A celebração do Dia Mundial das Missões acontece anualmente
no terceiro domingo de outubro (18 de outubro, em 2020); os donativos
recolhidos nas Missas destinam-se a apoiar o trabalho das Obras Missionárias
Pontifícias.
Na sua mensagem para o 94.º Dia Mundial das Missões, o Papa
assume que a pandemia de Covid-19 deve ser um “desafio também para a missão da
Igreja”.
“Desafia-nos a doença, a tribulação, o medo, o isolamento. Interpela-nos a pobreza de quem morre sozinho, de quem está abandonado a si mesmo, de quem perde o emprego e o salário, de quem não tem abrigo e comida”, escreve Francisco, num texto com o título ‘Eis-me aqui, envia-me’.
MENSAGEM DE SUA SANTIDADE
O PAPA FRANCISCO
PARA O DIA MUNDIAL DAS MISSÕES DE 2020
[18 de outubro de 2020]
«Eis-me aqui, envia-me» (Is 6, 8)
Queridos irmãos e irmãs!
Desejo
manifestar a minha gratidão a Deus pelo empenho com que, em outubro passado,
foi vivido o Mês Missionário Extraordinário em toda a Igreja. Estou convencido
de que isso contribuiu para estimular a conversão missionária em muitas
comunidades pela senda indicada no tema «Batizados e enviados: a Igreja de
Cristo em missão no mundo».
Neste ano,
marcado pelas tribulações e desafios causados pela pandemia do covid-19, este
caminho missionário de toda a Igreja continua à luz da palavra que encontramos
na narração da vocação do profeta Isaías: «Eis-me aqui, envia-me» (Is 6,
8). É a resposta, sempre nova, à pergunta do Senhor: «Quem enviarei?» (Ibid.).
Esta chamada provém do coração de Deus, da sua misericórdia, que interpela quer
a Igreja quer a humanidade na crise mundial atual. «À semelhança dos discípulos
do Evangelho, fomos surpreendidos por uma tempestade inesperada e furibunda.
Demo-nos conta de estar no mesmo barco, todos frágeis e desorientados mas, ao
mesmo tempo, importantes e necessários: todos chamados a remar juntos, todos
carecidos de mútuo encorajamento. E, neste barco, estamos todos. Tal como os
discípulos que, falando a uma só voz, dizem angustiados “vamos perecer”
(cf. Mc 4, 38), assim também nós nos apercebemos de que não
podemos continuar estrada cada qual por conta própria, mas só o conseguiremos
juntos» (Francisco, Meditação na Praça de São Pedro, 27/III/2020). Estamos verdadeiramente assustados, desorientados e
temerosos. O sofrimento e a morte fazem-nos experimentar a nossa fragilidade
humana; mas, ao mesmo tempo, todos nos reconhecemos participantes dum forte
desejo de vida e de libertação do mal. Neste contexto, a chamada à missão, o
convite a sair de si mesmo por amor de Deus e do próximo aparece como
oportunidade de partilha, serviço, intercessão. A missão que Deus confia a cada
um faz passar do «eu» medroso e fechado ao «eu» resoluto e renovado pelo dom de
si.
No sacrifício
da cruz, onde se realiza a missão de Jesus (cf. Jo 19, 28-30),
Deus revela que o seu amor é por todos e cada um (cf. Jo 19,
26-27). E pede-nos a nossa disponibilidade pessoal para ser enviados, porque
Ele é Amor em perene movimento de missão, sempre em saída de Si mesmo para dar
vida. Por amor dos homens, Deus Pai enviou o Filho Jesus (cf. Jo 3,
16). Jesus é o Missionário do Pai: a sua Pessoa e a sua obra são, inteiramente,
obediência à vontade do Pai (cf. Jo 4, 34; 6, 38; 8,
12-30; Heb 10, 5-10). Por sua vez, Jesus – crucificado e
ressuscitado por nós –, no seu movimento de amor atrai-nos com o seu próprio
Espírito, que anima a Igreja, torna-nos discípulos de Cristo e envia-nos em
missão ao mundo e às nações.
«A missão, a
“Igreja em saída” não é um programa, um intuito concretizável por um esforço de
vontade. É Cristo que faz sair a Igreja de si mesma. Na missão de anunciar o
Evangelho, moves-te porque o Espírito te impele e conduz (Francisco, Sem
Ele nada podemos fazer, 2019, 16-17). Deus é sempre o primeiro a amar-nos
e, com este amor, vem ao nosso encontro e chama-nos. A nossa vocação pessoal
provém do facto de sermos filhos e filhas de Deus na Igreja, sua família,
irmãos e irmãs naquela caridade que Jesus nos testemunhou. Mas, todos têm uma
dignidade humana fundada na vocação divina a ser filhos de Deus, a tornar-se,
no sacramento do Batismo e na liberdade da fé, aquilo que são desde sempre no
coração de Deus.
Já o facto de
ter recebido gratuitamente a vida constitui um convite implícito para entrar na
dinâmica do dom de si mesmo: uma semente que, nos batizados, ganhará forma
madura como resposta de amor no matrimónio e na virgindade pelo Reino de Deus.
A vida humana nasce do amor de Deus, cresce no amor e tende para o amor.
Ninguém está excluído do amor de Deus e, no santo sacrifício de seu Filho Jesus
na cruz, Deus venceu o pecado e a morte (cf. Rom 8, 31-39).
Para Deus, o mal – incluindo o próprio pecado – torna-se um desafio para amar,
e amar cada vez mais (cf. Mt 5, 38-48; Lc 23,
33-34). Por isso, no Mistério Pascal, a misericórdia divina cura a ferida
primordial da humanidade e derrama-se sobre o universo inteiro. A Igreja,
sacramento universal do amor de Deus pelo mundo, prolonga na história a missão
de Jesus e envia-nos por toda a parte para que, através do nosso testemunho da
fé e do anúncio do Evangelho, Deus continue a manifestar o seu amor e possa
tocar e transformar corações, mentes, corpos, sociedades e culturas em todo o
tempo e lugar.
A missão é
resposta, livre e consciente, à chamada de Deus. Mas esta chamada só a podemos
sentir, quando vivemos numa relação pessoal de amor com Jesus vivo na sua
Igreja. Perguntemo-nos: estamos prontos a acolher a presença do Espírito Santo
na nossa vida, a ouvir a chamada à missão quer no caminho do matrimónio, quer
no da virgindade consagrada ou do sacerdócio ordenado e, em todo o caso, na
vida comum de todos os dias? Estamos dispostos a ser enviados para qualquer
lugar a fim de testemunhar a nossa fé em Deus Pai misericordioso, proclamar o
Evangelho da salvação de Jesus Cristo, partilhar a vida divina do Espírito
Santo edificando a Igreja? Como Maria, a Mãe de Jesus, estamos prontos a
permanecer sem reservas ao serviço da vontade de Deus (cf. Lc 1,
38)? Esta disponibilidade interior é muito importante para se conseguir
responder a Deus: Eis-me aqui, Senhor, envia-me (cf. Is 6, 8).
E isto respondido não em abstrato, mas no hoje da Igreja e da história.
A compreensão
daquilo que Deus nos está a dizer nestes tempos de pandemia torna-se um desafio
também para a missão da Igreja. Desafia-nos a doença, a tribulação, o medo, o
isolamento. Interpela-nos a pobreza de quem morre sozinho, de quem está
abandonado a si mesmo, de quem perde o emprego e o salário, de quem não tem
abrigo e comida. Obrigados à distância física e a permanecer em casa, somos
convidados a redescobrir que precisamos das relações sociais e também da
relação comunitária com Deus. Longe de aumentar a desconfiança e a indiferença,
esta condição deveria tornar-nos mais atentos à nossa maneira de nos
relacionarmos com os outros. E a oração, na qual Deus toca e move o nosso
coração, abre-nos às carências de amor, dignidade e liberdade dos nossos
irmãos, bem como ao cuidado por toda a criação. A impossibilidade de nos
reunirmos como Igreja para celebrar a Eucaristia fez-nos partilhar a condição
de muitas comunidades cristãs que não podem celebrar a Missa todos os domingos.
Neste contexto, é-nos dirigida novamente a pergunta de Deus – «quem enviarei?»
– e aguarda, de nós, uma resposta generosa e convicta: «Eis-me aqui, envia-me»
(Is 6, 8). Deus continua a procurar pessoas para enviar ao mundo e
às nações, a fim de testemunhar o seu amor, a sua salvação do pecado e da
morte, a sua libertação do mal (cf. Mt 9, 35-38; Lc 10,
1-11).
Celebrar o Dia
Mundial das Missões significa também reiterar que a oração, a reflexão e a
ajuda material das vossas ofertas são oportunidades para participar ativamente
na missão de Jesus na sua Igreja. A caridade manifestada nas coletas das
celebrações litúrgicas do terceiro domingo de outubro tem por objetivo
sustentar o trabalho missionário, realizado em meu nome pelas Obras
Missionárias Pontifícias, que acodem às necessidades espirituais e materiais
dos povos e das Igrejas de todo o mundo para a salvação de todos.
A Santíssima
Virgem Maria, Estrela da Evangelização e Consoladora dos Aflitos, discípula
missionária do seu Filho Jesus, continue a amparar-nos e a interceder por nós.
Roma, em São
João de Latrão, na Solenidade de Pentecostes, 31 de maio de 2020.
Francisco
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