sábado, 29 de março de 2025

 QUARESMA PASSO A PASSO - 2025  

Domingo IV da Quaresma - 30/03/2025

Evangelho Lc 15, 1-3.11-32   

«Pai, pequei contra o Céu e contra ti. Já não mereço ser chamado teu filho.»

As leituras deste quarto domingo da quaresma como que nos colocam perante o exercício da misericórdia de Deus, ontem hoje e sempre. Em Deus experimentamos o que é Amar assim perdidamente, infinitamente cada um dos Seus filhos e, ao mesmo tempo, a humanidade inteira. É Ele quem vem ao nosso encontro, quem nos procura, sempre, sempre, sempre. Ele tem a iniciativa, mas depois deixa-nos livres para n’Ele nos entregarmos de coração aberto, ou de O rejeitarmos. Podemos querer, ou não, ser amados por Deus! A opção de dizer sim, ou não, ao Amor de Deus é da nossa inteira responsabilidade. Ao dizermos sim, entramos na dinâmica da vivência e da comunicação do Amor de Deus a todos os que se cruzam nos nossos caminhos, ou aos que vivem connosco diariamente.

Na primeira leitura (Jos 5, 9a.10-12) “vemos” como o povo de Deus experimenta a misericórdia de Deus e celebra a Páscoa da libertação da escravidão, no Egito e a sua entrada na Terra Prometida. Também nós Senhor te damos graças e louvamos pelo teu infinito amor e te pedimos que nos libertes das nossas escravidões, do nosso pecado, e nos conduzas ao Pai.

“Naqueles dias, disse o Senhor a Josué: «Hoje tirei de vós o opróbrio do Egipto». Os filhos de Israel acamparam em Gálgala e celebraram a Páscoa, no dia catorze do mês, à tarde, na planície de Jericó. No dia seguinte à Páscoa, comeram dos frutos da terra: pães ázimos e espigas assadas nesse mesmo dia. Quando começaram a comer dos frutos da terra, no dia seguinte à Páscoa, cessou o maná. Os filhos de Israel não voltaram a ter o maná, mas, naquele ano, já se alimentaram dos frutos da terra de Canaã.” 

Na 2ªleitura (2 Cor 5, 17-21) é S.Paulo quem nos exorta à reconciliação com Deus e com os irmãos, por e em Jesus Cristo. Deixemos que Jesus nos habite por inteiro e n’Ele a reconciliação será uma realidade. Só em Jesus tudo podemos, incluindo perdoar a quem nos faz mal.

“Irmãos: Se alguém está em Cristo, é uma nova criatura. As coisas antigas passaram; tudo foi renovado. Tudo isto vem de Deus, que por Cristo nos reconciliou consigo e nos confiou o ministério da reconciliação. Na verdade, é Deus que em Cristo reconcilia o mundo consigo, não levando em conta as faltas dos homens e confiando-nos a palavra da reconciliação. Nós somos, portanto, embaixadores de Cristo; é Deus quem vos exorta por nosso intermédio. Nós vos pedimos em nome de Cristo: reconciliai-vos com Deus. A Cristo, que não conhecera o pecado, Deus identificou-O com o pecado por causa de nós, para que em Cristo nos tornemos justiça de Deus.”

 

No evangelho (Lc 15, 1-3.11-32) Jesus revela-nos o quanto somos amados por Deus. O Pai está sempre pronto, de braços abertos, para nos receber, nunca desiste de nós. Andemos nós por onde andarmos, Ele está sempre à espera de que voltemos para o seu regaço, onde há lugar para todos, sejamos quantos formos. O Seu Amor por cada um de nós não acaba nunca, é infinito e sempre a “jorrar”. Partamos ao Seu encontro e abramos as portas do nosso coração de par em par, deixando Deus n’ele entrar e tudo preencher. Sendo como o filho mais novo, ou como o mais velho, ou um pouco como cada um dos dois, nada receemos, entreguemo-nos a Deus na totalidade do nosso ser e deixemo-nos amar pelo Amor, que é Ele e só Ele.

“Naquele tempo, os publicanos e os pecadores aproximavam-se todos de Jesus, para O ouvirem. Mas os fariseus e os escribas murmuravam entre si, dizendo: «Este homem acolhe os pecadores e come com eles». Jesus disse-lhes então a seguinte parábola: «Um homem tinha dois filhos. O mais novo disse ao pai: ‘Pai, dá-me a parte da herança que me toca’. O pai repartiu os bens pelos filhos. Alguns dias depois, o filho mais novo, juntando todos os seus haveres, partiu para um país distante e por lá esbanjou quanto possuía, numa vida dissoluta. Tendo gasto tudo, houve uma grande fome naquela região e ele começou a passar privações. Entrou então ao serviço de um dos habitantes daquela terra, que o mandou para os seus campos guardar porcos. Bem desejava ele matar a fome com as alfarrobas que os porcos comiam, mas ninguém lhas dava. Então, caindo em si, disse: ‘Quantos trabalhadores de meu pai têm pão em abundância, e eu aqui a morrer de fome! Vou-me embora, vou ter com meu pai e dizer-lhe: Pai, pequei contra o Céu e contra ti. Já não mereço ser chamado teu filho, mas trata-me como um dos teus trabalhadores’. Pôs-se a caminho e foi ter com o pai. Ainda ele estava longe, quando o pai o viu: encheu-se de compaixão e correu a lançar-se-lhe ao pescoço, cobrindo-o de beijos. Disse-lhe o filho: ‘Pai, pequei contra o Céu e contra ti. Já não mereço ser chamado teu filho’. Mas o pai disse aos servos: ‘Trazei depressa a melhor túnica e vesti-lha. Ponde-lhe um anel no dedo e sandálias nos pés. Trazei o vitelo gordo e matai-o. Comamos e festejemos, porque este meu filho estava morto e voltou à vida, estava perdido e foi reencontrado’. E começou a festa. Ora o filho mais velho estava no campo. Quando regressou, ao aproximar-se da casa, ouviu a música e as danças. Chamou um dos servos e perguntou-lhe o que era aquilo. O servo respondeu-lhe: ‘O teu irmão voltou e teu pai mandou matar o vitelo gordo, porque ele chegou são e salvo’. Ele ficou ressentido e não queria entrar. Então o pai veio cá fora instar com ele. Mas ele respondeu ao pai: ‘Há tantos anos que eu te sirvo, sem nunca transgredir uma ordem tua, e nunca me deste um cabrito para fazer uma festa com os meus amigos. E agora, quando chegou esse teu filho, que consumiu os teus bens com mulheres de má vida, mataste-lhe o vitelo gordo’. Disse-lhe o pai: ‘Filho, tu estás sempre comigo e tudo o que é meu é teu. Mas tínhamos de fazer uma festa e alegrar-nos, porque este teu irmão estava morto e voltou à vida, estava perdido e foi reencontrado’».” 

Bom dia, amados irmãos e irmãs!

Hoje queremos meditar sobre a parábola do Pai misericordioso. Ela fala de um pai e dos seus dois filhos, e leva-nos a conhecer a misericórdia infinita de Deus.

Comecemos pelo fim, ou seja, pela alegria do coração do Pai, que diz: «Façamos uma festa. Este meu filho estava morto e reviveu; estava perdido e foi encontrado» (vv. 23-24). Com estas palavras o pai interrompeu o filho mais jovem no momento em que confessa a sua culpa: «Já não sou digno de ser chamado teu filho...» (v. 19). Mas esta expressão é insuportável para o coração do pai, que ao contrário se apressa a devolver ao filho os sinais da sua dignidade: a roupa bonita, o anel, o calçado. Jesus não descreve um pai ofendido e ressentido, um pai que por exemplo diz ao filho: «Vais pagar»: não, o pai abraça-o, espera por ele com amor. Ao contrário, a única coisa que o pai quer é que o filho esteja diante dele, são e salvo, é o que o torna feliz, e por isso faz festa. A receção do filho que volta é descrita de modo comovedor: «Ainda estava longe, quando o seu pai o viu e, movido de compaixão, correu ao seu encontro, lançou-se ao seu pescoço e beijou-o» (v. 20). Quanta ternura; viu-o de longe: o que significa isto? Que o pai subia continuamente ao terraço para perscrutar a estrada a ver se o filho voltava; aquele filho que tinha feito de tudo, mas o pai esperava-o. Como é bonita a ternura do Pai! A misericórdia do pai é transbordante, incondicional e manifesta-se ainda antes que o filho fale. Sem dúvida, o filho sabe que errou e reconhece-o: «Pequei... Trata-me como a um dos teus servos» (v. 19). Mas estas palavras dissolvem-se diante do perdão do pai. O abraço e o beijo do seu pai levam-no a entender que foi sempre considerado filho, não obstante tudo. Este ensinamento de Jesus é importante: a nossa condição de filhos de Deus é fruto do amor do coração do Pai; não depende dos nossos méritos, nem dos nossos gestos, e portanto ninguém no-la pode tirar, nem sequer o diabo! Ninguém nos pode privar desta dignidade.

Esta palavra de Jesus anima-nos a nunca desesperar. Penso nas mães e nos pais em apreensão quando veem os filhos afastar-se seguindo por caminhos perigosos. Penso nos párocos e catequistas que às vezes se interrogam se o seu trabalho foi em vão. Mas penso também em quantos estão na prisão e têm a impressão de que a sua vida acabou; naqueles que fizeram escolhas erradas e não conseguem olhar para o futuro; em todos os que têm fome de misericórdia e perdão, e julgam que não o merecem... Em qualquer situação da vida, não devo esquecer que nunca deixarei de ser filho de Deus, filho de um Pai que me ama e espera a minha volta. Até na pior situação da vida, Deus espera-me, Deus quer abraçar-me, Deus aguarda-me.

Na parábola há outro filho, o mais velho; também ele tem necessidade de descobrir a misericórdia do pai. Ele permaneceu sempre em casa, mas é muito diverso do pai! As suas palavras carecem de ternura: «Há muitos anos que te sirvo, sem jamais transgredir ordem alguma... E agora que voltou este teu filho» (vv. 29-30). Vemos o desprezo: nunca diz «pai», nunca diz «irmão», só pensa em si mesmo, gaba-se de ter permanecido sempre ao lado do pai e de o ter servido; e no entanto nunca viveu esta proximidade com alegria. E agora acusa o pai porque nunca lhe deu um cabrito para fazer festa. Coitado do pai! Um filho foi embora e o outro nunca permaneceu realmente próximo dele! O sofrimento do pai é como o do Deus, o de Jesus quando nos afastamos ou porque vamos embora ou porque estamos perto mas sem o estar deveras.

Também o filho mais velho precisa de misericórdia. Inclusive os justos, aqueles que se julgam justos, têm necessidade de misericórdia. Este filho representa cada um de nós, quando nos perguntamos se vale a pena labutar tanto, se depois nada recebemos em troca. Jesus recorda-nos que não permanecemos na casa do Pai para receber uma recompensa, mas porque temos a dignidade de filhos corresponsáveis. Não se trata de «negociar» com Deus, mas de seguir Jesus que se entregou incondicionalmente na cruz.

«Filho, tu estás sempre comigo, e tudo o que é meu é teu. Convinha, porém, fazer festa...» (vv. 31-32). Assim diz o Pai ao filho mais velho. A sua lógica é a da misericórdia! O filho mais jovem pensava que merecia um castigo por causa dos seus pecados, e o filho mais velho esperava uma recompensa pelos seus serviços. Os dois irmãos não falam entre si, vivem histórias diferentes, mas ambos raciocinam segundo uma lógica alheia a Jesus: se fizeres o bem, receberás uma recompensa, se fizerem o mal serás punido; esta não é a lógica de Jesus, não! Esta lógica é invertida pelas palavras do pai: «Convinha, porém, fazer festa, pois este teu irmão estava morto e reviveu; estava perdido e foi encontrado» (v. 31). O pai recuperou o filho perdido e agora pode inclusive restituí-lo ao seu irmão! Sem o filho mais jovem, também o filho mais velho deixa de ser um «irmão». A maior alegria para o pai é ver que os seus filhos se reconheçam irmãos.

Os filhos podem decidir se querem unir-se à alegria do pai ou rejeitá-la. Devem interrogar-se sobre os próprios desejos e sobre a sua visão da vida. A parábola termina deixando o final suspenso: não sabemos o que o filho mais velho decidiu fazer. E isto é um estímulo para nós. Este Evangelho ensina-nos que todos temos necessidade de entrar na casa do Pai e participar da sua alegria, na festa da misericórdia e da fraternidade. Irmãos e irmãs, abramos o nosso coração para sermos «misericordiosos como o Pai»!

Papa Francisco 
(Audiência Geral11 de maio de 2016)

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