domingo, 31 de dezembro de 2023

 SOLENIDADE DE SANTA MARIA MÃE DE DEUS

Com o início do novo ano – 2024 –  a Igreja celebra, hoje, a solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus e, simultaneamente, o dia mundial da Paz.

Na Oitava do Natal de Nosso Senhor Jesus Cristo e dia da sua Circuncisão, a Igreja celebra a solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus, que no Concílio de Éfeso os Padres aclamaram como Theotókos, porque nela o Verbo Se fez carne e habitou entre os homens o Filho de Deus, príncipe da paz, a quem foi dado o Nome que está acima de todos os nomes.

Neste primeiro dia do Ano Civil iniciamos uma nova caminhada que desejamos percorrer com a Bênção de Deus.

Na 1ªleitura (Num 6, 22-27) o autor sagrado sublinha a presença contínua de Deus na nossa caminhada. Hoje, como no tempo de Moisés, Deus inclina o seu rosto sobre nós e ilumina os nossos caminhos, ilumina a nossa noite. Ele, nosso refúgio e proteção, olha-nos desde o seu infinito amor e dá-nos a sua paz. Neste início de ano, podemos ser abençoados por Deus com uma vida nova.

“O Senhor disse a Moisés: «Fala a Aarão e aos seus filhos e diz-lhes: Assim abençoareis os filhos de Israel, dizendo: ‘O Senhor te abençoe e te proteja. O Senhor faça brilhar sobre ti a sua face e te seja favorável. O Senhor volte para ti os seus olhos e te conceda a paz’. Assim invocarão o meu nome sobre os filhos de Israel e Eu os abençoarei».” 

Na 2ªleitura (Gl 4,4-7) Paulo fala do tempo de Deus que não se mede no relógio, mas na vida e coração de Deus, por isso é plenitude. Nesse tempo que é dele, fez-nos participantes do seu mistério ao enviar o seu filho na condição humana. Agora, nele, também nós somos filhos, adotivos, mas filhos e como ele habitados pelo Espírito. Em nós começa uma existência nova que é liberdade total diante das realidades deste mundo. Uma vida que é filiação. Tudo acontece por meio de uma mulher que é Maria.

“Irmãos: Quando chegou a plenitude dos tempos, Deus enviou o seu Filho, nascido de uma mulher e sujeito à Lei, para resgatar os que estavam sujeitos à Lei e nos tornar seus filhos adotivos. E porque sois filhos, Deus enviou aos nossos corações o Espírito de seu Filho, que clama: «Abá! Pai!». Assim, já não és escravo, mas filho. E, se és filho, também és herdeiro, por graça de Deus.” 

No evangelho (Lc 2,16-21), Lucas diz-nos que chegou a plenitude do tempo. Chegou Jesus ao mundo. Chegou o prometido filho de uma virgem. A sua chegada gera novos circuitos, novos caminhos, novos interesses, novos horizontes. Ele é a novidade de Deus para os homens. É a luz que brilha nas trevas. É a perplexidade. Aparentemente tudo fica igual, mas quem se encontra com ele sente-se novo. Como os pastores também nós contemplamos Jesus, nascido em Belém e sentimos que este ano será para nós tempo novo. Continuaremos as nossas atividades, responderemos aos nossos compromissos, ‘guardaremos o nosso rebanho’, mas o nosso coração cheio da novidade de Jesus, viverá dando glória a Deus porque os nossos olhos puderam contemplar o filho que Maria deu à luz. 

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“Naquele tempo, os pastores dirigiram-se apressadamente para Belém e encontraram Maria, José e o Menino deitado na manjedoura. Quando O viram, começaram a contar o que lhes tinham anunciado sobre aquele Menino. E todos os que ouviam admiravam-se do que os pastores diziam. Maria conservava todos estes acontecimentos, meditando-os em seu coração. Os pastores regressaram, glorificando e louvando a Deus por tudo o que tinham ouvido e visto, como lhes tinha sido anunciado. Quando se completaram os oito dias para o Menino ser circuncidado, deram-Lhe o nome de Jesus, indicado pelo Anjo, antes de ter sido concebido no seio materno.

A exemplo de MARIA, Mãe de Deus e Rainha da Paz, que eu aprenda a SEMEAR PAZ. 

Estimados irmãos e irmãs, bom dia! Bom ano!

Comecemos o novo ano, confiando-o a Maria Mãe de Deus. O Evangelho da liturgia de hoje fala dela, reconduzindo-nos para o encanto do presépio. Os pastores vão sem demora para a gruta e o que encontram? Encontram – diz o texto – «Maria, José e o menino deitado na manjedoura» (Lc 2, 16). Façamos uma pausa sobre esta cena e imaginemos Maria que, como mãe terna e carinhosa, acabou de colocar Jesus na manjedoura. Naquele gesto podemos ver um dom feito a nós: Nossa Senhora não guarda o Filho para si, mas apresenta-o a nós; não o segura apenas no seu colo, mas depõe-no para nos convidar a olhar para ele, acolhê-lo e adorá-lo. Eis a maternidade de Maria: o Filho que nasceu é oferecido a todos nós. Sempre oferecendo o Filho, indicando o Filho, nunca o reteve como unicamente seu, não. E foi assim ao longo da vida de Jesus.

E ao colocá-lo diante dos nossos olhos, sem dizer uma palavra, transmite-nos uma mensagem maravilhosa: Deus está próximo, ao nosso alcance. Ele não vem com o poder de quem quer ser temido, mas com a fragilidade de quem pede para ser amado; não julga a partir do alto de um trono, mas olha para nós de baixo como irmão, aliás, como filho. Ele nasce pequenino e necessitado para que ninguém se envergonhe: precisamente quando experimentamos a nossa fraqueza e fragilidade, podemos sentir Deus ainda mais próximo, porque Ele se nos apresentou assim, débil e frágil. É o Deus-menino que nasce para não excluir ninguém. Para nos tornar todos irmãos e irmãs.

Eis então: o novo ano começa com Deus que, nos braços da sua Mãe e deitado numa manjedoura, nos encoraja ternamente. Precisamos deste encorajamento. (...) Muitos estão assustados com o futuro e sobrecarregados por situações sociais, problemas pessoais, perigos que provêm da crise ecológica, injustiças e desequilíbrios económicos planetários. Olhando para Maria com o Filho nos braços, penso nas jovens mães e nos seus filhos que fogem das guerras e da fome ou que aguardam nos campos de refugiados. São tantos! E ao contemplarmos Maria que coloca Jesus na manjedoura, pondo-o à disposição de todos, lembremo-nos que o mundo muda e a vida de todos só melhora se nos colocarmos à disposição dos outros, sem esperar que eles comecem a fazê-lo. Se nos tornarmos artífices da fraternidade, seremos capazes de tecer os fios de um mundo dilacerado por guerras e violências.

Hoje celebramos o Dia Mundial da Paz. A paz «é conjuntamente dádiva do Alto e fruto dum empenho compartilhado» (Mensagem para o LV Dia Mundial da Paz, 1). Dádiva do alto: deve ser implorada a Jesus, porque sozinhos não somos capazes de a salvaguardar. Só podemos verdadeiramente construir a paz se a tivermos no coração, só se a recebermos do Príncipe da paz. Mas a paz é também empenho nosso: exige que demos o primeiro passo, requer gestos concretos. É construída com atenção aos últimos, com a promoção da justiça, com a coragem do perdão, que extingue o fogo do ódio. E também precisa de uma perspetiva positiva: que olhemos sempre – na Igreja como na sociedade – não para o mal que nos divide, mas para o bem que nos pode unir! Não nos devemos abater nem lamentar, mas arregaçar as mangas para construir a paz. A Mãe de Deus, Rainha da paz, no início deste ano, obtenha concórdia para os nossos corações e para o mundo inteiro.

Papa Francisco
Angelus, 1 de janeiro de 2022

 

Bom Ano Novo - 2024

sábado, 30 de dezembro de 2023

 FESTA DA SAGRADA FAMÍLIA DE 

JESUS, MARIA E JOSÉ

Domingo - 31/12/2023

Lc 2, 22-40

«os meus olhos viram a vossa salvação, que pusestes ao alcance de todos os povos: luz para se revelar às nações e glória de Israel, vosso povo»

«Este Menino foi estabelecido para que muitos caiam ou se levantem em Israel e para ser sinal de contradição; – e uma espada trespassará a tua alma – assim se revelarão os pensamentos de todos os corações».

A família está no centro da liturgia deste domingo da oitava do Natal. De modos diferentes cada leitura vai apresentando uma cultura, um destino, um caminho, uma proposta de Deus para a família, que se pauta pela simplicidade, pela pobreza, pela harmonia das relações, pelos sentimentos de fidelidade uns aos outros e a Deus, pela escuta da Palavra de Deus e docilidade ao Espírito Santo. Há uma relação direta entre o amor a Deus e o amor aos pais, mesmo que eles sejam de idade avançada e tenham a mente enfraquecida, porque o amor aos pais é catalisador do perdão e da misericórdia de Deus.

A 1ª leitura (Sir 3, 3-7.14-17a) faz-nos memória de que o cumprimento do quarto mandamento, honrar pai e mãe, é uma fonte de bênçãos: o perdão dos pecados; a garantia de longa vida; encontrar alegria nos filhos; ser atendido na oração.

"Deus quis honrar os pais nos filhos e firmou sobre eles a autoridade da mãe. Quem honra seu pai obtém o perdão dos pecados e acumula um tesouro quem honra sua mãe. Quem honra o pai encontrará alegria nos seus filhos e será atendido na sua oração. Quem honra seu pai terá longa vida, e quem lhe obedece será o conforto de sua mãe. Filho, ampara a velhice do teu pai e não o desgostes durante a sua vida. Se a sua mente enfraquece, sê indulgente para com ele e não o desprezes, tu que estás no vigor da vida, porque a tua caridade para com teu pai nunca será esquecida e converter-se-á em desconto dos teus pecados." 

Na 2ª leitura (Col 3, 12-21) S.Paulo  apresenta uma série de princípios importantes para viver segundo o evangelho. Revestido de Cristo pelo Batismo, o cristão assume atitudes e sentimentos, que revelam uma verdadeira conversão, na relação com os irmãos. Paulo indica como principais a misericórdia, a bondade, a humildade, a mansidão e a paciência. Recorda ainda que, em todas as situações, a Palavra de Deus deve estar no centro, tanto para resolver conflitos, como para ensinar ou para a oração e o louvor.

"Irmãos: Como eleitos de Deus, santos e prediletos, revesti-vos de sentimentos de misericórdia, de bondade, humildade, mansidão e paciência. Suportai-vos uns aos outros e perdoai-vos mutuamente, se algum tiver razão de queixa contra outro. Tal como o Senhor vos perdoou, assim deveis fazer vós também. Acima de tudo, revesti-vos da caridade, que é o vínculo da perfeição. Reine em vossos corações a paz de Cristo, à qual fostes chamados para formar um só corpo. E vivei em ação de graças. Habite em vós com abundância a palavra de Cristo, para vos instruirdes e aconselhardes uns aos outros com toda a sabedoria; e com salmos, hinos e cânticos inspirados, cantai de todo o coração a Deus a vossa gratidão. E tudo o que fizerdes, por palavras ou por obras, seja tudo em nome do Senhor Jesus, dando graças, por Ele, a Deus Pai. Esposas, sede submissas aos vossos maridos, como convém no Senhor. Maridos, amai as vossas esposas e não as trateis com aspereza. Filhos, obedecei em tudo a vossos pais, porque isto agrada ao Senhor. Pais, não exaspereis os vossos filhos, para que não caiam em desânimo." 

No evangelho (Lc 2, 22-40) Lucas apresenta-nos a Sagrada Família a ir ao templo, para circuncidar o Menino, no estrito cumprimento da Lei. É aí que se dá o encontro com Simeão e Ana, de que nos fala a leitura. Ambos viviam segundo o Espírito Santo que lhes dá a Graça de reconhecerem no Menino de Maria o Filho de Deus, o Messias prometido, em quem se realiza a esperança definitiva do homem.

"Ao chegarem os dias da purificação, segundo a Lei de Moisés, Maria e José levaram Jesus a Jerusalém, para O apresentarem ao Senhor, como está escrito na Lei do Senhor: «Todo o filho primogénito varão será consagrado ao Senhor», e para oferecerem em sacrifício um par de rolas ou duas pombinhas, como se diz na Lei do Senhor. Vivia em Jerusalém um homem chamado Simeão, homem justo e piedoso, que esperava a consolação de Israel; e o Espírito Santo estava nele. O Espírito Santo revelara-lhe que não morreria antes de ver o Messias do Senhor; e veio ao templo, movido pelo Espírito. Quando os pais de Jesus trouxeram o Menino, para cumprirem as prescrições da Lei no que lhes dizia respeito, Simeão recebeu-O em seus braços e bendisse a Deus, exclamando: «Agora, Senhor, segundo a vossa palavra, deixareis ir em paz o vosso servo, porque os meus olhos viram a vossa salvação, que pusestes ao alcance de todos os povos: luz para se revelar às nações e glória de Israel, vosso povo». O pai e a mãe do Menino Jesus estavam admirados com o que d’Ele se dizia. Simeão abençoou-os e disse a Maria, sua Mãe: «Este Menino foi estabelecido para que muitos caiam ou se levantem em Israel e para ser sinal de contradição; – e uma espada trespassará a tua alma – assim se revelarão os pensamentos de todos os corações». Havia também uma profetisa, Ana, filha de Fanuel, da tribo de Aser. Era de idade muito avançada e tinha vivido casada sete anos após o tempo de donzela e viúva até aos oitenta e quatro. Não se afastava do templo, servindo a Deus noite e dia, com jejuns e orações. Estando presente na mesma ocasião, começou também a louvar a Deus e a falar acerca do Menino a todos os que esperavam a libertação de Jerusalém. Cumpridas todas as prescrições da Lei do Senhor, voltaram para a Galileia, para a sua cidade de Nazaré. Entretanto, o Menino crescia, tornava-Se robusto e enchia-Se de sabedoria. E a graça de Deus estava com Ele." 

Obrigada Senhor pela família que me deste. Ensina-me a honrar, a amar, todos os seus membros, como parte integrante dela.

Bom dia, queridos irmãos e irmãs!

Neste primeiro domingo depois do Natal, celebramos a Sagrada Família de Nazaré, e o Evangelho convida-nos a refletir sobre a experiência vivida por Maria, José e Jesus, enquanto crescem juntos como família no amor recíproco e na confiança em Deus. Desta confiança é expressão o rito cumprido por Maria e José com a oferta do Filho Jesus a Deus. O Evangelho diz: «Levaram o Menino a Jerusalém para o apresentar ao Senhor» (Lc 2, 22), como exigia a lei mosaica. Os pais de Jesus vão ao templo para atestar que o Filho pertence a Deus, e que eles são os guardiões da sua vida e não os donos. E isto leva-nos a refletir. Todos os pais são guardiões da vida dos filhos, não donos, e devem ajudá-los a crescer, a amadurecer.

Este gesto sublinha que somente Deus é o Senhor da história individual e familiar; tudo nos vem dele. Cada família é chamada a reconhecer este primado, protegendo e educando os filhos a abrir-se a Deus, que é a própria nascente da vida. Passa por aqui o segredo da juventude interior, testemunhado paradoxalmente no Evangelho por um casal de idosos, Simeão e Ana. O velho Simeão, em particular, inspirado pelo Espírito Santo, a propósito do Menino Jesus diz: «Eis que este menino está destinado a ser uma causa de queda e de ressurreição para muitos homens em Israel, e a ser um sinal que provocará contradições [...] a fim de serem revelados os pensamentos de muitos corações» (vv. 34-35).

Estas palavras proféticas revelam que Jesus veio para fazer cair as falsas imagens que nós criamos de Deus, e também de nós mesmos; para “contradizer” as seguranças mundanas sobre as quais pretendemos apoiar-nos; a fim de nos fazer “ressurgir” para um caminho humano e cristão verdadeiro, fundamentado nos valores do Evangelho. Não existe situação familiar que esteja excluída deste caminho novo de renascimento e de ressurreição. E cada vez que as famílias, até aquelas feridas e marcadas por fragilidades, fracassos e dificuldades, voltam à fonte da experiência cristã, abrem-se caminhos novos e possibilidades impensadas.

A narração evangélica de hoje refere que Maria e José, «após terem observado tudo segundo a lei do Senhor, voltaram para a Galileia, para a sua cidade de Nazaré. O Menino crescia — reza o Evangelho — e fortificava-se: era cheio de sabedoria, e a graça de Deus estava sobre Ele» (vv. 39-40). Uma grande alegria da família é o crescimento dos filhos, como todos sabemos. Eles estão destinados a desenvolver-se e a revigorar-se, a adquirir sabedoria e a receber a graça de Deus, exatamente como aconteceu com Jesus. Ele é verdadeiramente um de nós: o Filho de Deus faz-se Menino, aceita crescer, fortificar-se, é cheio de sabedoria, e a graça de Deus está sobre Ele. Maria e José têm a alegria de ver tudo isto no seu Filho; e esta é a missão para a qual a família está orientada: criar as condições favoráveis para o crescimento harmonioso e completo dos filhos, a fim de que eles possam levar uma vida boa, digna de Deus e construtiva para o mundo.

São estes os votos que dirijo a todas as famílias hoje, acompanhando-os com a invocação a Maria, Rainha da Família.

Papa Francisco
Angelus, 31 de dezembro de 2017

domingo, 24 de dezembro de 2023

Feliz Natal!



 Ano B - 2023

Natal do Senhor

Segunda-feira - 25/12/2023

Jo 1, 1-18 

«No princípio era o Verbo e o Verbo estava com Deus e o Verbo era Deus. No princípio, Ele estava com Deus.»

«O Verbo era a luz verdadeira, que, vindo ao mundo, ilumina todo o homem.» 

«E o Verbo fez-Se carne e habitou entre nós.» 

«A Deus, nunca ninguém O viu. O Filho Unigénito, que está no seio do Pai, é que O deu a conhecer.»

Hoje, dia de Natal, todas as leituras nos convidam a exultar de alegria, porque o Filho de Deus veio habitar no meio de nós, homens de ontem, de hoje e de sempre, e revelar-nos Deus Amor, perdidamente enamorado por cada um de nós, Suas criaturas. Louvemos e demos glória ao nosso Deus, contemplando o Mistério do Menino Deus.

Na 1ªleitura (Is 52, 7-10) o profeta diz-nos que todos veremos a salvação do nosso Deus. E é assim que culminará a história de amor que Deus fez, e continua a fazer, com a humanidade e com cada um de nós Seus filhos no Filho, cujo nascimento celebramos no dia 25 de dezembro de cada ano. Como não exultar e romper em brados de alegria, quando, em Jesus, vamos aprendendo a conhecer até que ponto Deus nos ama.

“Como são belos sobre os montes os pés do mensageiro que anuncia a paz, que traz a boa nova, que proclama a salvação e diz a Sião: «O teu Deus é Rei». Eis o grito das tuas sentinelas que levantam a voz. Todas juntas soltam brados de alegria, porque veem com os próprios olhos o Senhor que volta para Sião. Rompei todas em brados de alegria, ruínas de Jerusalém, porque o Senhor consola o seu povo, resgata Jerusalém. O Senhor descobre o seu santo braço à vista de todas as nações e todos os confins da terra verão a salvação do nosso Deus.”

Na 2ªleitura (Hebr 1, 1-6) S.Paulo leva-nos a contemplar o mistério do Amor que veio habitar no meio de nós, homens de ontem, de hoje e de amanhã. Contemplemos e adoremos Deus Menino deitado numa manjedoura.

“Muitas vezes e de muitos modos falou Deus antigamente aos nossos pais, pelos Profetas. Nestes dias, que são os últimos, falou-nos por seu Filho, a quem fez herdeiro de todas as coisas e pelo qual também criou o universo. Sendo o Filho esplendor da sua glória e imagem da sua substância, tudo sustenta com a sua palavra poderosa. Depois de ter realizado a purificação dos pecados, sentou-Se à direita da Majestade no alto dos Céus e ficou tanto acima dos Anjos quanto mais sublime que o deles é o nome que recebeu em herança. A qual dos Anjos, com efeito, disse Deus alguma vez: «Tu és meu Filho, Eu hoje Te gerei»? E ainda: «Eu serei para Ele um Pai e Ele será para Mim um Filho»? E de novo, quando introduziu no mundo o seu Primogénito, disse: «Adorem-n’O todos os Anjos de Deus».”

 

No evangelho (Jo 1, 1-18) João, de uma forma tão profunda, quanto bela, ajuda-nos a contemplar e adorar o Mistério de Deus que veio ao mundo, na pessoa de Jesus, Seu Único e muito amado Filho. Só em e por Jesus podemos encontrar-nos com Deus, porque só Ele, que está no seio do Pai, no-l’O pode dar a conhecer. Que o Menino Jesus nos ilumine com a Sua Luz.

No princípio era o Verbo e o Verbo estava com Deus e o Verbo era Deus. No princípio, Ele estava com Deus. Tudo se fez por meio d’Ele e sem Ele nada foi feito. N’Ele estava a vida e a vida era a luz dos homens. A luz brilha nas trevas e as trevas não a receberam. Apareceu um homem enviado por Deus, chamado João. Veio como testemunha, para dar testemunho da luz, a fim de que todos acreditassem por meio dele. Ele não era a luz, mas veio para dar testemunho da luz. O Verbo era a luz verdadeira, que, vindo ao mundo, ilumina todo o homem. Estava no mundo e o mundo, que foi feito por Ele, não O conheceu. Veio para o que era seu e os seus não O receberam. Mas àqueles que O receberam e acreditaram no seu nome, deu-lhes o poder de se tornarem filhos de Deus. Estes não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus. E o Verbo fez-Se carne e habitou entre nós. Nós vimos a sua glória, glória que Lhe vem do Pai como Filho Unigénito, cheio de graça e de verdade. João dá testemunho d’Ele, exclamando: «É deste que eu dizia: ‘O que vem depois de mim passou à minha frente, porque existia antes de mim’». Na verdade, foi da sua plenitude que todos nós recebemos graça sobre graça. Porque, se a Lei foi dada por meio de Moisés, a graça e a verdade vieram por meio de Jesus Cristo. A Deus, nunca ninguém O viu. O Filho Unigénito, que está no seio do Pai, é que O deu a conhecer.”

Glória a Deus no alto dos Céus e paz na terra aos homens.

Queridos irmãos e irmãs de Roma e do mundo inteiro, feliz Natal!

Que o Senhor Jesus, nascido da Virgem Maria, traga a todos vós o amor de Deus, fonte de confiança e esperança, juntamente com o dom da paz, que os anjos anunciaram aos pastores de Belém: «Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens do seu agrado» (Lc 2, 14).

Neste dia de festa, voltemos o olhar para Belém. O Senhor vem ao mundo numa gruta e é recostado numa manjedoura para os animais, porque os seus pais não conseguiram encontrar hospedagem, apesar de estar quase na hora de Maria dar à luz. Vem entre nós no silêncio e escuridão da noite, porque o Verbo de Deus não precisa de holofotes nem do clamor das vozes humanas. Ele mesmo é a Palavra que dá sentido à existência. Ele é a luz que ilumina o caminho. «O Verbo era a Luz verdadeira que, ao vir ao mundo – diz o Evangelho –, a todo o homem ilumina» (Jo 1, 9).

Jesus nasce no meio de nós, é Deus-connosco. Vem para acompanhar a nossa vida quotidiana, partilhar tudo connosco, alegrias e amarguras, esperanças e inquietações. Vem como menino indefeso. Nasce ao frio, pobre entre os pobres. Carecido de tudo, bate à porta do nosso coração para encontrar calor e abrigo.

Como os pastores de Belém, deixemo-nos envolver pela luz e saiamos para ver o sinal que Deus nos deu. Vençamos o torpor do sono espiritual e as falsas imagens da festa que fazem esquecer Quem é o Festejado. Saiamos do tumulto que anestesia o coração induzindo-nos mais a preparar ornamentações e prendas do que a contemplar o Evento: o Filho de Deus nascido para nós.

Irmãos, irmãs, voltemo-nos para Belém, onde ressoa o primeiro choro do Príncipe da paz. Sim, porque Ele mesmo – Jesus – é a nossa paz: aquela paz que o mundo não se pode dar a si mesmo e Deus Pai concedeu-a à humanidade enviando o seu Filho ao mundo. São Leão Magno tem uma frase que, na sua concisão latina, bem resume a mensagem deste dia: «Natalis Domini, Natalis est pacis – o Natal do Senhor é o Natal da paz» (Sermão 26, 5).

Jesus Cristo é também o caminho da paz. Com a sua encarnação, paixão, morte e ressurreição, abriu a passagem de um mundo fechado, oprimido pelas trevas da inimizade e da guerra, para um mundo aberto, livre para viver na fraternidade e na paz. Irmãos e irmãs, sigamos este caminho! Mas, para o podermos fazer, para sermos capazes de seguir os passos de Jesus, devemos despojar-nos dos pesos que nos enredam e bloqueiam.

E quais são esses pesos? Que vem a ser este entulho que nos sobrecarrega? Trata-se das mesmas paixões negativas que impediram o rei Herodes e a sua corte de reconhecer e acolher o nascimento de Jesus, isto é, o apego ao poder e ao dinheiro, o orgulho, a hipocrisia, a mentira. Estes pesos impedem de ir a Belém, excluem da graça do Natal e fecham o acesso ao caminho da paz. Na realidade, é com tristeza que devemos constatar como, enquanto nos é dado o Príncipe da paz, ventos de guerra continuam a soprar, gelados, sobre a humanidade.

Se queremos que seja Natal, o Natal de Jesus e da paz, voltemos o olhar para Belém e fixemo-lo no rosto do Menino que nasceu para nós! E, naquele rostinho inocente, reconheçamos o das crianças que, em todas as partes do mundo, anseiam pela paz.

O nosso olhar se encha com os rostos dos irmãos e irmãs ucranianos que vivem este Natal na escuridão, ao frio ou longe das suas casas, devido à destruição causada por dez meses de guerra. O Senhor nos torne disponíveis e prontos para gestos concretos de solidariedade a fim de ajudar todos os que sofrem, e ilumine as mentes de quantos têm o poder de fazer calar as armas e pôr termo imediato a esta guerra insensata! Infelizmente, prefere-se ouvir outras razões, ditadas pelas lógicas do mundo. Mas a voz do Menino, quem a escuta?

O nosso tempo vive uma grave carestia de paz também noutras regiões, noutros teatros desta terceira guerra mundial. Pensamos na Síria, ainda martirizada por um conflito que passou para segundo plano, mas não terminou; e pensamos na Terra Santa, onde nos últimos meses aumentaram as violências e os confrontos, com mortos e feridos. Supliquemos ao Senhor para que lá, na terra que O viu nascer, retomem o diálogo e a aposta na confiança mútua entre palestinenses e israelitas. Jesus Menino ampare as comunidades cristãs que vivem em todo o Médio Oriente, para que se possa viver, em cada um daqueles países, a beleza da convivência fraterna entre pessoas que pertencem a crenças diferentes. De modo particular ajude o Líbano para que possa, finalmente, erguer-se com o apoio da Comunidade Internacional e com a força da fraternidade e da solidariedade. A luz de Cristo ilumine a região do Sahel, onde a convivência pacífica entre povos e tradições é transtornada por confrontos e violências. Encaminhe para uma trégua duradoura no Iémen e para a reconciliação no Myanmar e no Irão, para que cesse completamente o derramamento de sangue. E, no continente americano, inspire as autoridades políticas e todas as pessoas de boa vontade a trabalharem para pacificar as tensões políticas e sociais que afetam vários países; penso de modo particularna população haitiana, que está a sofrer há tanto tempo.

Neste dia, em que sabe bem encontrar-se ao redor da mesa recheada, não desviemos o olhar de Belém – que significa «casa do pão» – e pensemos nas pessoas que padecem fome, sobretudo as crianças, enquanto diariamente se desperdiçam quantidades imensas de alimentos e se gastam tantos recursos em armas. A guerra na Ucrânia agravou ainda mais a situação, deixando populações inteiras em risco de carestia, especialmente no Afeganistão e nos países do Corno de África. Toda a guerra – bem o sabemos – provoca fome e serve-se do próprio alimento como arma, ao impedir a sua distribuição às populações já atribuladas. Neste dia, aprendendo com o Príncipe da paz, empenhemo-nos todos – a começar pelos que têm responsabilidades políticas – para que o alimento seja só instrumento de paz. Enquanto saboreamos a alegria de nos reunirmos com os nossos, pensemos nas famílias mais atribuladas pela vida e naquelas que, neste tempo de crise económica, atravessam dificuldades por causa do desemprego e carecem do necessário para viver.

Queridos irmãos e irmãs, hoje como há dois mil anos Jesus, a luz verdadeira, vem a um mundo achacado de indiferença – uma feia doença! – que não O acolhe (cf. Jo 1, 11); antes, rejeita-O como acontece a muitos estrangeiros, ou ignora-O como fazemos nós muitas vezes com os pobres. Hoje não nos esqueçamos dos numerosos deslocados e refugiados que batem à nossa porta à procura de conforto, calor e alimento. Não nos esqueçamos dos marginalizados, das pessoas sós, dos órfãos e dos idosos – a sabedoria dum povo – que correm o risco de acabar descartados, dos presos que olhamos apenas sob o prisma dos seus erros e não como seres humanos.

Irmãos e irmãs, Belém mostra-nos a simplicidade de Deus, que Se revela, não aos sábios e entendidos, mas aos pequeninos, a quantos têm o coração puro e aberto (cf. Mt 11, 25). Como os pastores, vamos também nós sem demora e deixemo-nos maravilhar pelo Evento incrível de Deus que Se faz homem para nossa salvação. Aquele que é fonte de todo o bem faz-Se pobre [1] e pede de esmola a nossa pobre humanidade. Deixemo-nos comover pelo amor de Deus e sigamos Jesus, que Se despojou da sua glória para nos tornar participantes da sua plenitude. [2]

Feliz Natal para todos!

Papa Francisco
MENSAGEM URBI ET ORBI
NATAL 2022

sábado, 23 de dezembro de 2023

 Ano B - 2023

Advento passo a passo - 4   

22º dia - Domingo - 24/12/2023

Lc 1,  26-38

«O Espírito Santo virá sobre ti e a força do Altíssimo te cobrirá com a sua sombra. Por isso o Santo que vai nascer será chamado Filho de Deus.»

«a Deus nada é impossível»

«Eis a escrava do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra»

Neste último domingo do Advento somos convidados a acolher o Senhor que vem e a fazermos, de nós próprios, a morada, a habitação do Salvador.

Na 1ªleitura (2 Sam 7, 1-5.8b-12.14a.16) Deus promete a David uma casa, uma linhagem, da qual nascerá Jesus, o Salvador. É essa vinda, o nascimento do Deus Menino, que vamos celebrar já esta noite, e/ou no dia de amanhã. 

“Quando David já morava em sua casa e o Senhor lhe deu tréguas de todos os inimigos que o rodeavam, o rei disse ao profeta Natã: «Como vês, eu moro numa casa de cedro e a arca de Deus está debaixo de uma tenda». Natã respondeu ao rei: «Faz o que te pede o teu coração, porque o Senhor está contigo». Nessa mesma noite, o Senhor falou a Natã, dizendo: «Vai dizer ao meu servo David: Assim fala o Senhor: Pensas edificar um palácio para Eu habitar? Tirei-te das pastagens onde guardavas os rebanhos, para seres o chefe do meu povo de Israel. Estive contigo em toda a parte por onde andaste e exterminei diante de ti todos os teus inimigos. Dar-te-ei um nome tão ilustre como o nome dos grandes da terra. Prepararei um lugar para o meu povo de Israel; e nele o instalarei para que habite nesse lugar, sem que jamais tenha receio e sem que os perversos tornem a oprimi-lo como outrora, quando Eu constituía juízes no meu povo de Israel. Farei que vivas seguro de todos os teus inimigos. O Senhor anuncia que te vai fazer uma casa. Quando chegares ao termo dos teus dias e fores repousar com teus pais estabelecerei em teu lugar um descendente que há de nascer de ti e consolidarei a tua realeza. Serei para ele um pai e ele será para Mim um filho. A tua casa e o teu reino permanecerão diante de Mim eternamente e o teu trono será firme para sempre».”

Perante o Mistério do imenso Amor de Deus, que é o nascimento do Menino Deus que vem dar a Sua vida por cada um de nós, só podemos exultar de alegria e de agradecimento, tal como nos propõe S.Paulo na 2ªleitura (Rom 16, 25-27). Como pode Deus amar-nos assim tanto? Mas a verdade é que ama, por isso, mesmo sem entendermos, somos convidados a contemplar este Mistério.

“Irmãos: Seja dada glória a Deus, que tem o poder de vos confirmar, segundo o Evangelho que eu proclamo, anunciando Jesus Cristo. Esta é a revelação do mistério que estava encoberto desde os tempos eternos mas agora foi manifestado e dado a conhecer a todos os povos pelas escrituras dos Profetas segundo a ordem do Deus eterno, para que eles sejam conduzidos à obediência da fé. A Deus, o único sábio, por Jesus Cristo, seja dada glória pelos séculos dos séculos. Ámen.”

No Evangelho (Lc 1, 26-38) desenrola-se, perante os nossos olhos, uma dinâmica da comunhão de Deus com alguém, por Ele escolhida, desde sempre, para corredenção da humanidade. Maria, ao dizer Sim, torna-se a morada de Deus no meio dos homens. Contemplando a forma como a nossa Mãe respondeu à vontade do Senhor, somos convidados, também nós, a deixarmos que Deus nos habite. Confiemos no Senhor e deixemo-nos habitar, amar por Ele.

Naquele tempo, o Anjo Gabriel foi enviado por Deus a uma cidade da Galileia chamada Nazaré, a uma Virgem desposada com um homem chamado José, que era descendente de David. O nome da Virgem era Maria. Tendo entrado onde ela estava, disse o Anjo: «Ave, cheia de graça, o Senhor está contigo». Ela ficou perturbada com estas palavras e pensava que saudação seria aquela. Disse-lhe o Anjo: «Não temas, Maria, porque encontraste graça diante de Deus. Conceberás e darás à luz um Filho, a quem porás o nome de Jesus. Ele será grande e chamar-Se-á Filho do Altíssimo. O Senhor Deus Lhe dará o trono de seu pai David; reinará eternamente sobre a casa de Jacob e o seu reinado não terá fim». Maria disse ao Anjo: «Como será isto, se eu não conheço homem?». O Anjo respondeu-lhe: «O Espírito Santo virá sobre ti e a força do Altíssimo te cobrirá com a sua sombra. Por isso o Santo que vai nascer será chamado Filho de Deus. E a tua parenta Isabel concebeu também um filho na sua velhice e este é o sexto mês daquela a quem chamavam estéril; porque a Deus nada é impossível». Maria disse então: «Eis a escrava do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra».”

Glória ao Senhor, louvor ao Senhor, cantai-Lhe terra inteira, bendizei o Seu nome.

À escuta do Evangelho: a solidariedade da Imaculada 

«Ao sexto mês, o anjo Gabriel foi enviado por Deus a uma cidade da Galileia chamada Nazaré, a uma virgem desposada com um homem chamado José, da casa de David; e o nome da virgem era Maria. Ao entrar em casa dela, o anjo disse-lhe: «Salve, ó cheia de graça, o Senhor está contigo.» Ao ouvir estas palavras, ela perturbou-se e inquiria de si própria o que significava tal saudação. Disse-lhe o anjo: «Maria, não temas, pois achaste graça diante de Deus. Hás de conceber no teu seio e dar à luz um filho, ao qual porás o nome de Jesus. Será grande e vai chamar-se Filho do Altíssimo. O Senhor Deus vai dar-lhe o trono de seu pai David, reinará eternamente sobre a casa de Jacob e o seu reinado não terá fim.» Maria disse ao anjo: «Como será isso, se eu não conheço homem?» O anjo respondeu-lhe: «O Espírito Santo virá sobre ti e a força do Altíssimo estenderá sobre ti a sua sombra. Por isso, aquele que vai nascer é Santo e será chamado Filho de Deus. Também a tua parente Isabel concebeu um filho na sua velhice e já está no sexto mês, ela, a quem chamavam estéril, porque nada é impossível a Deus.» Maria disse, então: «Eis a serva do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra.» E o anjo retirou-se de junto dela. (Lc 1,26-38) 

O Senhor está com Maria. Encarnando no seu seio, Deus fez de Maria a Sua Mãe. Desde então, onde está a Virgem Mãe, aí está Jesus, Seu Filho. Tudo por vontade divina. Não podemos separar Maria de Jesus.

Gabriel, o Arcanjo enviado do Céu, tem uma postura muito respeitosa face a Maria. Depois de a ter saudado com uma saudação única na história da Humanidade - «Salve, ó cheia de graça» – ele enche-a de confiança, antes de expor o anúncio que lhe vem fazer. Depois, tendo respondido a um pedido de esclarecimento, fica à espera da resposta que a Virgem lhe vai dar. A dignidade de Maria é incomparável. Com efeito, Maria é a «cheia de graça», foi «preservada de toda a mancha de pecado original, desde o primeiro instante da sua conceção, por uma graça e um favor singular de Deus todo-poderoso» (Cf. Definição do Dogma da Imaculada Conceição). E, no entanto, esta dignidade que não foi atribuída a mais ninguém, não eclipsa a dignidade dos homens, antes pelo contrário, a sua Imaculada Conceição é um privilégio que a torna plenamente solidária com a nossa condição humana, por duas razões: A primeira é que o facto de ela ter sido concebida sem pecado desde o primeiro instante da sua existência, é uma graça que emana da Cruz, por antecipação. Dito de outra forma, a Virgem Maria foi redimida, tal como cada um de nós. As orações da Eucaristia da Imaculada Conceição revelam que Maria foi «preservada de todo o pecado por uma graça concedida pela morte do Seu Filho». Sim, Nossa Senhora foi concebida sem pecado, foi redimida por Jesus da forma mais admirável e inesperada. Se Jesus não tivesse dado a Sua vida na Cruz, Maria não poderia ter sido preservada do pecado. Esta verdade de fé vai contra uma representação de Maria de tal forma perfeita, que até a distancia da nossa condição humana pecadora; no entanto, a Virgem Maria está bem enraizada na nossa humanidade. A segunda razão vem do seu amor total e imaculado. Uma vez que nunca conheceu o pecado, poderá Maria ser solidária com os homens pecadores como nós? Poderá mostrar empatia e compaixão por cada um de nós? Sim, e mais que ninguém, porque a solidariedade vem, não do pecado, mas do amor ao próximo. Não é a experiência da transgressão que nos torna solidários com os outros, mas o amor; não se pode confundir a experiência do pecado com a experiência do sofrimento. Uma pessoa que sofreu pode compreender uma pessoa sofredora e ter ainda mais amor por ela. Ora a Virgem Maria sofreu mais do que ninguém, como nos mostra a sua fidelidade aos pés da Cruz de Jesus… O amor imaculado de Nossa Senhora é, pois, um privilégio que a torna totalmente solidária com a humanidade, um privilégio que lhe dá um lugar mais ativo no Céu – a seguir ao próprio Deus – para favorecer a redenção dos homens. Ela é verdadeiramente a Mãe, protetora dos que põem nela a sua confiança! 

Na escola de Teresa dos Andes: «A tua Mãe nunca te deixa só»

Sabemos colocar a nossa confiança em Maria? Temos alguma imagem ou representação de Nossa Senhora em nossas casas? Joanita convida a não sermos tímidos diante de Maria. Ela própria «tinha sobre um móvel uma estatueta da Santíssima Virgem de quarenta centímetros de altura, mais ou menos, se bem me recordo, e ela beijava-a e abraçava-a com ternura, com tanto, tanto amor…», testemunhava uma amiga aquando do processo apostólico. Isto pode parecer pueril. Mas em França, em Alençon, as filhas da família Martin - incluindo Teresinha - não hesitavam em deixar de lado a timidez para beijar as mãos da Virgem do Sorriso com tanto fervor que até os dedos se partiam! Era necessário regularmente desenroscar as mãos da estátua para lhe colocar mãos novas… É importante exprimir o fervor da nossa fé com todo o nosso ser, sem excluir estes gestos muito humanos. Uma relação filial passa por contactos encarnados, como aconteceu no presépio: será que podemos imaginar a relação de ternura da Virgem Maria com o Menino recém nascido sem várias manifestações encarnadas do seu amor de Mãe?

Ter a Virgem Maria em nossa casa – quer dizer, bem presente na nossa vida espiritual e bem representada por uma imagem, em forma de estatueta ou outra, como tinha Joanita, por exemplo – é fonte de graça. A Virgem Maria faz-nos chegar as graças do seu Filho sob as mais variadas formas, sobre nós e sobre os outros. Sobre nós, através da ajuda que nos alcança com o exercício das virtudes, especialmente as da pureza e da humildade. São virtudes preciosas e sempre a proteger e a cultivar! Numa meditação de 1919 – Joanita tinha então 18 anos –, a Santíssima Virgem começou a falar com ela: «ela disse-me ao pormenor o que me tinham dito a respeito da pureza: 1) Ser puro de pensamento, quer dizer, afastar todo o pensamento que não seja de Deus para, assim, viver constantemente na Sua presença […] 2) ser pura nos meus desejos a fim de desejar apenas pertencer cada dia mais a Deus; desejar a Sua glória, desejar ser santa e agir em tudo com perfeição. Para isso, não desejar nem honra, nem elogios […] 3) ser pura nas minhas ações. Abster-me de tudo o que me pode manchar, de tudo o que Deus não admite porque quer a minha santificação; agir por Deus o melhor possível e não para que as criaturas me vejam» (Diário, 51). Prestemos atenção à progressão destas recomendações: em primeiro lugar, Nossa Senhora pede que vigiemos sobre os pensamentos que estão dentro de nós e rejeitemos voluntariamente os que não são sadios. Depois, se a nossa vigilância for constante, ainda que tenha imperfeições, recolherá frutos a seu tempo. Mas Nossa Senhora, uma vez presente na nossa casa, também vela sobre os outros. Qual a mãe que, estando presente no seio de um lar, não dedicaria todos os cuidados a um dos seus filhos que a ela recorresse, sem deixar de se preocupar com os outros? E, como por vezes é tão difícil falar de Jesus ao nosso próximo, porque não falar-lhe antes de Maria, que Jesus deu por Mãe a cada um? Esta foi a opção que Joanita com toda a mestria! O seu irmão Lucho acabou por perder a fé ao sair de casa para estudar. Isso foi para ela um motivo de grande sofrimento. Afinal, não fora ele, sendo 2 anos mais velho que Joanita, que lhe oferecera um terço, quando tinha 7 anos? «Foi nesse momento, escreve Juanita no seu diário íntimo, que começou a minha devoção à Virgem. […] O meu irmão Lucho convidara-me a recitar o rosário e fizemos juntos a promessa de o rezar toda a vida; coisa que eu cumpri até hoje. Só uma vez me esqueci, era ainda muito pequenina. Desde então posso dizer que Nosso Senhor me deu a mão com a Santíssima Virgem» (Diário 5). Todos sofremos quando o nosso próximo – cônjuge, filho, irmão, irmã, amigo de infância, etc. – não partilham a nossa fé ou ignoram a salvação de Deus que nos ama tanto. É à Virgem Maria que Joanita entrega e confia Lucho. «Querido Lucho, dou-ta para que ela me substitua junto de ti, escreve ela a uns dias de entrar no Carmelo. Fala-lhe como falas comigo, de coração a coração. Quando te sentires só, como muitas vezes eu me senti, olha para ela e verás que o seu sorriso te dirá: «A tua Mãe nunca te deixa só». Quando estiveres triste e desolado e não encontrares ninguém junto de ti para desabafar, corre até à presença de Maria que, com o seu olhar de Mãe, te diz emocionada: «Não há dor semelhante à minha dor»; reconfortar-te-á pondo na tua alma a gota de consolação que cai do seu coração dorido» (Cta 81). Invocar a Virgem como nossa Mãe pode parecer, aos olhos de muitos, infantilidade ou apenas aumento da afetividade. Mas o fervor mariano não é sentimental, é filial. Lucho, após a morte de Teresa acabará por se converter ao fim de longos anos de incredulidade. Terá acabado por reencontrar o seu elo filial com o Pai que está nos Céus, graças à Virgem Maria e à oração da sua irmã Joanita.

Concretamente: voltarmo-nos para Maria

O homem é convidado a recuperar sempre mais este laço filial, sempre, mas sobretudo no meio das provações. A maternidade de Maria é um poderoso amparo para conseguir fazê-lo. «Quando a sua alma luta contra o desencorajamento, escreve Juanita sem temor, diga-lhe então: «Maria, mostra-me que és minha Mãe». Invoque-a quando luta para cumprir os seus deveres de cristão» (Cta 150).

A Virgem Maria, quando estava para dar à luz o seu Filho, no dia de Natal, recebe em plenitude esta graça da maternidade, uma maternidade estendida a todos nós, seus filhos também. Não hesitemos em voltar-nos para A Mãe, para a NOSSA Mãe. Quem se volta para ela nunca será desiludido; a deceção é uma palavra ausente dos escritos de santa Teresa dos Andes. Que a deceção, graças a Maria, e apesar de todas as nossas fraquezas, seja também uma palavra ausente das nossas vidas!

Frei Cyril ROBERT, ocd (convento de Paris) 

Retiro do Advento 2023 com Santa Teresa dos Andes (1900-1920) - Enraizados da Alegria Divina   ©Ordem dos Carmelitas Descalços