Vaticano:
Papa publica documento sobre a Bíblia e questiona desconhecimento de texto
fundamental do Cristianismo e da Cultura ocidental
Ecclesia - Set
30, 2020 - 13:44
Carta
apostólica assinala 1600 anos da morte de São Jerónimo, que se distinguiu pela
tradução e comentário dos textos bíblicos
Cidade
do Vaticano, 30 set 2020 (Ecclesia) – O Papa publicou hoje, 16.º centenário da
morte de São Jerónimo, uma carta apostólica sobre a Bíblia, ‘Sacrae Scripturae
affectus’ (O afeto pela Sagrada Escritura), na qual questiona o desconhecimento
de um texto fundamental do Cristianismo e da Cultura ocidental.
“Infelizmente,
a riqueza da Escritura é ignorada ou minimizada por muitos, porque não lhes
foram fornecidas as bases essenciais para o seu conhecimento. Por conseguinte,
a par dum incremento dos estudos eclesiásticos, dirigidos a sacerdotes e catequistas,
que proporcionem de forma mais adequada a competência na Sagrada Escritura,
deve ser promovida uma formação alargada a todos os cristãos”, pede Francisco,
no documento divulgado, simbolicamente, na memória litúrgica de São Jerónimo
(340-420), que se distinguiu pela tradução e comentário dos textos bíblicos.
A
carta refere que em muitas famílias cristãs “não há ninguém que se sinta capaz
de dar a conhecer aos filhos a Palavra do Senhor com toda a sua beleza e força
espiritual”.
Em
2019, com o Motu Proprio ‘Aperuit illis’, o Papa determinou que “o III Domingo
do Tempo Comum seja dedicado à celebração, reflexão e divulgação da Palavra de
Deus”, nas comunidades católicas.
“Muitos,
mesmo entre os cristãos praticantes, declaram-se abertamente incapazes de ler
[a Bíblia], não por analfabetismo, mas por não estarem preparados para a
linguagem bíblica, os seus modos de se expressar e as tradições culturais
antigas, pelo que o texto bíblico resulta indecifrável, como se estivesse
escrito num alfabeto desconhecido e numa língua enigmática”, precisa Francisco.
O
documento pede que o ensino sobre a Bíblia garanta aos alunos “uma capacidade
interpretativa competente”, incluindo a “contribuição indispensável do Antigo
Testamento”.
Um
dos problemas atuais – e não só da religião – é o analfabetismo: faltam as
habilitações hermenêuticas que nos tornem intérpretes e tradutores credíveis da
nossa própria tradição cultural. De forma especial aos jovens, quero lançar um
desafio: parti à procura da vossa herança”.
Francisco
apresenta uma síntese da vida de São Jerónimo, marcada pela “consagração
absoluta e rigorosa a Deus” e “o empenho assíduo no estudo”, mostrando a sua
admiração pelo autor de uma histórica tradução da Bíblia para o latim, a
Vulgata.
“O
resultado é um verdadeiro monumento que marcou a história cultural do Ocidente,
modelando a sua linguagem teológica. Jerónimo é exegeta, professor, guia
espiritual”, sustenta.
O
Papa sublinha a importância da tradução, saudando a “vitalidade missionária
extraordinária” que se manifesta na publicação da Bíblia “em mais de três mil
línguas”.
“O
centenário atual constitui um apelo a amar o que Jerónimo amou, redescobrindo
os seus escritos e deixando-se tocar pelo impacto duma espiritualidade que se
pode descrever, no seu núcleo mais vital, como o desejo inquieto e apaixonado
dum conhecimento maior do Deus da Revelação”, escreve Francisco.
Francisco destaca uma pintura de Caravaggio, exposta na Galeria Borghese de Roma: “Com efeito, numa única cena, o idoso asceta é apresentado sumariamente coberto por um pano vermelho, tendo sobre a mesa uma caveira, símbolo da vaidade das realidades terrenas, mas ao mesmo tempo é poderosamente representada também a qualidade do estudioso, que conserva os olhos fixos no livro enquanto a sua mão, no ato caraterístico do escritor, molha a pena no tinteiro”.
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