Ano A - 2022
Advento passo
a passo
Semana 4
28º dia – Sábado - 24/12/2022
Lc 1, 67-79
Hoje o evangelho traz-nos o Benedictus, o
Cântico entoado pelo pai de João Baptista, Zacarias, quando o nascimento
daquele filho tinha mudado a sua vida, afastando a dúvida que o tinha tornado
mudo, uma significativa punição pela sua falta de fé e de louvor.
Mas agora, Zacarias pode celebrar Deus que salva e
fá-lo com este hino, narrado pelo evangelista Lucas de uma forma que, sem
dúvida, reflete o uso litúrgico no âmbito das primeiras comunidades cristãs
(cf. Lc 1, 68-79).
O mesmo evangelista define-o como um cântico profético, que se abre através do sopro do Espírito Santo (cf. 1, 67). De facto, encontramo-nos diante de uma bênção que proclama as ações salvíficas e a libertação oferecida pelo Senhor ao seu povo. Por conseguinte, a leitura "profética" da história, isto é, a descoberta do sentido íntimo e profundo de toda a vicissitude humana, orientada pela mão escondida mas laboriosa do Senhor, que se entrelaça com a mais frágil e incerta do homem.
Papa João Paulo II
(Audiência Geral,1 de outubro de 2003)
“Naquele
tempo, Zacarias, pai de João Baptista, ficou cheio do Espírito Santo e
profetizou dizendo: «Bendito seja o Senhor, Deus de Israel, que visitou e
redimiu o seu povo e nos deu um salvador poderoso na casa de David, seu servo.
Assim prometera desde os tempos antigos, pela boca dos seus santos Profetas,
que nos libertaria dos nossos inimigos e das mãos de todos os que nos odeiam;
que teria compaixão dos nossos pais, recordando a sua sagrada aliança e o
juramento que fizera a Abraão, nosso pai: que nos concederia a graça de O
servirmos um dia sem temor, livres das mãos dos nossos inimigos, em santidade e
justiça, na sua presença, todos os dias da nossa vida. E tu, menino, serás
chamado profeta do Altíssimo, porque irás à sua frente a preparar os seus
caminhos, para dar a conhecer ao seu povo a salvação, pela remissão dos pecados;
graças ao coração misericordioso do nosso Deus, que das alturas nos visita como
sol nascente, para iluminar os que vivem nas trevas e na sombra da morte e
dirigir os nossos passos no caminho da paz».”
O texto é solene e, no original grego, compõe-se
unicamente por duas frases (cf. vv. 68-75; 76-79). Depois da introdução, marcada
pela bênção de louvor, podemos identificar no corpo do Cântico quase três
estrofes, que exaltam igual número de temas, destinados a marcar toda a
história da salvação: a aliança davídica (cf. vv. 68-71), a aliança
abraâmica (cf. vv. 72-75), e o Baptista que nos introduz na
nova aliança em Cristo (cf. vv. 76-79).
De facto, toda a oração tende para
aquela meta que David e Abraão indicam
com a sua presença.
O vértice encontra-se precisamente numa frase quase
conclusiva: "Visitar-nos-á a luz do alto" (cf. v. 78). A
expressão, à primeira vista paradoxal com o facto de unir "o alto" e
o "surgir", na realidade é significativa.
Com efeito, no original grego o "sol que
surge" é anatolè, uma palavra que em si significa tanto a
luz solar que brilha no nosso planeta, como o rebento que nasce. As duas
imagens na tradição bíblica têm um valor messiânico.
Por um lado, Isaías recorda-nos, falando do Emanuel,
que "o povo que andava nas trevas viu uma grande luz; habitavam numa terra
de sombras, mas uma luz brilhou" (9, 1). Por outro lado, referindo-se
ainda ao rei Emanuel, representa-o como "um rebento que brotou do tronco
de Jessé", isto é, da dinastia davídica, um rebento envolvido pelo
Espírito de Deus (cf. Is 11, 1-2).
Por conseguinte, com Cristo surge a luz que ilumina todas
as criaturas (cf. Jo 1, 9) e floresce
a vida, como dirá o evangelista João
unindo precisamente estas duas realidades:
"N'Ele estava a Vida e a Vida
era a luz dos homens" (1, 4).
A humanidade que está envolvida "nas trevas e na
sombra da morte" é iluminada por este esplendor de revelação (cf. Lc 1,
79). Como anunciara o profeta Malaquias, "para vós que temeis o Meu nome
brilhará o sol de justiça" (3, 20). Este sol "guiará os nossos passos
no caminho da paz" (Lc 1, 79).
Movamo-nos então, tendo como ponto de referência
aquela luz; e os nossos passos incertos, que durante o dia muitas vezes se
desviam por caminhos obscuros e perigosos, são amparados pela luz da verdade
que Cristo difunde no mundo e na história.
A este ponto, queremos citar as palavras de um mestre
da Igreja, um dos seus Doutores, o britânico Beda, o Venerável ( séc. VII-VIII
) que na sua Homilia para o nascimento de São João Baptista, comentava
assim o Cântico de Zacarias: "O Senhor...
visitou-nos como um médico visita os doentes, porque para curar a enfermidade
arreigada da nossa soberba, ofereceu-nos o novo exemplo da sua humildade;
redimiu o seu povo, porque nos libertou com o preço do nosso sangue a nós que
nos tínhamos tornado servos do pecado e escravos do antigo inimigo... Cristo
encontrou-nos quando jazíamos "nas trevas e na sombra da morte", ou
seja, oprimidos pela longa cegueira do pecado e da ignorância... Trouxe-nos a
luz verdadeira do seu conhecimento e, afastou as trevas do erro, mostrou-nos o
caminho seguro para a pátria celeste. Dirigiu os passos das nossas obras para
fazer com que andássemos pelo caminho da verdade, que nos mostrou, e para nos
fazer entrar na casa da paz eterna, que nos prometeu".
Por fim, inspirando-se noutros textos bíblicos, o
Venerável Beda concluía da seguinte forma, dando graças pelos dons
recebidos: "Dado que possuímos estes dons da bondade eterna, irmãos
caríssimos..., bendizemos também nós o Senhor em todos os tempos (cf. Sl 33,
2), porque "visitou e redimiu o seu povo". Esteja sempre nos nossos
lábios o seu louvor, conservemos a sua recordação e, por nosso lado,
proclamamos a virtude daquele que "nos chamou das trevas para a Sua luz
admirável" (1 Pd 2, 9). Pedimos continuamente a sua ajuda,
para que conserve em nós a luz do conhecimento que nos trouxe, e nos conduza
até ao dia da perfeição" (Homilias sobre o Evangelho, Roma
1990, págs. 464-465).
Papa João Paulo II
(Audiência Geral,1 de outubro de 2003)
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