Solenidade da Imaculada Conceição
8 de dezembro de 2016
A Imaculada Conceição e a história de Portugal
"As Nações sobrevivem à erosão do tempo e
permanecem vivas na história dos povos se prosseguirem na fecundidade que lhes
vem da sua espiritualidade e da sua cultura. A diluição espiritual e cultural
de um povo significará inevitavelmente a perca da sua identidade e a sua fusão
num hoje sem futuro.
A História de Portugal regista dois
momentos altos na recuperação da sua independência: a Revolução 1383-1385 e a
Restauração de 1640.
Na Revolução de 1383-1385 salienta-se o
cerco de Lisboa, que durou cerca de cinco meses e terminou em princípios de
setembro de 1384, acentuando-se durante o assédio, o significado da vitória
alcançada por D. Nuno Alvares Pereira em Atoleiros a 6 de abril de 1384 e a
eleição do Mestre de Aviz para Rei de Portugal, curiosamente a 6 de abril de
1385. Em 15 de agosto travou-se a Batalha de Aljubarrota, sob a chefia de D.
Nuno Alvares Pereira, símbolo da vitória e da consolidação do processo
revolucionário de 1383-1385.
No movimento da restauração destaca-se a
coroação de D. João IV como Rei de Portugal, a 15 de dezembro de 1640, no
Terreiro do Paço em Lisboa.
A Solenidade da Imaculada Conceição liga
estes dois acontecimentos decisivos na História da independência de Portugal e
no contexto das Nações Europeias. Segundo secular tradição foi o condestável D.
Nuno Alvares Pereira quem fundou a Igreja de Nossa Senhora do Castelo em Vila
Viçosa e quem ofereceu a imagem da Virgem Padroeira, adquirida na Inglaterra.
Este gesto do Contestável reconhece que a mística que levou Portugal à vitória
veio da devoção de um povo a Nossa Senhora da Conceição.
Aliás, já desde o berço, já aquando da
conquista de Lisboa por D. Afonso Henriques, havia sido celebrado um pontifical
de ação de graças, em Lisboa, em honra da Imaculada Conceição.
A espiritualidade que brotava da devoção a
Nossa Senhora da Conceição foi novamente sublinhada no gesto que D. João IV
assumiu ao coroar a Imagem de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa como
Rainha de Portugal nas cortes de 1646.
Esta espiritualidade imaculista foi igualmente
assumida por todos os intelectuais, que na prestigiada Universidade de Coimbra
defenderam o dogma da Imaculada Conceição sob a forma de um juramento solene.
De tal modo a Imaculada Conceição
caracteriza a espiritualidade dos portugueses, que durante séculos, o dia 8 de
dezembro foi celebrado como "Dia da Mãe" e João Paulo II incluiu no
seu inesquecível roteiro da Visita Pastoral de 1982 dois Santuários que unem o
Norte e o Sul de Portugal: Vila Viçosa no Alentejo e o Sameiro no Minho.
O dia 8 de dezembro transcende o "Dia
Santo" dos Católicos e engloba indubitavelmente a comemoração da
Independência de Portugal, que o dia 1 de dezembro retoma. O feriado do dia 8
de dezembro é religioso, mas é também celebrativo da cultura, da tradição e da
espiritualidade da alma e da identidade do povo português.
Não menos importante, e em âmbito
religioso e litúrgico, o tema da Imaculada Conceição da Virgem Maria é já
abundantemente abordado pelos Padres da Igreja. Será o Oriente cristão o
primeiro a celebrá-la. Festividade que chega à Europa Ocidental e ao continente
europeu pelas mãos das cruzadas Inglesas nos séc. XI e XII. Vivamente celebrada
pelos franciscanos a partir de 1263, será o também franciscano Sixto IV, Papa,
que a inscreverá no calendário litúrgico romano em 1477.
De facto, o debate e a celebração desta
festividade em toda a Europa é acompanhada pela história do próprio Portugal.
Coimbra, como já vimos, tem um importante papel em todo este processo.
Em 8 de dezembro de 1854, viverá a Igreja
o auge de toda esta riqueza teológica e celebrativa. Através da bula
"Ineffabilis Deus", Pio IX, após consultar os bispos do mundo,
definirá solenemente o dogma da Imaculada Conceição da Virgem Maria.
Não estamos diante de uma simples festa
cristã ou de capricho religioso. O dogma resulta de tudo quanto a Igreja viveu
até aqui e vive hoje em toda a sua plenitude. Faz parte da identidade da
Igreja. Isso mesmo o prova o texto proclamado por Pio IX que apoia a sua
argumentação nos Padres e Doutores da Igreja e na sua forma de interpretar a
Sagrada Escritura. Ele, de facto, reconhece que este dogma faz parte, depois de
muitos séculos, do ensinamento ordinário da Igreja.
Portugal, segundo Nuno Alvares Pereira, ou
melhor, São Nuno de Santa Maria, e D. João IV isso mesmo o demonstram, não só
como resultado da sua própria fé mas como expressão de um povo deveras
agradecido pela sua Independência e Liberdade."
P. Francisco Couto
Reitor do Santuário de Vila Viçosa, professor do Instituto Superior de Teologia
de Évora
P. Senra Coelho, professor do Instituto Superior de Teologia de Évora, Centro
de Estudos de História Religiosa da Universidade Católica Portuguesa
In Agência Ecclesia
Publicado em 06.12.2015
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