Missa
da Noite de Natal
Uma
luz brilha em Belém
Descem
anjos do céu, ouvem-se cânticos dando glória. Vêm pastores em busca da luz e
com eles os humildes da terra. Dissipam-se as trevas na região da noite e surge
um novo dia. Levantam-se os homens humilhados, caídos, esquecidos, abandonados.
Deus vem ao nosso encontro envolvido nuns panos e deitado numa manjedoura.
Na 1ª leitura (Is 9, 2-27) o profeta Isaías ajuda-nos a ter mais presente que é Deus quem faz brilhar a luz nas trevas e aumentar a alegria nos que ali habitam. Esta luz, diz o profeta, é como a de Madian quando Gedeão pôs em fuga os inimigos. E a alegria é como aquela se vive depois de uma vitória no campo de batalha. Termina a guerra, termina a opressão e recomeça a vida, um menino nasceu.
O
povo que andava nas trevas viu uma grande luz; para aqueles que habitavam nas
sombras da morte uma luz começou a brilhar. Multiplicastes a sua alegria,
aumentastes o seu contentamento. Rejubilam na vossa presença, como os que se
alegram no tempo da colheita, como exultam os que repartem despojos. Vós
quebrastes, como no dia de Madiã, o jugo que pesava sobre o povo, o madeiro que
ele tinha sobre os ombros e o bastão do opressor. Todo o calçado ruidoso da
guerra e toda a veste manchada de sangue serão lançados ao fogo e tornar-se-ão
pasto das chamas. Porque um menino nasceu para nós, um filho nos foi dado. Tem
o poder sobre os ombros e será chamado «Conselheiro admirável, Deus forte, Pai
eterno, Príncipe da paz». O seu poder será engrandecido numa paz sem fim, sobre
o trono de David e sobre o seu reino, para o estabelecer e consolidar por meio
do direito e da justiça, agora e para sempre. Assim o fará o Senhor do
Universo.
Na 2ªleitura (Tito 2, 11-14) Paulo fala a Tito sobre a encarnação de Jesus, a grande manifestação de Deus em favor do seu povo, através da qual faz todos os homens participantes da sua bem-aventurança. De facto, em Cristo Deus manifesta toda a Sua glória, desde a Sua encarnação até ao mistério da Cruz onde somos purificados.
Caríssimo:
Manifestou-se a graça de Deus, fonte de salvação para todos os homens. Ela nos
ensina a renunciar à impiedade e aos desejos mundanos, para vivermos, no tempo
presente, com temperança, justiça e piedade, aguardando a ditosa esperança e a
manifestação da glória do nosso grande Deus e Salvador, Jesus Cristo, que Se
entregou por nós, para nos resgatar de toda a iniquidade e preparar para Si
mesmo um povo purificado, zeloso das boas obras.
No evangelho (Lc 2, 1-14) S.Lucas projeta-nos para junto dos pastores, naquela noite santa, a fim de também nós podermos ouvir os anjos do céu, que vêm anunciar que o Salvador já nasceu. Contam que é um menino envolto em panos e deitado numa manjedoura. Lucas convida-nos a reconhecer também hoje a presença de Jesus salvador no meio de nós.
Naqueles
dias, saiu um decreto de César Augusto, para ser recenseada toda a terra. Este
primeiro recenseamento efetuou-se quando Quirino era governador da Síria. Todos
se foram recensear, cada um à sua cidade. José subiu também da Galileia, da
cidade de Nazaré, à Judeia, à cidade de David, chamada Belém, por ser da casa e
da descendência de David, a fim de se recensear com Maria, sua esposa, que
estava para ser mãe. Enquanto ali se encontravam, chegou o dia de ela dar à luz
e teve o seu Filho primogénito. Envolveu-O em panos e deitou-O numa manjedoura,
porque não havia lugar para eles na hospedaria. Havia naquela região uns
pastores que viviam nos campos e guardavam de noite os rebanhos. O Anjo do
Senhor aproximou-se deles e a glória do Senhor cercou-os de luz; e eles tiveram
grande medo. Disse-lhes o Anjo: «Não temais, porque vos anuncio uma grande
alegria para todo o povo: nasceu-vos hoje, na cidade de David, um Salvador, que
é Cristo Senhor. Isto vos servirá de sinal: encontrareis um Menino recém-nascido,
envolto em panos e deitado numa manjedoura». Imediatamente juntou-se ao Anjo
uma multidão do exército celeste, que louvava a Deus, dizendo: «Glória a Deus
nas alturas e paz na terra aos homens por Ele amados».
O
nascimento de Jesus é o início do cumprimento de todas as promessas feitas pelo
Senhor através dos profetas. Nem sempre as promessas se realizam como os homens
imaginam. O mais habitual é Deus ultrapassar a imaginação humana e chegar a
realizar prodígios maiores do que poderemos alguma vez imaginar. (...)
A
notícia do nascimento de Jesus é a manifestação da graça de Deus que nos abre
aos mais nobres sentimentos de paz, de justiça e de piedade. Como para os
pastores a notícia é para nós oportunidade de encontro com Deus, porque em
Jesus o céu desce à terra. Fazendo-se homem no menino envolto em panos, Deus
assume a humanidade elevando-a à condição divina. Esta graça enche-nos de
alegria porque se trata da salvação gratuita e dada a todos sem exceção.
Receber
a notícia transforma-nos em mensageiros. O leitor do evangelho de Lucas,
aprende com os pastores a escutar a palavra que vem do céu, a encher-se de
alegria e a procurar o encontro com aquele que é o centro do evangelho, Jesus
Cristo. E decide-se a ir comunicar a todos, com alegria e gratidão, louvando a
Deus, a alegre notícia que mudou as suas vidas.
Nesta
noite de Natal compreendemos que Deus se revela àqueles que não dão garantias
de credibilidade, como os habitantes da região de Zabulão e Neftali, como os
pobres de Belém que enchem a hospedaria, como os pastores daquele tempo.
A
notícia do nascimento de Jesus, que interessa a todos os homens, interessa
primeiramente aos que andam nas trevas, nas sombras da morte, aos humilhados,
que vivem nas periferias das grandes cidades e à margem das oportunidades que
garantem uma vida estável. Que hoje, ao sair, sejamos conduzidos com alegria ao
encontro daqueles que se julgam indignos de receber o salvador e não acreditam
que Jesus veio precisamente para eles.
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Queridos
irmãos e irmãs, feliz Natal!
O olhar e o coração dos
cristãos de todo o mundo estão voltados para Belém; lá, onde nestes dias reinam
a dor e o silêncio, ressoou o anúncio esperado há séculos: «Nasceu-vos um
Salvador, que é o Messias Senhor» (Lc 2, 11). Trata-se das palavras
do anjo no céu de Belém, que são dirigidas também a nós. Enche-nos de confiança
e esperança saber que o Senhor nasceu para nós; que a Palavra eterna do Pai, o
Deus infinito, fixou a sua morada entre nós. Fez-Se carne, veio «habitar
connosco» (Jo 1, 14): esta é a notícia que muda o curso da
história!
O anúncio de Belém é o anúncio
duma «grande alegria» (Lc 2, 10). Que espécie de alegria? Não a felicidade
passageira do mundo, nem a alegria da diversão, mas uma alegria «grande» porque
nos faz «grandes». De facto hoje nós, seres humanos, com as nossas limitações,
abraçamos a certeza duma esperança inaudita: a esperança de termos nascido para
o Céu. Sim, Jesus nosso irmão veio fazer do Seu Pai o nosso Pai: Menino frágil,
revela-nos a ternura de Deus e muito mais… Ele, o Unigénito do Pai, dá aos
homens o «poder de se tornarem filhos de Deus» (Jo 1, 12). Eis a
alegria que consola o coração, renova a esperança e dá a paz: é a alegria do
Espírito Santo, a alegria de ser filhos amados.
Irmãos e irmãs, hoje em Belém,
por entre as trevas da terra, acendeu-se esta chama inextinguível; hoje, sobre
as trevas do mundo, prevalece a luz de Deus, que «a todo o homem ilumina» (Jo 1,
9). Irmãos e irmãs, alegremo-nos por esta graça! Alegra-te, tu que te vês falho
de confiança e de certezas, porque não estás sozinho, não estás sozinha: Cristo
nasceu para ti! Alegra-te, tu que perdeste a esperança, porque Deus te estende
a mão: não aponta o dedo contra ti, mas oferece-te a sua mãozinha de Menino
para te libertar dos medos, aliviar-te das canseiras e mostrar-te que, aos
olhos d’Ele, vales mais do que qualquer outra coisa. Alegra-te, tu que tens a
paz no coração, porque se cumpriu para ti a antiga profecia de Isaías: «Um
menino nasceu para nós, um filho nos foi dado (…) e o seu nome é: (…) Príncipe
da paz» (9, 5). A Sagrada Escritura revela que a sua paz, o seu reino «não terá
fim» (9, 6).
Na Bíblia, ao Príncipe da paz
opõe-se o «príncipe deste mundo» (Jo 12, 31), que, semeando a
morte, atua contra o Senhor, «amante da vida» (Sab 11, 26). Vemo-lo
atuar em Belém, quando, depois do nascimento do Salvador, se verifica a matança
dos inocentes. Quantas matanças de inocentes no mundo! No ventre materno, nas
rotas dos desesperados à procura de esperança, nas vidas de muitas crianças
cuja infância é devastada pela guerra. São os pequeninos Jesus de hoje, estas
crianças cuja infância é devastada pela guerra, pelas guerras.
Deste modo dizer «sim» ao
Príncipe da paz significa dizer «não» à guerra. E isto com coragem: dizer «não»
à guerra, a toda a guerra, à própria lógica da guerra, que é viagem sem
destino, derrota sem vencedores, loucura indesculpável. Isto é a guerra: viagem
sem destino, derrota sem vencedores, loucura indesculpável. Mas, para dizer
«não» à guerra, é preciso dizer «não» às armas. Com efeito, se o homem, cujo
coração é instável e está ferido, encontrar instrumentos de morte nas mãos,
mais cedo ou mais tarde usá-los-á. E como se pode falar de paz, se cresce a
produção, a venda e o comércio das armas? Hoje, como no tempo de Herodes, as
conspirações do mal, que se opõem à luz divina, movem-se à sombra da hipocrisia
e do escondimento. Quantos massacres armados acontecem num silêncio
ensurdecedor, ignorados de tantos! O povo, que não quer armas mas pão, que tem
dificuldade em acudir às despesas quotidianas, ignora quanto dinheiro público é
destinado a armamentos. E, contudo, devia sabê-lo! Fale-se disto, escreva-se sobre
isto, para que se conheçam os interesses e os lucros que movem os cordelinhos
das guerras.
Isaías, que profetizara o
Príncipe da paz, deixou escrito que virá um dia em que «uma nação não levantará
a espada contra outra»; um dia em que os homens «não se adestrarão mais para a
guerra», mas «transformarão as suas espadas em relhas de arado, e as suas
lanças em foices» (2, 4). Com a ajuda de Deus, esforcemo-nos para que se
aproxime esse dia!
Aproxime-se em Israel e na
Palestina, onde a guerra abala a vida daquelas populações. A todas abraço, em
particular às comunidades cristãs de Gaza – à paróquia de Gaza – e de toda a
Terra Santa. Trago no coração a dor pelas vítimas do execrável atentado de 7 de
outubro passado, e renovo um premente apelo pela libertação de quantos se
encontram ainda reféns. Suplico que cessem as operações militares, com o seu
espaventoso rasto de vítimas civis inocentes, que se ponha remédio à
desesperada situação humanitária, possibilitando a entrada das ajudas. Não se
continue a alimentar violência e ódio, mas avance-se no sentido duma solução
para a questão palestiniana, através dum diálogo sincero e perseverante entre
as Partes, sustentado por uma forte vontade política e pelo apoio da comunidade
internacional. Irmãos e irmãs, rezemos pela paz na Palestina e em Israel.
Depois o meu pensamento
volta-se para a população da atribulada Síria, bem como para a do Iémen,
mergulhada no sofrimento. Penso no amado povo libanês e rezo para que possa em
breve encontrar estabilidade política e social.
Com os olhos fixos no Menino
Jesus, imploro a paz para a Ucrânia. Renovemos a nossa proximidade espiritual e
humana ao seu martirizado povo, para que, graças ao apoio de cada um de nós,
possa sentir o amor concreto de Deus.
Aproxime-se o dia da paz
definitiva entre a Arménia e o Azerbaijão. Seja ela favorecida através da
prossecução das iniciativas humanitárias, o regresso dos deslocados às suas
casas na legalidade e em segurança, e o respeito mútuo pelas tradições religiosas
e locais de culto de cada comunidade.
Não esqueçamos as tensões e os
conflitos que transtornam a região do Sahel, o Corno de África, o Sudão, bem
como os Camarões, a República Democrática do Congo e o Sudão do Sul.
Aproxime-se o dia em que serão
reforçados os laços fraternos na península coreana, abrindo percursos de
diálogo e reconciliação que possam criar as condições para uma paz duradoura.
O Filho de Deus, feito humilde
Menino, inspire as autoridades políticas e todas as pessoas de boa vontade do
continente americano para se encontrarem soluções idóneas a fim de superar os
dissídios sociais e políticos, lutar contra as formas de pobreza que ofendem a
dignidade das pessoas, aplanar as desigualdades e enfrentar o doloroso fenómeno
das migrações.
Reclinado no presépio, o Menino
pede-nos para sermos voz de quem não tem voz: a voz dos inocentes, que morreram
por falta de água e pão; voz de quantos não conseguem encontrar emprego ou que
o perderam; voz de quem é constrangido a abandonar a sua terra natal à procura
dum futuro melhor, arriscando a vida em viagens extenuantes e à mercê de
traficantes sem escrúpulos.
Irmãos e irmãs, aproxima-se o
tempo de graça e esperança do Jubileu, que está quase a começar (...) Que
este período de preparação seja ocasião para converter o coração; para
dizer «não» à guerra e «sim» à paz; responder com alegria ao
convite do Senhor que nos chama, como profetizou Isaías, «para levar a boa-nova
aos pobres, para curar os desesperados, para anunciar a libertação aos exilados
e a liberdade aos prisioneiros» (61, 1).
Estas palavras cumpriram-se em
Jesus (cf. Lc 4, 18), hoje nascido em Belém. Acolhamo-Lo,
abramos o coração a Ele, o Salvador! Abramos o coração a Ele, o Salvador, que é
o Príncipe da paz!
Papa Francisco
(mensagem de Natal Urbi et Orbi, 25 de dezembro de 2023)