QUARESMA PASSO A PASSO - 2025
Domingo IV da Quaresma - 30/03/2025
Evangelho
Lc 15, 1-3.11-32
«Pai, pequei contra o Céu e contra ti. Já não mereço ser chamado teu
filho.»
As leituras deste quarto domingo da quaresma como que nos colocam perante o
exercício da misericórdia de Deus, ontem hoje e sempre. Em Deus experimentamos
o que é Amar assim perdidamente, infinitamente cada um dos Seus filhos e, ao
mesmo tempo, a humanidade inteira. É Ele quem vem ao nosso encontro, quem nos
procura, sempre, sempre, sempre. Ele tem a iniciativa, mas depois deixa-nos
livres para n’Ele nos entregarmos de coração aberto, ou de O rejeitarmos.
Podemos querer, ou não, ser amados por Deus! A opção de dizer sim, ou não, ao
Amor de Deus é da nossa inteira responsabilidade. Ao dizermos sim, entramos na
dinâmica da vivência e da comunicação do Amor de Deus a todos os que se cruzam
nos nossos caminhos, ou aos que vivem connosco diariamente.
Na primeira leitura (Jos 5, 9a.10-12) “vemos” como o povo de Deus
experimenta a misericórdia de Deus e celebra a Páscoa da libertação da
escravidão, no Egito e a sua entrada na Terra Prometida. Também nós Senhor te
damos graças e louvamos pelo teu infinito amor e te pedimos que nos libertes
das nossas escravidões, do nosso pecado, e nos conduzas ao Pai.
“Naqueles dias, disse o Senhor a Josué: «Hoje tirei de vós o opróbrio do
Egipto». Os filhos de Israel acamparam em Gálgala e celebraram a Páscoa, no dia
catorze do mês, à tarde, na planície de Jericó. No dia seguinte à Páscoa,
comeram dos frutos da terra: pães ázimos e espigas assadas nesse mesmo dia.
Quando começaram a comer dos frutos da terra, no dia seguinte à Páscoa, cessou
o maná. Os filhos de Israel não voltaram a ter o maná, mas, naquele ano, já se
alimentaram dos frutos da terra de Canaã.”
Na 2ªleitura (2 Cor 5, 17-21) é S.Paulo quem nos exorta à
reconciliação com Deus e com os irmãos, por e em Jesus Cristo. Deixemos que
Jesus nos habite por inteiro e n’Ele a reconciliação será uma realidade. Só em
Jesus tudo podemos, incluindo perdoar a quem nos faz mal.
“Irmãos: Se alguém está em Cristo, é uma nova criatura. As coisas antigas
passaram; tudo foi renovado. Tudo isto vem de Deus, que por Cristo nos
reconciliou consigo e nos confiou o ministério da reconciliação. Na verdade, é
Deus que em Cristo reconcilia o mundo consigo, não levando em conta as faltas
dos homens e confiando-nos a palavra da reconciliação. Nós somos, portanto,
embaixadores de Cristo; é Deus quem vos exorta por nosso intermédio. Nós vos
pedimos em nome de Cristo: reconciliai-vos com Deus. A Cristo, que não
conhecera o pecado, Deus identificou-O com o pecado por causa de nós, para que
em Cristo nos tornemos justiça de Deus.”
No evangelho (Lc 15, 1-3.11-32) Jesus revela-nos o quanto somos
amados por Deus. O Pai está sempre pronto, de braços abertos, para nos receber,
nunca desiste de nós. Andemos nós por onde andarmos, Ele está sempre à espera
de que voltemos para o seu regaço, onde há lugar para todos, sejamos quantos
formos. O Seu Amor por cada um de nós não acaba nunca, é infinito e sempre a
“jorrar”. Partamos ao Seu encontro e abramos as portas do nosso coração de par
em par, deixando Deus n’ele entrar e tudo preencher. Sendo como o filho mais
novo, ou como o mais velho, ou um pouco como cada um dos dois, nada receemos,
entreguemo-nos a Deus na totalidade do nosso ser e deixemo-nos amar pelo Amor,
que é Ele e só Ele.
“Naquele tempo, os publicanos e os pecadores aproximavam-se todos de Jesus,
para O ouvirem. Mas os fariseus e os escribas murmuravam entre si, dizendo:
«Este homem acolhe os pecadores e come com eles». Jesus disse-lhes então a
seguinte parábola: «Um homem tinha dois filhos. O mais novo disse ao pai: ‘Pai,
dá-me a parte da herança que me toca’. O pai repartiu os bens pelos filhos.
Alguns dias depois, o filho mais novo, juntando todos os seus haveres, partiu
para um país distante e por lá esbanjou quanto possuía, numa vida dissoluta.
Tendo gasto tudo, houve uma grande fome naquela região e ele começou a passar
privações. Entrou então ao serviço de um dos habitantes daquela terra, que o
mandou para os seus campos guardar porcos. Bem desejava ele matar a fome com as
alfarrobas que os porcos comiam, mas ninguém lhas dava. Então, caindo em si,
disse: ‘Quantos trabalhadores de meu pai têm pão em abundância, e eu aqui a
morrer de fome! Vou-me embora, vou ter com meu pai e dizer-lhe: Pai, pequei
contra o Céu e contra ti. Já não mereço ser chamado teu filho, mas trata-me
como um dos teus trabalhadores’. Pôs-se a caminho e foi ter com o pai. Ainda
ele estava longe, quando o pai o viu: encheu-se de compaixão e correu a
lançar-se-lhe ao pescoço, cobrindo-o de beijos. Disse-lhe o filho: ‘Pai, pequei
contra o Céu e contra ti. Já não mereço ser chamado teu filho’. Mas o pai disse
aos servos: ‘Trazei depressa a melhor túnica e vesti-lha. Ponde-lhe um anel no
dedo e sandálias nos pés. Trazei o vitelo gordo e matai-o. Comamos e festejemos,
porque este meu filho estava morto e voltou à vida, estava perdido e foi
reencontrado’. E começou a festa. Ora o filho mais velho estava no campo.
Quando regressou, ao aproximar-se da casa, ouviu a música e as danças. Chamou
um dos servos e perguntou-lhe o que era aquilo. O servo respondeu-lhe: ‘O teu
irmão voltou e teu pai mandou matar o vitelo gordo, porque ele chegou são e
salvo’. Ele ficou ressentido e não queria entrar. Então o pai veio cá fora
instar com ele. Mas ele respondeu ao pai: ‘Há tantos anos que eu te sirvo, sem
nunca transgredir uma ordem tua, e nunca me deste um cabrito para fazer uma
festa com os meus amigos. E agora, quando chegou esse teu filho, que consumiu
os teus bens com mulheres de má vida, mataste-lhe o vitelo gordo’. Disse-lhe o
pai: ‘Filho, tu estás sempre comigo e tudo o que é meu é teu. Mas tínhamos de
fazer uma festa e alegrar-nos, porque este teu irmão estava morto e voltou à
vida, estava perdido e foi reencontrado’».”
Bom
dia, amados irmãos e irmãs!
Hoje
queremos meditar sobre a parábola do Pai misericordioso. Ela fala de um pai e
dos seus dois filhos, e leva-nos a conhecer a misericórdia infinita de Deus.
Comecemos pelo fim, ou seja,
pela alegria do coração do Pai, que diz: «Façamos uma festa. Este meu filho
estava morto e reviveu; estava perdido e foi encontrado» (vv. 23-24). Com estas
palavras o pai interrompeu o filho mais jovem no momento em que confessa a sua
culpa: «Já não sou digno de ser chamado teu filho...» (v. 19). Mas esta
expressão é insuportável para o coração do pai, que ao contrário se apressa a
devolver ao filho os sinais da sua dignidade: a roupa bonita, o anel, o
calçado. Jesus não descreve um pai ofendido e ressentido, um pai que por
exemplo diz ao filho: «Vais pagar»: não, o pai abraça-o, espera por ele com
amor. Ao contrário, a única coisa que o pai quer é que o filho esteja diante
dele, são e salvo, é o que o torna feliz, e por isso faz festa. A receção do
filho que volta é descrita de modo comovedor: «Ainda estava longe, quando o seu
pai o viu e, movido de compaixão, correu ao seu encontro, lançou-se ao seu
pescoço e beijou-o» (v. 20). Quanta ternura; viu-o de longe: o que significa
isto? Que o pai subia continuamente ao terraço para perscrutar a estrada a ver
se o filho voltava; aquele filho que tinha feito de tudo, mas o pai esperava-o.
Como é bonita a ternura do Pai! A misericórdia do pai é transbordante,
incondicional e manifesta-se ainda antes que o filho fale. Sem dúvida, o filho
sabe que errou e reconhece-o: «Pequei... Trata-me como a um dos teus servos»
(v. 19). Mas estas palavras dissolvem-se diante do perdão do pai. O abraço e o
beijo do seu pai levam-no a entender que foi sempre considerado filho, não
obstante tudo. Este ensinamento de Jesus é importante: a nossa condição de
filhos de Deus é fruto do amor do coração do Pai; não depende dos nossos
méritos, nem dos nossos gestos, e portanto ninguém no-la pode tirar, nem sequer
o diabo! Ninguém nos pode privar desta dignidade.
Esta palavra de Jesus anima-nos
a nunca desesperar. Penso nas mães e nos pais em apreensão quando veem os
filhos afastar-se seguindo por caminhos perigosos. Penso nos párocos e
catequistas que às vezes se interrogam se o seu trabalho foi em vão. Mas penso
também em quantos estão na prisão e têm a impressão de que a sua vida acabou;
naqueles que fizeram escolhas erradas e não conseguem olhar para o futuro; em
todos os que têm fome de misericórdia e perdão, e julgam que não o merecem...
Em qualquer situação da vida, não devo esquecer que nunca deixarei de ser filho
de Deus, filho de um Pai que me ama e espera a minha volta. Até na pior
situação da vida, Deus espera-me, Deus quer abraçar-me, Deus aguarda-me.
Na parábola há outro filho, o
mais velho; também ele tem necessidade de descobrir a misericórdia do pai. Ele
permaneceu sempre em casa, mas é muito diverso do pai! As suas palavras carecem
de ternura: «Há muitos anos que te sirvo, sem jamais transgredir ordem
alguma... E agora que voltou este teu filho» (vv. 29-30). Vemos o desprezo:
nunca diz «pai», nunca diz «irmão», só pensa em si mesmo, gaba-se de ter
permanecido sempre ao lado do pai e de o ter servido; e no entanto nunca viveu
esta proximidade com alegria. E agora acusa o pai porque nunca lhe deu um
cabrito para fazer festa. Coitado do pai! Um filho foi embora e o outro nunca
permaneceu realmente próximo dele! O sofrimento do pai é como o do Deus, o de
Jesus quando nos afastamos ou porque vamos embora ou porque estamos perto mas
sem o estar deveras.
Também o filho mais velho
precisa de misericórdia. Inclusive os justos, aqueles que se julgam justos, têm
necessidade de misericórdia. Este filho representa cada um de nós, quando nos
perguntamos se vale a pena labutar tanto, se depois nada recebemos em troca.
Jesus recorda-nos que não permanecemos na casa do Pai para receber uma
recompensa, mas porque temos a dignidade de filhos corresponsáveis. Não se
trata de «negociar» com Deus, mas de seguir Jesus que se entregou
incondicionalmente na cruz.
«Filho, tu estás sempre comigo,
e tudo o que é meu é teu. Convinha, porém, fazer festa...» (vv. 31-32). Assim
diz o Pai ao filho mais velho. A sua lógica é a da misericórdia! O filho mais
jovem pensava que merecia um castigo por causa dos seus pecados, e o filho mais
velho esperava uma recompensa pelos seus serviços. Os dois irmãos não falam
entre si, vivem histórias diferentes, mas ambos raciocinam segundo uma lógica
alheia a Jesus: se fizeres o bem, receberás uma recompensa, se fizerem o mal
serás punido; esta não é a lógica de Jesus, não! Esta lógica é invertida pelas
palavras do pai: «Convinha, porém, fazer festa, pois este teu irmão estava
morto e reviveu; estava perdido e foi encontrado» (v. 31). O pai recuperou o
filho perdido e agora pode inclusive restituí-lo ao seu irmão! Sem o filho mais
jovem, também o filho mais velho deixa de ser um «irmão». A maior alegria para
o pai é ver que os seus filhos se reconheçam irmãos.
Os filhos podem decidir se
querem unir-se à alegria do pai ou rejeitá-la. Devem interrogar-se sobre os
próprios desejos e sobre a sua visão da vida. A parábola termina deixando o
final suspenso: não sabemos o que o filho mais velho decidiu fazer. E isto é um
estímulo para nós. Este Evangelho ensina-nos que todos temos necessidade de
entrar na casa do Pai e participar da sua alegria, na festa da misericórdia e
da fraternidade. Irmãos e irmãs, abramos o nosso coração para sermos
«misericordiosos como o Pai»!
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