SEMANA IV DO TEMPO PASCAL- 2022
Virgem Santa Maria do Rosário de Fátima
Sexta-feira IV da Páscoa - 13.05.2022
Evangelho
Lc 11, 27-28
«Mais felizes são os que ouvem a palavra de Deus e a põem em prática»
Jesus, ao responder à mulher, centra os ouvintes no essencial, a palavra
de Deus. O importante não é ser mãe de Jesus, nem ter um filho como ele porque
isso seria limitar as possibilidades da felicidade. O importante é a felicidade
a que todos podem ter acesso. Essa felicidade nasce da Palavra de Deus que se
escuta e se põe em prática. É por isso que Maria é feliz.
"Naquele tempo, enquanto Jesus falava à multidão, uma mulher levantou a voz no
meio da multidão e disse: «Feliz Aquela que Te trouxe no seu ventre e Te
amamentou ao seu peito». Mas Jesus respondeu: «Mais felizes são os que ouvem a
palavra de Deus e a põem em prática»."
(...) Nossa Senhora foi como Mestra
que introduz os pequenos videntes no conhecimento íntimo do Amor Trinitário e
os leva a saborear o próprio Deus como o mais belo da existência humana. Uma
experiência de graça que os tornou enamorados de Deus em Jesus, a ponto da
Jacinta exclamar: «Gosto tanto de dizer a Jesus que O amo. Quando Lho digo
muitas vezes, parece que tenho um lume no peito, mas não me queimo». E o
Francisco dizia: «Do que gostei mais foi de ver a Nosso Senhor, naquela luz que
Nossa Senhora nos meteu no peito. Gosto tanto de Deus!» (Memórias da Irmã
Lúcia, I, 40 e 127).
Irmãos, ao
ouvir estes inocentes e profundos desabafos místicos dos Pastorinhos, poderia
alguém olhar para eles com um pouco de inveja por terem visto ou com a
desiludida resignação de quem não teve essa sorte mas insiste em ver. A tais
pessoas, o Papa diz como Jesus: «Não andareis vós enganadas, ignorando as
Escrituras e o poder de Deus?» (Mc 12, 24). As Escrituras
convidam-nos a crer: «Felizes os que acreditam sem terem visto» (Jo 20,
29), mas Deus – mais íntimo a mim mesmo de quanto o seja eu próprio (cf. Santo
Agostinho, Confissões, III, 6, 11) – tem o poder de chegar até
nós nomeadamente através dos sentidos interiores, de modo que a alma recebe o
toque suave de algo real que está para além do sensível, tornando-a capaz de
alcançar o não-sensível, o não-visível aos sentidos. Para isso exige-se uma
vigilância interior do coração que, na maior parte do tempo, não possuímos por
causa da forte pressão das realidades externas e das imagens e preocupações que
enchem a alma (cf. Card. Joseph Ratzinger, Comentário teológico da Mensagem
de Fátima, ano 2000). Sim! Deus pode alcançar-nos, oferecendo-Se à nossa
visão interior.
Mais ainda,
aquela Luz no íntimo dos Pastorinhos, que provém do futuro de Deus, é a mesma
que se manifestou na plenitude dos tempos e veio para todos: o Filho de Deus
feito homem. Que Ele tem poder para incendiar os corações mais frios e tristes,
vemo-lo nos discípulos de Emaús (cf. Lc 24, 32). Por isso a
nossa esperança tem fundamento real, apoia-se num acontecimento que se coloca
na história e ao mesmo tempo excede-a: é Jesus de Nazaré. E o entusiasmo que a
sua sabedoria e poder salvífico suscitavam nas pessoas de então era tal que uma
mulher do meio da multidão – como ouvimos no Evangelho – exclama: «Feliz Aquela
que Te trouxe no seu ventre e Te amamentou ao seu peito». Contudo Jesus
observou: «Mais felizes são os que ouvem a palavra de Deus e a põem em prática»
(Lc 11, 27. 28). Mas quem tem tempo para escutar a Sua palavra e
deixar-se fascinar pelo Seu amor? Quem vela, na noite da dúvida e da incerteza,
com o coração acordado em oração? Quem espera a aurora do dia novo, tendo acesa
a chama da fé? A fé em Deus abre ao homem o horizonte de uma esperança certa
que não desilude; indica um sólido fundamento sobre o qual apoiar, sem medo, a
própria vida; pede o abandono, cheio de confiança, nas mãos do Amor que
sustenta o mundo.
«A linhagem do
povo de Deus será conhecida […] como linhagem que o Senhor abençoou» (Is 61,
9) com uma esperança inabalável e que frutifica num amor que se sacrifica pelos
outros, mas não sacrifica os outros; antes – como ouvimos na segunda leitura –
«tudo desculpa, tudo acredita, tudo espera, tudo suporta» (1 Cor 13,
7). Exemplo e estímulo são os Pastorinhos, que fizeram da sua vida uma doação a
Deus e uma partilha com os outros por amor de Deus. Nossa Senhora ajudou-os a
abrir o coração à universalidade do amor. De modo particular, Jacinta
mostrava-se incansável na partilha com os pobres e no sacrifício pela conversão
dos pecadores. Só com este amor de fraternidade e partilha construiremos a
civilização do Amor e da Paz.
Iludir-se-ia
quem pensasse que a missão profética de Fátima esteja concluída. Aqui revive
aquele desígnio de Deus que interpela a humanidade desde os seus primórdios:
«Onde está Abel, teu irmão? […] A voz do sangue do teu irmão clama da terra até
Mim» (Gn 4, 9). O homem pôde despoletar um ciclo de morte e terror,
mas não consegue interrompê-lo… Na Sagrada Escritura, é frequente aparecer Deus
à procura de justos para salvar a cidade humana e o mesmo faz aqui, em Fátima,
quando Nossa Senhora pergunta: «Quereis oferecer-vos a Deus para suportar todos
os sofrimentos que Ele quiser enviar-vos, em ato de reparação pelos pecados
com que Ele mesmo é ofendido e de súplica pela conversão dos pecadores?» (Memórias
da Irmã Lúcia, I, 162).
Com a família
humana pronta a sacrificar os seus laços mais sagrados no altar de mesquinhos
egoísmos de nação, raça, ideologia, grupo, indivíduo, veio do Céu a nossa
bendita Mãe oferecendo-Se para transplantar no coração de quantos se Lhe
entregam o Amor de Deus que arde no seu. Então eram só três, cujo exemplo de
vida irradiou e se multiplicou em grupos sem conta por toda a superfície da
terra, nomeadamente à passagem da Virgem Peregrina, que se votaram à causa da
solidariedade fraterna. (...)
Fátima, in homilia de 13 de maio de 2010 Bento XVI
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