QUARESMA PASSO A PASSO - 2025
SEMANA SANTA
Quarta-feira da Semana Santa – dia 37 - 16/04/2025
Evangelho Mt 26, 14-25
"Enquanto comiam, declarou: «Em verdade, em verdade vos digo: Um de vós Me entregará»."
Jesus sente que a Sua «hora» se aproxima. Por isso, ordena que a celebração da Páscoa seja devidamente preparada. Deseja ardentemente comê-la com os discípulos pois, nela, o antigo memorial dará lugar ao novo, deixando-nos o Seu Corpo e o Seu Sangue como alimento e bebida. A entrega de Si mesmo acontece num ambiente toldado pelo anúncio da entrega-traição. Os discípulos mergulham num clima de insegurança e de desconfiança. Fazem perguntas a Jesus, chamando «Senhor» (Kyrios), enquanto Judas o chama simplesmente «Mestre. (Rabi). Mas Jesus é, de facto, Senhor. Por isso, conhece o traidor e reconhece que nele se cumprem as Escrituras. A insegurança dos discípulos representa a nossa própria insegurança perante a possibilidade de também nós virmos a atraiçoar e a negar Jesus.
"Naquele tempo, um dos Doze, chamado Iscariotes, foi ter com os
príncipes dos sacerdotes e disse-lhes: «Que estais dispostos a dar-me para vos
entregar Jesus?» Eles garantiram-lhe trinta moedas de prata. A partir de então,
Judas procurava uma oportunidade para O entregar. No primeiro dia dos Ázimos,
os discípulos foram ter com Jesus e perguntaram-Lhe: «Onde queres que façamos
os preparativos para comer a Páscoa?» Ele respondeu: «Ide à cidade, a casa de
tal pessoa, e dizei-lhe: ‘O Mestre manda dizer: O meu tempo está próximo. É em
tua casa que Eu quero celebrar a Páscoa com os meus discípulos’». Os discípulos
fizeram como Jesus lhes tinha mandado e prepararam a Páscoa. Ao cair da tarde,
sentou-Se à mesa com os Doze. Enquanto comiam, declarou: «Em verdade, em
verdade vos digo: Um de vós Me entregará». Profundamente entristecidos, começou
cada um a perguntar-Lhe: «Serei eu, Senhor?» Jesus respondeu: «Aquele que meteu
comigo a mão no prato é que vai entregar-Me. O Filho do homem vai partir, como
está escrito acerca d’Ele. Mas ai daquele por quem o Filho do homem vai ser
entregue! Melhor seria para esse homem não ter nascido». Judas, que O ia
entregar, tomou a palavra e perguntou: «Serei eu, Mestre?» Respondeu Jesus: «Tu
o disseste»."
A Paixão de Jesus não foi um acontecimento imprevisto.
Tudo fora profeticamente anunciado, até o preço da traição. A referência à
profecia de Zacarias leva-nos a ver Jesus como o rei manso e humilde de que
fala o mesmo profeta . Mas é sobretudo Isaías que profeticamente anuncia, com
pormenores impressionantes, todo o drama de Jesus. A primeira leitura
apresenta-nos, mais uma vez, o misterioso Servo de Javé, atormentado e
humilhado, mas cheio de paciência, e de obediente e confiante abandono em Deus.
É uma clara figura de Jesus na sua Paixão, onde se revelará a majestade de
Deus-Pai.
No evangelho encontramos, de um lado, Judas que
atraiçoa o Mestre e, do outro lado, Jesus que dá orientações para a ceia
pascal. Como mandavam os ritos, Jesus devia explicar o significado dessa
refeição singular e solene. Fê-lo dando-lhe um sentido novo, em que se destacam
dois elementos importantes: Jesus torna os Seus discípulos participantes da Sua
dignidade e do Seu destino; o Seu sangue será derramado para remissão dos
pecados.
Entre a preparação e a celebração da ceia, é
descoberto o traidor. Judas entrega Jesus, e Jesus entrega-Se a Si mesmo. A
traição torna-se ocasião para o dom voluntário e total de Jesus. A Sua morte
torna-se fonte de vida. O seu Coração vence a morte e transforma-a em vida para
o mundo.
A Páscoa estava desde sempre preparada em Deus. Mas,
quando o Filho do homem veio realizá-la no meio de nós, abriu-se para todo o
homem um horizonte novo de ilimitada liberdade, a liberdade de amar dando a
própria vida, para se reencontrar em plenitude no seio amante da Trindade.
Senhor Jesus Cristo, queremos, hoje, confessar-nos diante de Ti. Para isso,
pedimos-Te um coração arrependido, e palavras humildes e sinceras. Também nós
Te vendemos, mais do que uma vez. Todos os dias especulamos sobre a Tua pessoa,
e vivemos desse miserável lucro. Nós, que Tu amas! Como podes suportar-nos
ainda na Tua casa, a comer o pão das Tuas lágrimas e a beber o sangue do Teu
sofrimento? Vendido por nós, por quase nada, compraste-nos com o preço infinito
do Teu sangue. Que, através da ferida do Teu Coração, possamos ser introduzidos
e estabelecidos para sempre na comunhão do Teu amor. Ámen.
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A quarta-feira Santa é também chamada "Quarta-feira da traição", o dia em que a Igreja enfatiza a traição de Judas. Judas vende o Mestre.
Quando pensamos na venda de
pessoas, vem-nos à mente o comércio feito com os escravos da África para os
levar para a América - uma coisa antiga -, depois o comércio, por exemplo, das
jovens yazidis vendidas em Daesh: mas é algo distante, é uma situação... Ainda
hoje as pessoas são vendidas. Todos os dias. Há Judas que vendem os seus irmãos
e irmãs, explorando-os no trabalho, não pagando o salário justo, não
reconhecendo os próprios deveres... Aliás, muitas vezes eles vendem as coisas
mais queridas. Penso que, para se sentir mais confortável, um homem é capaz de
afastar os seus pais e não voltar a vê-los, colocando-os numa casa de repouso
sem os ir visitar... vende. Há um ditado muito conhecido que, falando de
pessoas assim, diz que “este é capaz de vender a mãe”: e eles vendem-na. Agora
estão tranquilos, estão longe: “Ocupai-vos vós deles...”.
Hoje o comércio humano é como
nos primórdios: faz-se. Porquê? Por que: Jesus disse-o. Ele atribuiu ao
dinheiro um senhorio. Jesus disse: «Não podeis servir a Deus e ao dinheiro»
(cf. Lc 16, 13), a dois senhores. É a única coisa que Jesus
coloca no auge e cada um de nós deve escolher: ou serves a Deus e serás livre
na adoração e no serviço; ou serves ao dinheiro e serás escravo do dinheiro.
Esta é a opção; e muitas pessoas querem servir a Deus e ao dinheiro. E isto não
pode ser feito. No final, fingem servir a Deus para servir o dinheiro. Trata-se
de exploradores ocultos que são socialmente impecáveis, mas debaixo da mesa
negoceiam, até as pessoas: não importa. A exploração humana consiste na venda do
próximo.
Judas foi-se, mas deixou
discípulos, que não são seus discípulos, mas do diabo. Não sabemos como foi a
vida de Judas. Um jovem normal, talvez, e até com inquietações, pois o Senhor o
chamou para ser discípulo. Ele nunca conseguiu ser um discípulo: não tinha boca
de discípulo nem coração de discípulo, como lemos na primeira leitura. Era
débil no discipulado, mas Jesus amava-o... Depois o Evangelho faz-nos
compreender que ele gostava de dinheiro: na casa de Lázaro, quando Maria ungiu
os pés de Jesus com aquele perfume caro, ele fez a reflexão e João sublinhou:
«Dizia isso não porque ele se interessasse pelos pobres, mas porque era ladrão»
(cf. Jo 12, 6). O amor ao dinheiro tinha-o afastado das
regras: roubar, e de roubar a trair o passo é breve. Quem gosta demasiado de
dinheiro trai para ter mais, sempre: é uma regra, é um facto. O jovem Judas,
talvez bondoso, com boas intenções, acaba por ser um traidor ao ponto de ir ao
mercado para vender: «Foi ter com os príncipes dos sacerdotes e disse: “que me
quereis dar, eu vo-lo entregarei?”» (cf. Mt 26, 14). Na minha
opinião, este homem estava fora de si.
Um aspeto que me chama a
atenção é que Jesus nunca o chama “traidor”; diz que será traído, mas não o
chama “traidor”. Nunca diz: “Vai-te embora, traidor”. Nunca! Na verdade
chama-lhe “Amigo” e beija-o. O mistério de Judas: … como é o mistério de Judas?
Não sei... o sacerdote Primo Mazzolari explicou-o melhor do que eu... Sim,
conforta-me contemplar aquele capitel de Vézelay: que fim levou Judas? Não sei.
Jesus ameaça vigorosamente, aqui; ele ameaça com veemência: «ai daquele homem
por quem o Filho do homem é traído! Bom seria para esse homem se não houvera
nascido!» (Cf. Mt. 26, 24). Mas isto significa que Judas está
no Inferno? Não sei. Eu olho para o capitel. E ouço a palavra de Jesus:
“Amigo”.
Mas isto faz-nos pensar noutra
coisa, que é mais real, mais do que hoje: o diabo entrou em Judas, foi o diabo
que o levou até este ponto. E como terminou a história? O diabo é um mau
pagador, não é um pagador de confiança. Ele promete tudo, mostra tudo e no
final deixa-te sozinho no teu desespero de enforcado.
O coração de Judas, inquieto,
atormentado pela ganância e angustiado pelo amor a Jesus, - um amor que não
conseguiu tornar-se amor, - mortificado com este nevoeiro, procura os
sacerdotes para lhes pedir perdão e salvação. «Que nos importa? Isso é contigo»
(cf. Mt 27, 4): o diabo fala assim e deixa-nos no desespero.
Pensemos nos muitos Judas institucionalizados neste mundo, que exploram as pessoas. E pensemos também no pequeno Judas que cada um de nós tem dentro de si na hora de escolher: entre lealdade ou interesse. Cada um de nós tem a capacidade de trair, de vender, de escolher pelo próprio interesse. Cada um de nós tem a possibilidade de se deixar atrair pelo amor ao dinheiro, aos bens ou pelo bem-estar futuro. “Judas, onde estás?” Mas faço esta pergunta a cada um de nós: “Tu, Judas, o pequeno Judas dentro de mim: onde estás?”.
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