e celebraram a Páscoa, no dia
catorze do mês, à tarde, na planície de Jericó. No dia seguinte à Páscoa,
comeram dos frutos da terra: pães ázimos e espigas assadas nesse mesmo dia.
Quando começaram a comer dos frutos da terra, no dia seguinte à Páscoa, cessou
o maná. Os filhos de Israel não voltaram a ter o maná, mas, naquele ano, já se
alimentaram dos frutos da terra de Canaã.”
Na 2ªleitura (2 Cor 5, 17-21) é S.Paulo quem nos exorta à
reconciliação com Deus e com os irmãos, por e em Jesus Cristo. Deixemos que
Jesus nos habite por inteiro e n’Ele a reconciliação será uma realidade. Só em
Jesus tudo podemos, incluindo perdoar a quem nos faz mal.
“Irmãos: Se alguém está em Cristo, é uma nova criatura. As coisas antigas
passaram; tudo foi renovado. Tudo isto vem de Deus, que por Cristo nos
reconciliou consigo e nos confiou o ministério da reconciliação. Na verdade, é
Deus que em Cristo reconcilia o mundo consigo, não levando em conta as faltas
dos homens e confiando-nos a palavra da reconciliação. Nós somos, portanto,
embaixadores de Cristo; é Deus quem vos exorta por nosso intermédio. Nós vos
pedimos em nome de Cristo: reconciliai-vos com Deus. A Cristo, que não
conhecera o pecado, Deus identificou-O com o pecado por causa de nós, para que
em Cristo nos tornemos justiça de Deus.”
No evangelho (Lc 15, 1-3.11-32) Jesus revela-nos o quanto somos amados
por Deus. O Pai está sempre pronto, de braços abertos, para nos receber, nunca
desiste de nós. Andemos nós por onde andarmos, Ele está sempre à espera de que
voltemos para o seu regaço, onde há lugar para todos, sejamos quantos formos. O
Seu Amor por cada um de nós não acaba nunca, é infinito e sempre a “jorrar”.
Partamos ao Seu encontro e abramos as portas do nosso coração de par em par,
deixando Deus n’ele entrar e tudo preencher. Sendo como o filho mais novo, ou
como o mais velho, ou um pouco como cada um dos dois, nada receemos,
entreguemo-nos a Deus na totalidade do nosso ser e deixemo-nos amar pelo Amor,
que é Ele e só Ele.
“Naquele tempo, os publicanos e os pecadores aproximavam-se todos de Jesus,
para O ouvirem. Mas os fariseus e os escribas murmuravam entre si, dizendo:
«Este homem acolhe os pecadores e come com eles». Jesus disse-lhes então a
seguinte parábola: «Um homem tinha dois filhos. O mais novo disse ao pai: ‘Pai,
dá-me a parte da herança que me toca’. O pai repartiu os bens pelos filhos.
Alguns dias depois, o filho mais novo, juntando todos os seus haveres, partiu
para um país distante e por lá esbanjou quanto possuía, numa vida dissoluta.
Tendo gasto tudo, houve uma grande fome naquela região e ele começou a passar
privações. Entrou então ao serviço de um dos habitantes daquela terra, que o
mandou para os seus campos guardar porcos. Bem desejava ele matar a fome com as
alfarrobas que os porcos comiam, mas ninguém lhas dava. Então, caindo em si,
disse: ‘Quantos trabalhadores de meu pai têm pão em abundância, e eu aqui a
morrer de fome! Vou-me embora, vou ter com meu pai e dizer-lhe: Pai, pequei
contra o Céu e contra ti. Já não mereço ser chamado teu filho, mas trata-me
como um dos teus trabalhadores’. Pôs-se a caminho e foi ter com o pai. Ainda
ele estava longe, quando o pai o viu: encheu-se de compaixão e correu a
lançar-se-lhe ao pescoço, cobrindo-o de beijos. Disse-lhe o filho: ‘Pai, pequei
contra o Céu e contra ti. Já não mereço ser chamado teu filho’. Mas o pai disse
aos servos: ‘Trazei depressa a melhor túnica e vesti-lha. Ponde-lhe um anel no
dedo e sandálias nos pés. Trazei o vitelo gordo e matai-o. Comamos e
festejemos, porque este meu filho estava morto e voltou à vida, estava perdido
e foi reencontrado’. E começou a festa. Ora o filho mais velho estava no campo.
Quando regressou, ao aproximar-se da casa, ouviu a música e as danças. Chamou
um dos servos e perguntou-lhe o que era aquilo. O servo respondeu-lhe: ‘O teu irmão
voltou e teu pai mandou matar o vitelo gordo, porque ele chegou são e salvo’.
Ele ficou ressentido e não queria entrar. Então o pai veio cá fora instar com
ele. Mas ele respondeu ao pai: ‘Há tantos anos que eu te sirvo, sem nunca
transgredir uma ordem tua, e nunca me deste um cabrito para fazer uma festa com
os meus amigos. E agora, quando chegou esse teu filho, que consumiu os teus
bens com mulheres de má vida, mataste-lhe o vitelo gordo’. Disse-lhe o pai:
‘Filho, tu estás sempre comigo e tudo o que é meu é teu. Mas tínhamos de fazer
uma festa e alegrar-nos, porque este teu irmão estava morto e voltou à vida,
estava perdido e foi reencontrado’».”
O Evangelho de hoje começa com alguns que criticam Jesus, vendo-o na
companhia de publicanos e pecadores, e dizem com desdém: «Ele acolhe os
pecadores e come com eles. Na realidade esta frase revela-se um anúncio
maravilhoso. Jesus acolhe os pecadores e come com eles. É o que nos
acontece, em cada Missa, em cada igreja: Jesus está feliz por nos acolher na Sua
mesa, onde Se oferece por nós. Esta é a frase que poderíamos escrever nas
portas das nossas igrejas: «Aqui Jesus acolhe os pecadores e convida-os para a
sua mesa». E o Senhor, respondendo aos que o criticavam, conta esta parábolas
maravilhosa, que mostra a Sua predileção por aqueles que se sentem distantes d’Ele.
(…)
Deus preocupa-se por ti, precisamente por ti que ainda não conheces a
beleza do Seu amor, por ti, que ainda não aceitaste Jesus no centro da tua
vida, tu que não podes vencer o teu pecado, por ti que talvez ainda não
acreditas no amor por causa das coisas más que aconteceram na tua vida. (…) Ele
quer dizer-te que és precioso aos seus olhos, que és único. Ninguém te pode
substituir no coração de Deus. Tu tens um lugar, és tu, e ninguém te pode
substituir; e eu também, ninguém me pode substituir no coração de Deus. Deus é
o pai que espera o regresso do filho pródigo: Deus espera sempre por nós, não
se cansa, não desanima. Porque somos nós, cada um de nós, o filho abraçado de
novo (…) Ele espera todos os dias que nos apercebamos do Seu amor. Tu dizes:
«Mas eu comportei-me mal, tive muitos comportamentos maus!». Não tenhas medo:
Deus ama-te, Ele ama-te tal como és e sabe que só o Seu amor pode mudar a tua
vida.
Mas este amor infinito de Deus por nós, pecadores, que é o
coração do Evangelho, pode ser rejeitado. É o que faz o filho mais velho da
parábola. Ele não entende o amor naquele momento e tem em mente mais um dono do
que um pai. É um risco para nós também: acreditar num deus mais rigoroso do que
misericordioso, um deus que derrota o mal com o poder e não com o perdão. Não é
assim, Deus salva com o amor, não com a força; propondo-se e não impondo-se.
Mas o filho mais velho, que não aceita a misericórdia do seu pai, fecha-se,
comete um erro pior: ele presume que é justo, presume que é atraiçoado e julga
tudo com base no seu conceito de justiça. Então ele zanga-se com o irmão e
reprova o pai: «Mataste o bezerro gordo agora que este teu filho voltou». Este
teu filho, não o chama meu irmão, mas o teu filho.
Ele sente-se como um filho único. Também nós erramos quando achamos que temos
razão, quando achamos que os maus são os outros. Não nos consideremos bons,
porque sozinhos, sem a ajuda de Deus que é bom, não sabemos como vencer o mal. (…)
Como se derrota o mal? Aceitando o perdão de Deus e o perdão dos irmãos.
Acontece todas as vezes que nos confessamos: lá recebemos o amor do Pai que
vence o nosso pecado: ele desaparece, Deus esquece-se dele. Deus, quando
perdoa, perde a memória, esquece os nossos pecados, esquece. Deus é tão bom
connosco! Não como nós, que depois de dizer «não importa», na primeira
oportunidade nos lembramos com os juros dos males sofridos. Não, Deus cancela o
mal, renova-nos e assim faz renascer em nós a alegria, não a tristeza, não as
trevas no coração, não a suspeita, mas a alegria.
Irmãos e irmãs, coragem, com Deus nenhum pecado tem a última palavra.
Nossa Senhora, que desata os nós da vida, nos liberte da pretensão de nos
crermos justos e nos faça sentir a necessidade de procurar o Senhor, que está
sempre à nossa espera para nos abraçar, para nos perdoar.
Papa Francisco
(Angelus 15 de setembro de 2019)