sábado, 5 de outubro de 2024

 XXVII DOMINGO DO TEMPO COMUM


As leituras de hoje falam-nos do projeto de Amor que Deus tem para cada um de nós, desde o princípio dos princípios, isto é, desde sempre. Mas, interpelam-nos também para a necessidade de sermos fiéis a esse Amor, que nos habita e nos faz um com os outros. Há que aprender com as crianças, a ser puro de coração, a dar-se com todos, a criar laços de proximidade, sem excluir ninguém.

Na 1ªleitura (Gen 2, 18-24) o autor sagrado conta-nos como Deus sonhou, para cada homem/mulher, um projeto de felicidade e, mais, como lhe proporcionou (e continua a proporcionar) todas as condições para ser feliz. 

“Disse o Senhor Deus: «Não é bom que o homem esteja só: vou dar-lhe uma auxiliar semelhante a ele». Então o Senhor Deus, depois de ter formado da terra todos os animais do campo e todas as aves do céu, conduziu-os até junto do homem, para ver como ele os chamaria, a fim de que todos os seres vivos fossem conhecidos pelo nome que o homem lhes desse. O homem chamou pelos seus nomes todos os animais domésticos, todas as aves do céu e todos os animais do campo. Mas não encontrou uma auxiliar semelhante a ele. Então o Senhor Deus fez descer sobre o homem um sono profundo e, enquanto ele dormia, tirou-lhe uma costela, fazendo crescer a carne em seu lugar. Da costela do homem o Senhor Deus formou a mulher e apresentou-a ao homem. Ao vê-la, o homem exclamou: «Esta é realmente osso dos meus ossos e carne da minha carne. Chamar-se-á mulher, porque foi tirada do homem». Por isso, o homem deixará pai e mãe, para se unir à sua esposa, e os dois serão uma só carne.” 

Na 2ªleitura (Hebr 2, 9-11) S. Paulo centra-nos no Amor que Deus nos tem. É tão grande, tão incomensurável, que chega ao ponto de entregar Seu próprio e único Filho por nosso amor! E Jesus todo de Se dá! Oh Amor sem igual, que a todos nos recuperaste para Deus e nos ganhaste a condição de “ Teus irmãos”. Bendito e louvado sejas Senhor por nos amares assim, infinitamente. 

“Irmãos: Jesus, que, por um pouco, foi inferior aos Anjos, vemo-l’O agora coroado de glória e de honra por causa da morte que sofreu, pois era necessário que, pela graça de Deus, experimentasse a morte em proveito de todos. Convinha, na verdade, que Deus, origem e fim de todas as coisas, querendo conduzir muitos filhos para a sua glória, levasse à glória perfeita, pelo sofrimento, o Autor da salvação. Pois Aquele que santifica e os que são santificados procedem todos de um só. Por isso não Se envergonha de lhes chamar irmãos.” 

O evangelho (Mc 10, 2-16), que parte de uma armadilha que os fariseus colocaram a Jesus, acaba por ser uma manifestação clara de que Deus nos criou livres e capazes de nos amarmos uns aos outros. E, quando na relação do casal algo se “quebra”, Deus confia que há também a capacidade para reconstruir e aprofundar o compromisso assumido. E, para lá do matrimónio, podemos alargar esta dinâmica às outras situações/estados de vida, pois, em todas, o dom da fidelidade é condição e é possível, se nos deixarmos habitar pelo Amor. Entreguemo-nos a Jesus, como faziam as criancinhas. Deixemo-nos amar por Ele. 

“Naquele tempo, aproximaram-se de Jesus uns fariseus para O porem à prova e perguntaram-Lhe: «Pode um homem repudiar a sua mulher?». Jesus disse-lhes: «Que vos ordenou Moisés?». Eles responderam: «Moisés permitiu que se passasse um certificado de divórcio, para se repudiar a mulher». Jesus disse-lhes: «Foi por causa da dureza do vosso coração que ele vos deixou essa lei. Mas, no princípio da criação, ‘Deus fê-los homem e mulher. Por isso, o homem deixará pai e mãe para se unir à sua esposa, e os dois serão uma só carne’. Deste modo, já não são dois, mas uma só carne. Portanto, não separe o homem o que Deus uniu». Em casa, os discípulos interrogaram-n’O de novo sobre este assunto. Jesus disse-lhes então: «Quem repudiar a sua mulher e casar com outra, comete adultério contra a primeira. E se a mulher repudiar o seu marido e casar com outro, comete adultério». Apresentaram a Jesus umas crianças para que Ele lhes tocasse, mas os discípulos afastavam-nas. Jesus, ao ver isto, indignou-Se e disse-lhes: «Deixai vir a Mim as criancinhas, não as estorveis: dos que são como elas é o reino de Deus. Em verdade vos digo: Quem não acolher o reino de Deus como uma criança, não entrará nele». E, abraçando-as, começou a abençoá-las, impondo as mãos sobre elas.”

Dai-me Senhor um coração, que todo se entregue a Ti e aí permaneça numa atitude dinâmica de elo de transmissão, para que, no dia a dia da vida, os que comigo se cruzam, Te recebam, se encontrem conTigo.

Queridos irmãos e irmãs, bom dia!

O Evangelho deste domingo (cf. Mc 10, 2-16) oferece-nos a palavra de Jesus sobre o matrimónio. A narração abre-se com a provocação dos fariseus que perguntam a Jesus se é lícito que um marido repudie a esposa, como previa a lei de Moisés (cf. vv. 2-4). Antes de tudo, Jesus, com a sabedoria e a autoridade que lhe vêm do Pai, ameniza a prescrição moisaica dizendo: «Pela dureza dos vossos corações ele — ou seja, o antigo legislador — vos deixou escrito este mandamento» (v. 5). Trata-se portanto de uma concessão que serve para remediar as falhas causadas pelo nosso egoísmo, mas não corresponde à intenção originária do Criador.

E aqui Jesus retoma o Livro do Génesis: «Desde o início da criação [Deus] os criou varão e mulher; por isso o homem deixará seu pai e sua mãe e se unirá à sua esposa e os dois serão um só» (vv. 6-7). E conclui: «Não divida o homem o que Deus uniu» (v. 9). O projeto originário do Criador não inclui o homem que se casa com a mulher e, se as coisas não funcionam, a repudia. Não. Ao contrário, inclui o homem e a mulher chamados a reconhecer-se, a completar-se, a ajudar-se reciprocamente no matrimónio.

Este ensinamento de Jesus é muito claro e defende a dignidade do matrimónio, como união de amor que requer a fidelidade. Aquilo que consente que os esposos permaneçam unidos no matrimónio é um amor de doação recíproca amparado pela graça de Cristo. Se, ao contrário, prevalecer nos cônjuges o interesse individual, a própria satisfação, então a sua união não poderá resistir.

E a mesma página evangélica recorda-nos, com grande realismo, que o homem e a mulher, chamados a viver a experiência da relação e do amor, podem dolorosamente fazer gestos que a põem em crise. Jesus não admite tudo o que pode levar ao naufrágio da relação. Faz isso para confirmar o desígnio de Deus, no qual sobressaem a força e a beleza da relação humana. A Igreja, por um lado, não se cansa de confirmar a beleza da família como nos foi recomendada pela Escritura e pela Tradição; ao mesmo tempo, esforça-se por fazer sentir concretamente a sua proximidade materna a quantos vivem a experiência de relações interrompidas ou levadas por diante de maneira sofrida e fadigosa.

O modo de agir do próprio Deus com o seu povo infiel — isto é, connosco — ensina-nos que o amor ferido pode ser sanado por Deus através da misericórdia e do perdão. Por isso à Igreja, nestas situações, não é pedida imediata e unicamente a condenação. Ao contrário, face às tantas dolorosas falências conjugais, ela sente-se chamada a viver a sua presença de amor, de caridade e de misericórdia, para reconduzir a Deus os corações feridos e desorientados.

Invoquemos a Virgem Maria, para que ajude os cônjuges a viver e a renovar sempre a sua união a partir da doação originária de Deus.

Papa Francisco

(Angelus , 7 de outubro de 2018)

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