XIV DOMINGO DO TEMPO COMUM
As leituras de hoje conduzem-nos pelos caminhos da fé de uma forma tão humana, quanto espiritual. Por um lado, as várias situações apresentadas nas leituras estão profundamente enraizadas no dia a dia do povo de Israel, e também em pleno séc. XXI, na nossa labuta diária, numa relação tanto individual, quanto coletiva, mas por outro desafiam-nos a uma confiança total no Pai, no Seu Amor infinito por cada um de nós. É na fé, que a nossa alma, todo o nosso ser, adere por inteiro, se entrega verdadeiramente a Deus, e aí o milagre acontece.
Na 1ª leitura (Ez 2, 2-5) o profeta Ezequiel deixa-se conduzir pelo Espírito
Santo e diz ao povo do seu tempo e também a nós, homens e mulheres de hoje, que
o Senhor habita, vive no meio de nós, é um connosco, “enamorado” da Sua
criatura. Acreditar e deixar-se amar assim por Deus é com cada um, pois o
Senhor não Se impõe a ninguém, propõe-se, sujeita-se à nossa escolha, sabendo
de antemão que, tantas vezes, somos rebeldes e de coração duro. Mil graças te
dou Senhor, por nos amares tão “loucamente”. Bendito e louvado sejas hoje e sempre
pelos séculos sem fim.
“Naqueles dias, o Espírito entrou em mim e fez-me
levantar. Ouvi então Alguém que me dizia: «Filho do homem, Eu te envio aos
filhos de Israel, a um povo rebelde que se revoltou contra Mim. Eles e seus
pais ofenderam-Me até ao dia de hoje. É a esses filhos de cabeça dura e coração
obstinado que te envio, para lhes dizeres: ‘Eis o que diz o Senhor’. Podem
escutar-te ou não – porque são uma casa de rebeldes –, mas saberão que há um
profeta no meio deles».”
Na 2ªleitura (2 Cor 12, 7-10) é um S.Paulo totalmente
entregue ao Senhor, quem nos revela até onde vai o Amor de Deus por cada ser
criado. Faz-nos perceber que Deus não se escandaliza com as nossas
fragilidades, mas que, pelo contrário, é nelas que podemos sentir a força, a
ternura, a enormidade de Deus Amor. Bendito sejas Senhor!
“Irmãos: Para que a grandeza das revelações não me
ensoberbeça, foi-me deixado um espinho na carne, – um anjo de Satanás que me
esbofeteia – para que não me orgulhe. Por três vezes roguei ao Senhor que o
apartasse de mim. Mas Ele disse-me: «Basta-te a minha graça, porque é na
fraqueza que se manifesta todo o meu poder». Por isso, de boa vontade me
gloriarei das minhas fraquezas, para que habite em mim o poder de Cristo.
Alegro-me nas minhas fraquezas, nas afrontas, nas adversidades, nas
perseguições e nas angústias sofridas por amor de Cristo, porque, quando sou
fraco, então é que sou forte.”
No evangelho (Mc 6, 1-6) acompanhamos Jesus e os discípulos
numa ida à Sua terra, já na vida pública, em pleno anúncio do Reino e no apelo
à conversão. Provavelmente era conhecido por todos, ou, pelo menos, pela grande
maioria dos ali residentes, afinal tinha brincado e crescido com tantos deles…
Até tinha aí exercido a atividade de carpinteiro… Ao contraste de sentimentos
provocado pelas Suas palavras sucede-se uma incapacidade de acreditar
verdadeiramente em Quem Ele é. E, devido à falta de fé daquelas pessoas, Jesus
curou alguns, mas não fez ali nenhum milagre. Sem uma relação de comunhão, de
amor, de entrega, de adesão ao Pai, não pode haver milagre, porque este vai
muito para além da cura física, acontece na fé em Deus.
“Naquele tempo, Jesus dirigiu-Se à sua terra e os
discípulos acompanharam-n’O. Quando chegou o sábado, começou a ensinar na
sinagoga. Os numerosos ouvintes estavam admirados e diziam: «De onde Lhe vem
tudo isto? Que sabedoria é esta que Lhe foi dada e os prodigiosos milagres
feitos por suas mãos? Não é Ele o carpinteiro, filho de Maria, e irmão de
Tiago, de José, de Judas e de Simão? E não estão as suas irmãs aqui entre
nós?». E ficavam perplexos a seu respeito. Jesus disse-lhes: «Um profeta só é
desprezado na sua terra, entre os seus parentes e em sua casa». E não podia ali
fazer qualquer milagre; apenas curou alguns doentes, impondo-lhes as mãos.
Estava admirado com a falta de fé daquela gente. E percorria as aldeias dos
arredores, ensinando.”
Senhor, eu creio em Ti, mas aumenta a minha pouca fé.
Amados
irmãos e irmãs, bom dia!
A hodierna página evangélica (cf. Mc 6, 1-6)
apresenta Jesus que regressa a Nazaré e, no dia de sábado, começa a ensinar na
sinagoga. Desde que se tinha ido embora para começar a pregar nos povoados e
aldeias circunvizinhas, nunca voltara à sua pátria. Voltou. Portanto, toda a
cidade terá ido ouvir este filho do povo, cuja fama de mestre sábio e de
poderoso curador já se alastrava pela Galileia e além. Mas aquilo que se
poderia apresentar como um sucesso, transformou-se numa clamorosa recusa, a
ponto que Jesus não pôde realizar ali prodígio algum, mas apenas poucas curas (cf. v. 5). A dinâmica daquele dia foi reconstruída
detalhadamente pelo evangelista Marcos; o povo de Nazaré inicialmente ouve, e
fica admirado; depois questiona-se perplexo: «de onde lhe vêm estas coisas»,
esta sabedoria?; e no final escandaliza-se, ao reconhecer n’Ele o carpinteiro,
o filho de Maria, que eles viram nascer (vv. 2-3). Por isso Jesus conclui com a expressão que se
tornou proverbial: «um profeta só é desprezado na sua pátria» (v. 4).
Perguntemo-nos: por que passam
os concidadãos de Jesus da admiração à incredulidade? Eles fazem um confronto
entre a origem humilde de Jesus e as suas capacidades atuais: é um carpinteiro,
não estudou, contudo prega melhor que os escribas e faz milagres. Mas em vez de
se abrirem à realidade, escandalizam-se. Segundo os habitantes de Nazaré, Deus
é demasiado grande para se abaixar e falar através de um homem tão simples! É o
escândalo da encarnação: o evento desconcertante de um Deus que se fez carne,
que pensa com mente de homem, trabalha e age com mãos de homem, ama com coração
de homem, um Deus que trabalha, come e dorme como um de nós. O Filho de Deus
inverte qualquer esquema humano: não foram os discípulos que lavaram os pés ao
Senhor, mas foi o Senhor que lavou os pés aos discípulos (cf. Jo 13, 1-20).
É este o motivo de escândalo e de incredulidade não só naquela época, em todas
as épocas, mas também hoje.
A inversão realizada por Jesus
engaja os seus discípulos de ontem e de hoje numa verificação pessoal e
comunitária. Com efeito, também nos nossos dias pode acontecer que se alimentem
preconceitos que impedem que se compreenda a realidade. Mas o Senhor convida-nos
a assumir uma atitude de escuta humilde e de expetativa dócil, porque a graça
de Deus se apresenta, com frequência, de maneiras surpreendentes, que não
correspondem às nossas expetativas. Pensemos juntos na Madre Teresa de Calcutá,
por exemplo. Uma religiosa pequenina — ninguém dava dez tostões por ela — que
ia pelas ruas recuperar os moribundos para que tivessem uma morte digna. Esta
pequenina religiosa fez maravilhas com as orações e com as suas obras! A
pequenez de uma mulher revolucionou as obras de caridade na Igreja. É um
exemplo dos nossos dias. Deus não se conforma com os preconceitos. Devemos
esforçar-nos por abrir o coração e a mente, para acolher a realidade divina que
vem ao nosso encontro. Trata-se de ter fé: a falta de fé é um obstáculo à graça
de Deus. Muitos batizados vivem como se Cristo não existisse: repetem-se gestos
e os sinais da fé, mas a eles não corresponde uma adesão real à pessoa de Jesus
nem ao seu Evangelho. Cada cristão — todos nós, cada um de nós — é chamado a
aprofundar esta pertença fundamental, procurando testemunhá-la com uma conduta
de vida coerente, cujo fio condutor será sempre a caridade.
Peçamos ao Senhor, por
intercessão da Virgem Maria, que desfaça a dureza dos corações e a limitação
das mentes, para que sejamos abertos à sua graça, à sua verdade e à sua missão
de bondade e misericórdia, que se destina a todos, sem excluir ninguém.
Papa Francisco
(Angelus , 8 de julho de 2018)
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