sábado, 27 de julho de 2024

  XVII DOMINGO DO TEMPO COMUM

Nas leituras de hoje somos convidados a, primeiro que tudo, confiar em Deus, que olha por todos e está sempre atento às nossas necessidades. Depois, somos chamados a entregar tudo o que temos a Deus, numa partilha com os irmãos. E quando é dado no Amor, isto é, em Deus, o milagre da multiplicação acontecerá, porque Ele não sabe senão dar-Se contínua e infinitamente. Partilhemos e demo-nos para que, quem tem não estrague, não desperdice e a quem não tem, não falte.

Na primeira leitura (2 Reis 4, 42-44) testemunhamos a confiança, do profeta Eliseu, em Deus. Àquele que lhe dá vinte pães de cevada e trigo novo, como as primícias da colheita, pede para tudo distribuir pelas cem pessoas que o escutam. Contra toda a objetividade, racionalidade e incredulidade, sobressai a sua total confiança na promessa do Senhor, que disse: ‘Comerão e ainda há de sobrar’. E assim foi. Feita a nossa parte, só temos de confiar no Amor de Deus, que ama incomensuravelmente todos e cada um de nós. Ele fará acontecer o que for melhor. A Deus nada é impossível!

“Naqueles dias, veio um homem da povoação de Baal-Salisa e trouxe a Eliseu, o homem de Deus, pão feito com os primeiros frutos da colheita. Eram vinte pães de cevada e trigo novo no seu alforge. Eliseu disse: «Dá-os a comer a essa gente». O servo respondeu: «Como posso com isto dar de comer a cem pessoas?». Eliseu insistiu: «Dá-os a comer a essa gente, porque assim fala o Senhor: ‘Comerão e ainda há de sobrar’». Deu-lhos e eles comeram, e ainda sobrou, segundo a palavra do Senhor.”

Na 2ª leitura (Ef 4, 1-6) S.Paulo faz-nos um apelo veemente a vivermos comos cristãos, na unidade e na caridade em Deus, num só Deus e num só batismo. Este há de ser o nosso distintivo: “Vede como eles se amam”. Como é difícil sermos este sinal, nos tempos que correm, mas não há volta a dar, o caminho é este: só em Deus, por Cristo, diz-nos S.Paulo, tal será possível. Que o Senhor nos ilumine e guie e Nossa Senhora nos ajude.

“Irmãos: Eu, prisioneiro pela causa do Senhor, recomendo-vos que vos comporteis segundo a maneira de viver a que fostes chamados: procedei com toda a humildade, mansidão e paciência; suportai-vos uns aos outros com caridade; empenhai-vos em manter a unidade de espírito pelo vínculo da paz. Há um só Corpo e um só Espírito, como há uma só esperança na vida a que fostes chamados. Há um só Senhor, uma só fé, um só Batismo. Há um só Deus e Pai de todos, que está acima de todos, atua em todos e em todos Se encontra.” 

No Evangelho (Jo 6, 1-15) S.João desafia-nos a confiar em Deus e a n’Ele partilharmos o que temos e somos. Um pouco, ou bastante, à semelhança do que fez Eliseu, na primeira leitura, somos confrontados com: a atitude da multidão (da qual também fazemos parte), que faminta se senta organizadamente sobre a erva abundante; a perplexidade dos discípulos que não acreditam que, com  cinco pães de cevada e dois peixes, se possam alimentar cinco mil pessoas. Mas, também como os discípulos, acreditamos que Jesus é o Filho de Deus, é Deus na Trindade e que Deus, Amor infinito em comunicação contínua, está sempre a dar-Se. E também nós ajudamos a distribuir o que há para dar. E chega para todos! Melhor ainda, sobra para quem não está e também tem fome. Quando o nosso coração se abre a Deus e aos outros, é isto que acontece, Deus comunica-se num Amor sem fim a quem d’Ele necessita.

“Naquele tempo, Jesus partiu para o outro lado do mar da Galileia, ou de Tiberíades. Seguia-O numerosa multidão, por ver os milagres que Ele realizava nos doentes. Jesus subiu a um monte e sentou-Se aí com os seus discípulos. Estava próxima a Páscoa, a festa dos judeus. Erguendo os olhos e vendo que uma grande multidão vinha ao seu encontro, Jesus disse a Filipe: «Onde havemos de comprar pão para lhes dar de comer?». Dizia isto para o experimentar, pois Ele bem sabia o que ia fazer. Respondeu-Lhe Filipe: «Duzentos denários de pão não chegam para dar um bocadinho a cada um». Disse-Lhe um dos discípulos, André, irmão de Simão Pedro: «Está aqui um rapazito que tem cinco pães de cevada e dois peixes. Mas que é isso para tanta gente?». Jesus respondeu: «Mandai-os sentar». Havia muita erva naquele lugar e os homens sentaram-se em número de uns cinco mil. Então, Jesus tomou os pães, deu graças e distribuiu-os aos que estavam sentados, fazendo o mesmo com os peixes; e comeram quanto quiseram. Quando ficaram saciados, Jesus disse aos discípulos: «Recolhei os bocados que sobraram, para que nada se perca». Recolheram-nos e encheram doze cestos com os bocados dos cinco pães de cevada que sobraram aos que tinham comido. Quando viram o milagre que Jesus fizera, aqueles homens começaram a dizer: «Este é, na verdade, o Profeta que estava para vir ao mundo». Mas Jesus, sabendo que viriam buscá-l’O para O fazerem rei, retirou-Se novamente, sozinho, para o monte.”

Senhor, que eu me entregue sempre a Ti e aos outros, sem medo, numa disponibilidade total do meu ser.

Estimados irmãos e irmãs, bom dia!

O Evangelho da Liturgia deste domingo narra o célebre episódio da multiplicação dos pães e dos peixes, com o qual Jesus dá de comer a cerca de cinco mil pessoas que o vieram ouvir (cf. Jo 6, 1-15). É interessante ver como este prodígio acontece: Jesus não cria os pães e os peixes a partir do nada, não, mas opera a partir do que os discípulos lhe trazem. Um deles diz: «Está aqui um rapazito que tem cinco pães de cevada e dois peixes: mas que é isso para tanta gente?»  (v. 9). É pouco, é nada, mas para Jesus é suficiente.

Procuremos agora colocar-nos no lugar desse rapazito. Os discípulos pedem-lhe que partilhe tudo o que tem para comer. Parece uma proposta sem sentido, aliás, injusta. Por que privar uma pessoa, sobretudo um menino, do que trouxe de casa e tem o direito de reservar para si? Por que tirar a uma pessoa o que não é suficiente para alimentar toda a gente? Humanamente, é ilógico. Mas para Deus não. Pelo contrário, graças a esse pequeno dom gratuito e, portanto, heroico, Jesus pode dar de comer a todos. Para nós é um grande ensinamento. Diz-nos que o Senhor pode fazer muito com o pouco que pomos à sua disposição. Seria bom perguntarmo-nos todos os dias: “O que levo hoje a Jesus?”. Ele pode fazer muito com uma nossa oração, com um nosso gesto de caridade para com os outros, até com uma das nossas misérias entregues à sua misericórdia. Entreguemos a nossa pequenez a Jesus, e Ele faz milagres. É assim que Deus gosta de agir: Ele faz grandes coisas a partir das pequenas, a partir das gratuitas.

Todos os grandes protagonistas da Bíblia – Abraão, Maria e o menino de hoje – mostram esta lógica da pequenez e do dom. A lógica do dom é muito diferente da nossa. Procuramos acumular e aumentar o que temos, mas Jesus pede-nos para dar, para diminuir. Gostamos de acrescentar, gostamos das adições; Jesus gosta das subtrações, de tirar algo para o dar a outros. Queremos multiplicar para nós; Jesus aprecia quando dividimos com os outros, quando partilhamos. É curioso que nos relatos da multiplicação dos pães nos Evangelhos, o verbo “multiplicar” nunca aparece. Pelo contrário, os verbos utilizados são de sinal oposto: “partir”, “dar”, “distribuir” (cf. v. 11; Mt 14, 19; Mc 6, 41; Lc 9, 16). Mas o verbo “multiplicar” não é usado. O verdadeiro milagre, diz Jesus, não é a multiplicação que produz ostentação e poder, mas a divisão, a partilha, que aumenta o amor e permite que Deus realize maravilhas. Procuremos partilhar mais, tentemos este caminho que Jesus nos ensina.

Ainda hoje, a multiplicação de bens não resolve os problemas sem uma partilha justa. Vem-me à mente a tragédia da fome, que atinge particularmente os mais pequeninos. Foi calculado – oficialmente – que todos os dias no mundo cerca de sete mil crianças com menos de cinco anos morrem devido à desnutrição, pois não têm o suficiente para viver. Face a escândalos como estes, Jesus dirige-nos um convite, um convite semelhante ao que provavelmente recebeu o rapaz do Evangelho, que não tem nome e no qual todos nós nos podemos ver: “Coragem, dá o pouco que tens, os teus talentos, os teus bens, torna-os disponíveis para Jesus e para os teus irmãos. Não tenhas medo, nada se perderá, porque se partilhares, Deus multiplica. Expulsa a falsa modéstia de te sentires inadequado, confia. Acredita no amor, acredita no poder do serviço, acredita na força da gratuidade”.

Que a Virgem Maria, que respondeu “sim” à proposta sem precedentes de Deus, nos ajude a abrir o coração aos convites do Senhor e às necessidades dos outros.

Papa Francisco

(Angelus , 25 de julho de 2021)

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