terça-feira, 23 de maio de 2023

   TEMPO PASCAL - 2023

Quarta-feira da semana VII do Tempo Pascal - dia 46 - 24/05/2023

Evangelho Jo 17, 11b-19

«Mas agora vou para Ti»;  

«E digo isto no mundo, para que eles tenham em si mesmos a plenitude da minha alegria.»

«Não peço que os tires do mundo, mas que os livres do mal.»; 

«Consagra-os na verdade.»; 

«A tua palavra é a verdade.» 

A primeira ideia do texto é a pertença ao Pai. O Pai cuida de Jesus e Jesus cuida dos discípulos. Agora que Jesus parte, o Pai cuidará dos discípulos porque pertencem a Jesus e porque receberam a Palavra e ainda porque, embora estejam no mundo, não são do mundo. Esta pertença a Deus vive-se no mundo, com a Palavra da verdade que consagra os discípulos na verdade. Há um movimento de amor do Pai para o Filho e do Filho para os discípulos, assim como há um movimento na missão e na palavra que vem do Pai, passa pelo Filho e atinge os discípulos.

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Naquele tempo, Jesus ergueu os olhos ao Céu e orou deste modo: «Pai santo, guarda-os em teu nome, o nome que Me deste, para que sejam um, como Nós. Quando Eu estava com eles, guardava-os em teu nome, o nome que Me deste. Guardei-os e nenhum deles se perdeu, a não ser o filho da perdição; e assim se cumpriu a Escritura. Mas agora vou para Ti; e digo isto no mundo, para que eles tenham em si mesmos a plenitude da minha alegria. Dei-lhes a tua palavra e o mundo odiou-os, por não serem do mundo, como Eu não sou do mundo. Não peço que os tires do mundo, mas que os livres do mal. Eles não são do mundo, como Eu não sou do mundo. Consagra-os na verdade. A tua palavra é a verdade. Assim como Tu Me enviaste ao mundo, também Eu os enviei ao mundo. Eu consagro-Me por eles, para que também eles sejam consagrados na verdade».

“Não peço que os tires do mundo”. Tudo seria bem mais fácil se os discípulos de Jesus perdessem a sua condição humana e adquirissem características distintas, que os retirassem do mundo. Jesus não quer que eu saia do mundo, mas que esteja no mundo consagrado na verdade que me é dada na Palavra. Jesus quer que eu viva a minha condição de pertença ao Pai e a sua consequente missão, aqui, nas circunstâncias limitadas do mundo que não aceita o testemunho cristão.

Consagra-me na verdade. Consagra-me na tua palavra da verdade para que viva em plenitude a minha condição de discípulo no meio do mundo, mesmo contra a vontade do mundo. Consagra-me e guarda-me no teu nome, Senhor.

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(...)

Em primeiro lugar, guardar a fé. Devemos guardar a fé para não sucumbir à tribulação nem cair na resignação de quem já não vê uma via de saída. Com efeito, antes das palavras, o Evangelho faz-nos contemplar uma atitude de Jesus: rezava (diz o evangelista) «levantando os olhos ao céu» (Jo 17, 1). (...)

A oração abre-nos à confiança em Deus mesmo nos momentos difíceis, ajuda-nos a esperar não obstante todas as evidências em contrário, sustenta-nos na batalha diária. Não é uma fuga, um modo para escapar dos problemas. Pelo contrário, é a única arma que temos para guardar o amor e a esperança no meio de tantas armas que semeiam morte. Não é fácil levantar o olhar quando estamos na tribulação, mas a fé ajuda-nos a vencer a tentação de nos fecharmos em nós mesmos. Talvez nos venha vontade de protestar, gritar o nosso sofrimento também a Deus: não devemos ter medo de o fazer; também isso é oração. Uma senhora idosa dizia aos seus netos: «Zangar-se com Deus também pode ser uma oração». É a sabedoria dos justos e dos simples, que sabem levantar o olhar [para Deus] nos momentos difíceis... Em certos momentos, é uma oração que Deus atende mais depressa que outras, porque nasce dum coração ferido, e o Senhor sempre escuta o clamor do seu povo e enxuga as suas lágrimas. Queridos irmãos e irmãs, não deixeis de olhar para o alto. Guardai a fé!

Um segundo aspeto do guardar: guardar a unidade. Jesus reza ao Pai para que guarde os seus na unidade. Para que «sejam um só» (Jo 17, 21), uma única família onde reinem o amor e a fraternidade. Jesus conhecia o coração dos seus discípulos; às vezes vira-os discutir sobre quem deveria ser o maior, quem deveria mandar. Esta é uma doença mortal: a divisão. Experimentamo-la no nosso coração, porque muitas vezes nos sentimos divididos também dentro de nós mesmos; experimentamo-la nas famílias, nas comunidades, entre os povos, até mesmo na Igreja. São muitos os pecados contra a unidade: as invejas, os ciúmes, a procura de interesses pessoais em vez do bem de todos, os juízos contra os outros. E estes pequenos conflitos que existem entre nós refletem-se depois nos grandes conflitos, como o que tem vivido nestes dias o vosso país. Quando se sobrepõem os interesses partidários, a sede de lucro e poder, sempre se desencadeiam confrontos e divisões. (...)

Somos chamados a guardar a unidade, a tomar a sério esta premente súplica de Jesus ao Pai: ser um só, formar uma família, ter a coragem de viver laços de amizade, de amor, de fraternidade. Quanta necessidade há de fraternidade, sobretudo hoje! Sei que algumas situações políticas e sociais são maiores do que vós, mas o empenho pela paz e a fraternidade nasce sempre de baixo: cada qual, na medida das suas possibilidades, deve fazer a própria parte. Cada um há de empenhar-se, na medida das suas possibilidades, por ser um construtor de fraternidade, um semeador de fraternidade, há de trabalhar por reconstruir o que se rompeu em vez de alimentar a violência. Somos chamados a fazê-lo, também como Igreja: promovamos o diálogo, o respeito pelo outro, a custódia do irmão, a comunhão! E não deixemos entrar na Igreja a lógica dos partidos, a lógica que divide, a lógica de quem se coloca ao centro descartando os outros. Isto destrói: destrói a família, destrói a Igreja, destrói a sociedade, destrói-nos a nós próprios.

Por fim, terceira coisa, guardar a verdade. Jesus pede ao Pai para consagrar na verdade os seus discípulos, que são enviados por todo o mundo a fim de continuar a sua missão. Guardar a verdade não significa defender ideias, tornar-se guardiões dum sistema de doutrinas e dogmas, mas permanecer ligados a Cristo e consagrados ao seu Evangelho. A verdade – no dizer do apóstolo João – é o próprio Cristo, revelação do amor do Pai. Jesus reza para que os discípulos, vivendo no mundo, não sigam os critérios deste mundo. Que não se deixem fascinar pelos ídolos, mas guardem a amizade com Ele; que não dobrem o Evangelho às lógicas humanas e mundanas, mas guardem íntegra a sua mensagem. Guardar a verdade significa ser profeta em todas as situações da vida, isto é, consagrar-se ao Evangelho e tornar-se sua testemunha mesmo quando o preço a pagar seja o de ir contra corrente. Às vezes nós, cristãos, procuramos transigir, mas o Evangelho pede-nos que estejamos na verdade e sejamos pela verdade, dando a vida pelos outros. E ser fiéis ao Evangelho e artesãos de paz onde há guerra, violência, ódio significa comprometer-se, mesmo através das opções sociais e políticas, arriscando a vida. Só assim podem mudar as coisas. O Senhor não precisa de gente tíbia: quer-nos consagrados na verdade e na beleza do Evangelho, para podermos testemunhar a alegria do Reino de Deus mesmo na noite escura da tribulação e quando o mal parece mais forte.

Queridos irmãos e irmãs, hoje quero depor sobre o altar do Senhor os sofrimentos do vosso povo e rezar convosco para que Deus converta os corações de todos à paz. Que a oração de Jesus nos ajude a guardar a fé mesmo nos momentos difíceis, ser construtores de unidade, arriscar a vida pela verdade do Evangelho. Por favor, não percais a esperança! Jesus ainda hoje reza ao Pai: na sua oração, faz ver ao Pai as chagas com que pagou a nossa salvação. Com esta oração, Jesus reza e intercede por todos nós, para que nos guarde do maligno e nos livre do poder do mal.

Papa Francisco

(Roma, 16 de maio de 2021)

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