sábado, 26 de julho de 2025

 DOMINGO XVII DO TEMPO COMUM-2025-ANO C

Hoje, as leituras, de forma diferente, mas complementar, despertam-nos para a necessidade de orarmos. Também nos desafiam a estarmos atentos à forma como o fazemos, isto é, para o modo como escutamos Deus e nos relacionamos com Ele. Em todos os textos, de hoje, somos confrontados com uma relação de confiança total no Senhor Deus, nosso Pai, que se revela numa entrega sem qualquer reserva, numa intimidade total, numa comunhão de Amor, que envolve toda a humanidade, de todos os tempos. 

Na 1ªleitura (Gen 18, 20-32) é Abraão quem, de uma forma única e desconcertante, senão ousada, ou atrevida, mas totalmente confiante no Amor infinito de Deus, vai intercedendo pelos habitantes de Sodoma e Gomorra. É mesmo a oração de um filho que se dirige ao Pai, sabendo que Ele tem um coração, grande, imenso, no amor, e que dele faz a sua garantia. 

“Naqueles dias, disse o Senhor: «O clamor contra Sodoma e Gomorra é tão forte, o seu pecado é tão grave que Eu vou descer para verificar se o clamor que chegou até Mim corresponde inteiramente às suas obras. Se sim ou não, hei de sabê-lo». Os homens que tinham vindo à residência de Abraão dirigiram-se então para Sodoma, enquanto o Senhor continuava junto de Abraão. Este aproximou-se e disse: «Irás destruir o justo com o pecador? Talvez haja cinquenta justos na cidade. Matá-los-ás a todos? Não perdoarás a essa cidade, por causa dos cinquenta justos que nela residem? Longe de Ti fazer tal coisa: dar a morte ao justo e ao pecador, de modo que o justo e o pecador tenham a mesma sorte! Longe de Ti! O juiz de toda a terra não fará justiça?». O Senhor respondeu-lhe: «Se encontrar em Sodoma cinquenta justos, perdoarei a toda a cidade por causa deles». Abraão insistiu: «Atrevo-me a falar ao meu Senhor, eu que não passo de pó e cinza: talvez para cinquenta justos faltem cinco. Por causa de cinco, destruirás toda a cidade?». O Senhor respondeu: «Não a destruirei se lá encontrar quarenta e cinco justos». Abraão insistiu mais uma vez: «Talvez não se encontrem nela mais de quarenta». O Senhor respondeu: «Não a destruirei em atenção a esses quarenta». Abraão disse ainda: «Se o meu Senhor não levar a mal, falarei mais uma vez: talvez haja lá trinta justos». O Senhor respondeu: «Não farei a destruição, se lá encontrar esses trinta». Abraão insistiu novamente: «Atrevo-me ainda a falar ao meu Senhor: talvez não se encontrem lá mais de vinte justos». O Senhor respondeu: «Não destruirei a cidade em atenção a esses vinte». Abraão prosseguiu: «Se o meu Senhor não levar a mal, falarei ainda esta vez: talvez lá não se encontrem senão dez». O Senhor respondeu: «Em atenção a esses dez, não destruirei a cidade».”

Na 2ª leitura (Col 2, 12-14)  S.Paulo torna presente, para nós, que Cristo, durante toda a sua vida na terra, teve como preocupação constante fazer a vontade do Pai, viver em união perfeita com Ele. A sua comunhão com o Pai era total. E, mesmo vivendo assim em oração contínua, não prescindia de momentos de isolamento e intimidade com o Pai. É em Jesus, no alto da Cruz, que tomamos consciência de como deve ser a nossa oração.  Obrigada, Senhor Jesus, por nos amares assim. 

“Irmãos: Sepultados com Cristo no batismo, também com Ele fostes ressuscitados pela fé que tivestes no poder de Deus que O ressuscitou dos mortos. Quando estáveis mortos nos vossos pecados e na incircuncisão da vossa carne, Deus fez que voltásseis à vida com Cristo e perdoou-nos todas as nossas faltas. Anulou o documento da nossa dívida, com as suas disposições contra nós; suprimiu-o, cravando-o na cruz.” 

No Evangelho (Lc 11, 1-13) é o Senhor Jesus quem nos ensina a rezar, a pedido de um dos discípulos. Na oração que nos deixou ensina-nos a confiar totalmente em Deus, sem qualquer reserva, nem limite. Primeiro revela-nos a necessidade de sermos persistentes, insistentes, importunos e solidários na oração; depois desafia-nos a uma relação com o Pai, em todo e qualquer momento, sempre numa confiança  total e plena no Amor infinito de Deus por cada um de nós, numa comunhão crescente de intimidade e entrega.

“Naquele tempo, estava Jesus em oração em certo lugar. Ao terminar, disse-Lhe um dos discípulos: «Senhor, ensina-nos a orar, como João Baptista ensinou também os seus discípulos». Disse-lhes Jesus: «Quando orardes, dizei: ‘Pai, santificado seja o vosso nome; venha o vosso reino; dai-nos em cada dia o pão da nossa subsistência; perdoai-nos os nossos pecados, porque também nós perdoamos a todo aquele que nos ofende; e não nos deixeis cair em tentação’». Disse-lhes ainda: «Se algum de vós tiver um amigo, poderá ter de ir a sua casa à meia-noite, para lhe dizer: ‘Amigo, empresta-me três pães, porque chegou de viagem um dos meus amigos e não tenho nada para lhe dar’. Ele poderá responder lá de dentro: ‘Não me incomodes; a porta está fechada, eu e os meus filhos estamos deitados e não posso levantar-me para te dar os pães’. Eu vos digo: Se ele não se levantar por ser amigo, ao menos, por causa da sua insistência, levantar-se-á para lhe dar tudo aquilo de que precisa. Também vos digo: Pedi e dar-se-vos-á; procurai e encontrareis; batei à porta e abrir-se-vos-á. Porque quem pede recebe; quem procura encontra e a quem bate à porta, abrir-se-á. Se um de vós for pai e um filho lhe pedir peixe, em vez de peixe dar-lhe-á uma serpente? E se lhe pedir um ovo, dar-lhe-á um escorpião? Se vós, que sois maus, sabeis dar coisas boas aos vossos filhos, quanto mais o Pai do Céu dará o Espírito Santo àqueles que Lho pedem!».” 

Pai nosso, que estais no céu, santificado seja o Vosso nome, venha a nós o Vosso reino, seja feita a Vossa vontade, assim na terra como céu. O pão nosso de cada dia nos dai hoje, perdoai-nos a nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido e não nos deixeis cair em tentação, mas livrai-nos do mal. Ámen.

Rezar com coragem, com constância, até com importunação, sem nunca se cansar; porque a oração não é uma varinha mágica, mas uma busca, um trabalho, uma luta que requer vontade, constância e determinação, frisou o Papa na missa, indicando também duas modalidades concretas de oração: a de Santa Mónica, para implorar a conversão de Agostinho e a de um pai de Buenos Aires — um seu conhecido — que ficou uma noite inteira agarrado ao portão do santuário de Luján para invocar a cura da sua filha moribunda.

Para a sua homilia, o Pontífice inspirou-se no trecho litúrgico do Evangelho de Lucas (11, 5-13), onde «há três realidades: um homem necessitado, um amigo e um pouco de pão». O primeiro dos três, ou seja o necessitado, não «esperava que àquela hora chegasse outro amigo à sua casa, e nada tinha para lhe oferecer, porque já tinham jantado». Então pensou consigo mesmo: «Irei ter com o meu amigo, que me dará algo e amanhã arranjar-me-ei com ele». E vai ter com «o amigo porque tem confiança nele, é seu amigo»; mas ele responde-lhe: «Espera um pouco. Olha que horas são... eu e os meus filhos estamos na cama. Não posso levantar-me» para ir «procurar algo» na despensa. Contudo — observou Francisco — o protagonista da narração «insiste para ter o pão».

Então, eis os elementos identificados pelo Papa para atualizar a reflexão: «A necessidade; o amigo; e outro amigo que tem pão. Assim o Senhor quer ensinar-nos a rezar. Diz o Senhor: “Digo-vos: embora não se levante para lhe dar o pão, porque se trata do seu amigo, levantar-se-á pelo menos por causa da sua insistência, para lhe dar os pães dos quais precisa”. Tudo. “Vem, toma o pão, os chouriços, toma tudo e leva-o para casa”». Em síntese: «insistência. É assim que o Senhor nos quer ensinar a rezar».

Eis as modalidades concretas de oração sugeridas pelo Papa. «Devemos rezar com coragem, pois quando oramos precisamos de algo». E Deus é um amigo, aliás, «um amigo rico que tem pão, dispõe daquilo de que precisamos». É, acrescentou Francisco, «como se Jesus dissesse: “Na oração sede importunos. Não vos canseis”. Mas não vos canseis do quê? De pedir. “Pedi e ser-vos-á dado”». Portanto, uma oração que se faz busca. A tal propósito, o Papa recomendou: «Procurai. E se uma porta estiver fechada, ide bater à outra. Procurai e encontrareis. Batei e ser-vos-á aberto. Sede importunos na oração, pois quem pede recebe, quem procura encontra, quem bate ser-lhe-á aberto». E «isto é bonito», comentou esclarecendo que «a oração não é como uma varinha mágica: nós recitamos a oração e... pum! E cumpre-se a graça».

Ao contrário, segundo o Papa, «a oração é um trabalho: uma labuta que requer vontade, constância e determinação, sem vergonha. Porquê? Porque eu bato à porta do meu amigo. Deus é amigo, e com um amigo posso fazer isto. Uma prece constante, importuna». Como a de Santa Mónica, por exemplo: «Quantos anos rezou assim, até com lágrimas, pela conversão do seu filho» Agostinho. «No final o Senhor abriu a porta. Mas se pedires, recitares dois “Pais-Nossos” e fores embora», quer dizer que «não desejas realmente o que pedes». Ao contrário, é preciso «pedir com insistência».

E para explicar o seu pensamento, o Papa inspirou-se mais uma vez nas experiências pessoais vividas na Argentina, evocando um acontecimento muito emocionante. «Acho que certa vez vos disse, mas não tenho a certeza: eu estava em Buenos Aires, num hospital havia uma menina de nove anos com uma doença infecciosa, contagiosa, e numa semana teria morrido». Quando «os médicos chamaram os seus pais, disseram-lhes: “Fizemos o possível, mas não há nada a fazer. Morrerá em duas ou três horas”». Então «o pai, que era um operário — um homem simples, trabalhador — e conhecia a realidade da vida como Jesus, saiu da clínica, deixou ali a sua esposa, apanhou um autocarro» e percorreu 70 km até ao santuário de Nossa Senhora de Luján. Saiu por volta das 18h00 e chegou às 20/21h00, quando o santuário já estava fechado. Mas «esse homem permaneceu ali a noite inteira, diante do santuário. Agarrou-se ao portão de entrada do santuário, e a noite inteira implorou a Nossa Senhora: “Quero a minha filha. Quero a minha filha. Tu podes dar-ma”. Depois, por volta das 5/6h da manhã, voltou a apanhar o autocarro e regressou». Chegou «mais ou menos às 9h30 e encontrou a esposa um pouco desorientada, sozinha. A menina não estava ali. Pensou no pior. E a mãe, a esposa, disse-lhe: “Sabes, os médicos levaram-na para fazer outro exame, não conseguem explicar porque ela despertou e pediu para comer, e não tem nada, está bem, fora de perigo”. Isto aconteceu. Estou certo». E o ensinamento tirado deste acontecimento é que «aquele homem talvez não fosse à missa todos os domingos, mas sabia rezar, sabia que quando» temos «uma necessidade, há um amigo que tem a possibilidade, tem o pão, tem a possibilidade de resolver um nosso problema». Por isso, «bateu à porta a noite inteira».

Certamente, trata-se de «um exemplo». Mas «há muitos», afirmou o Papa, salientando que a maior parte de «nós não sabe rezar. Orai um pouco: “Quero isto...”. Pensai nas crianças mimadas que, quando querem algo, gritam, se agitam, “Eu quero, eu quero!”. Choram e no final a mãe e o pai dizem: “Toma lá isto e vai, pelo menos assim não chateias”». Acontece o mesmo «com Deus. “Mas padre, Deus não se zangará se eu agir assim?”. Jesus prevê esta pergunta, dizendo: “Mas qual pai entre vós, se o filho lhe pedir um peixe, lhe dará uma serpente? Ou se lhe pedir um ovo, lhe dará um escorpião? Se vós, que sois maus — que sois pais maus, todos somos maus — sabeis dar coisas boas aos vossos filhos, muito mais o vosso Pai celeste dará o Espírito Santo aos que lho pedirem!». De resto, Deus «é um amigo: dá sempre o bem. E mais: peço-lhe para resolver este problema, e Ele resolve-se, concedendo-te até o Espírito Santo. E mais!».

Disto sobressai uma consideração final, um convite da parte do Papa: «Pensemos um pouco: como rezo? Como um papagaio? Rezo precisamente com a necessidade no coração? Luto com Deus na oração, para que Ele me conceda aquilo de que tenho necessidade, se for justo? Aprendamos a rezar a partir deste trecho do Evangelho».

Papa Francisco
(Homilias matutinas na capela de Santa Marta, 11 de outubro de 2018)

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