DOMINGO X DO TEMPO COMUM
As leituras
deste domingo centram-nos na qualidade da nossa relação com Deus. A história,
que nos é contada, ajuda-nos a perceber que Deus sempre nos quis felizes e que
nos deu todas as condições para o sermos. Mas o sentido de toda a liturgia vai muito mais longe, pois revela-nos que, mesmo quando queremos ser tanto, ou
mais do que Deus, e, afinal, acabamos por nos descobrir sós, frágeis e nus, aí
Deus vem em nosso auxílio e socorre-nos dando-nos, como penhor da nossa
salvação, a vida do Seu único e muito amado Filho. É assim que Deus responde à
nossa fragilidade e fraqueza, com um amor infinito por cada um de nós,
condenando o pecado, mas amando o pecador.
A
1ªleitura (Gen 3, 9-15) projeta-nos para o nosso dia a dia, para a forma como,
num mundo conturbado e com valores estranhos e confusos como o nosso,
permanecemos, ou não, numa comunhão de amor com Deus e com os irmãos. As
tentações são mais que muitas, mas o segredo para sermos felizes, continua a
ser o mesmo, ontem, hoje, ou amanhã: confiar em Deus Pai, Filho e Espírito
Santo, Amor infinito por todos e cada um, que nos habita e nunca, mas nunca
mesmo, nos abandona. Descansemos a nossa cabeça no Seu peito e deixemo-nos
amar por Ele.
"Depois
de Adão ter comido da árvore, o Senhor Deus chamou-o e disse-lhe: «Onde
estás?». Ele respondeu: «Ouvi o rumor dos vossos passos no jardim e, como
estava nu, tive medo e escondi-me». Disse Deus: «Quem te deu a conhecer que
estavas nu? Terias tu comido dessa árvore, da qual te proibira comer?». Adão
respondeu: «A mulher que me destes por companheira deu-me do fruto da árvore e
eu comi». O Senhor Deus perguntou à mulher: «Que fizeste?». E a mulher
respondeu: «A serpente enganou-me e eu comi». Disse então o Senhor Deus à
serpente: «Por teres feito semelhante coisa, maldita sejas entre todos os
animais domésticos e todos os animais selvagens. Hás de rastejar e comer do pó
da terra todos os dias da tua vida. Estabelecerei inimizade entre ti e a
mulher, entre a tua descendência e a descendência dela. Esta há de atingir-te
na cabeça e tu a atingirás no calcanhar»."
Na
2ªleitura (2 Cor 4, 13 – 5, 1) S.Paulo leva-nos a refletir sobre a certeza que
devemos ter na ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo. S.Paulo não tem
dúvida alguma, é esse o testemunho que nos dá, para que também nós, e os que
hão de vir depois das nossas gerações, acreditemos. Acreditando na ressurreição
de Jesus, então vivamos com a esperança de que também, um dia, n’Ele havemos de
ressuscitar.
“Irmãos: Diz a
Escritura: «Acreditei; por isso falei». Com este mesmo espírito de fé, também
nós acreditamos, e por isso falamos, sabendo que Aquele que ressuscitou o
Senhor Jesus também nos há de ressuscitar com Jesus e nos levará convosco para
junto d’Ele. Tudo isto é por vossa causa, para que uma graça mais abundante
multiplique as ações de graças de um maior número de cristãos para glória de
Deus. Por isso, não desanimamos. Ainda que em nós o homem exterior se vá
arruinando, o homem interior vai-se renovando de dia para dia. Porque a ligeira
aflição dum momento prepara-nos, para além de toda e qualquer medida, um peso
eterno de glória. Não olhamos para as coisas visíveis, olhamos para as
invisíveis: as coisas visíveis são passageiras, ao passo que as invisíveis são
eternas. Bem sabemos que, se esta tenda, que é a nossa morada terrestre, for
desfeita, recebemos nos Céus uma habitação eterna, que é obra de Deus e não é
feita pela mão dos homens.”
O
evangelho (Mc 3, 20-35) fala-nos, tal como a primeira leitura, do pecado, mas
não fica por aí, pois diz-nos que a forma de vencermos o mal é fazermos a
vontade de Deus. Se assim fizermos, também seremos da Sua família, Seu irmão,
Sua irmã e Sua mãe, é o que Jesus nos anuncia neste evangelho.
“Naquele tempo, Jesus chegou a casa com os seus discípulos. E de novo acorreu tanta gente, que eles nem sequer podiam comer. Ao saberem disto, os parentes de Jesus puseram-se a caminho para O deter, pois diziam: «Está fora de Si». Os escribas que tinham descido de Jerusalém diziam: «Está possesso de Belzebu», e ainda: «É pelo chefe dos demónios que Ele expulsa os demónios». Mas Jesus chamou-os e começou a falar-lhes em parábolas: «Como pode Satanás expulsar Satanás? Se um reino estiver dividido contra si mesmo, tal reino não pode aguentar-se. E se uma casa estiver dividida contra si mesma, essa casa não pode durar. Portanto, se Satanás se levanta contra si mesmo e se divide, não pode subsistir: está perdido. Ninguém pode entrar em casa de um homem forte e roubar-lhe os bens, sem primeiro o amarrar: só então poderá saquear a casa. Em verdade vos digo: Tudo será perdoado aos filhos dos homens: os pecados e blasfémias que tiverem proferido; mas quem blasfemar contra o Espírito Santo nunca terá perdão: será réu de pecado para sempre». Referia-Se aos que diziam: «Está possesso dum espírito impuro». Entretanto, chegaram sua Mãe e seus irmãos, que, ficando fora, O mandaram chamar. A multidão estava sentada em volta d’Ele, quando Lhe disseram: «Tua Mãe e teus irmãos estão lá fora à tua procura». Mas Jesus respondeu-lhes: «Quem é minha Mãe e meus irmãos?». E, olhando para aqueles que estavam à sua volta, disse: «Eis minha Mãe e meus irmãos. Quem fizer a vontade de Deus esse é meu irmão, minha irmã e minha Mãe».”
Envia Senhor
sobre mim o Espírito Santo, para que eu faça a vontade de Deus.
Amados irmãos e irmãs, bom dia!
O Evangelho deste domingo
(cf. Mc 3, 20-35) mostra-nos dois tipos de incompreensão que
Jesus teve que enfrentar: a dos escribas e a dos seus próprios familiares.
A primeira incompreensão. Os
escribas eram homens instruídos nas Sagradas Escrituras e encarregados de as
explicar ao povo. Alguns deles são enviados de Jerusalém à Galileia, onde a
fama de Jesus começava a difundir-se, a fim de o desacreditar aos olhos do
povo; para desempenhar a função de linguarudos, desacreditar o outro, privar da
autoridade, que coisa feia! E eles foram enviados para fazer isto. Estes
escribas chegam com a acusação clara e terrível — eles não poupam meios, vão ao
centro e dizem o seguinte: «Ele tem Belzebu, é pelo príncipe dos demónios que
expulsa os demónios» (v. 22). Ou seja, é o chefe dos demónios que O impele; que
equivale a dizer mais ou menos: “ele é um endemoninhado”. Com efeito, Jesus
curava muitos doentes, e eles pretendem fazer crer que não o faz com o Espírito
de Deus — como fazia Jesus — mas com o do Maligno, com a força do diabo. Jesus
reage com palavras fortes e claras, não tolera isto, pois aqueles escribas,
talvez sem se darem conta, estão a cair no pecado mais grave: negar e blasfemar
o Amor de Deus que está presente e age em Jesus. E a blasfema, o pecado contra
o Espírito Santo, é o único pecado imperdoável — assim diz Jesus — porque parte
de um fechamento do coração à misericórdia de Deus que age em Jesus.
Mas este episódio contém uma
admoestação que serve a todos nós. Com efeito, pode acontecer que uma grande
inveja pela bondade e pelas boas obras de uma pessoa possa levar a acusá-la
falsamente. Há nisto um grande veneno mortal: a maldade com que, de maneira
intencional se pretende destruir a boa fama do outro. Deus nos livre desta
terrível tentação! E se, examinando a nossa consciência, nos apercebemos que
esta erva daninha está a germinar dentro de nós, vamos imediatamente
confessá-lo no sacramento da Penitência, antes que se desenvolva e produza os
seus efeitos malvados, que são incuráveis. Estai atentos, pois esta atitude
destrói as famílias, as amizades, as comunidades e até a sociedade.
O Evangelho de hoje fala-nos
também de outra incompreensão, muito diversa, em relação a Jesus: a dos seus
familiares. Eles estavam preocupados, porque a sua nova vida itinerante lhes
parecia uma loucura (cf. v. 21). Com efeito, Ele mostrava-se muito disponível
com o povo, sobretudo com os doentes e os pecadores, a ponto de não ter tempo
nem sequer para comer. Jesus era assim: primeiro as pessoas, servir o povo,
ajudar o povo, ensinar ao povo, curar as pessoas. Era para as pessoas. Não
tinha tempo nem sequer para comer. Por conseguinte, os seus familiares decidem
reconduzi-lo a Nazaré, a casa. Chegam ao lugar onde Jesus está a pregar e
mandam chamá-lo. Disseram-lhe: «Estão ali fora, Tua mãe e Teus irmãos que te
procuram» (v. 32). Ele respondeu: «Quem são Minha mãe e Meus irmãos?», e
olhando para as pessoas que estavam em seu redor a ouvi-lo, acrescentou: «Aí
estão Minha mãe e Meus irmãos. Aquele que fizer a vontade de Deus, esse é que é
Meu irmão, Minha irmã e Minha mãe» (vv. 33-34). Jesus formou uma nova família,
já não baseada nos vínculos de sangue, mas na fé n’Ele, no Seu amor que nos
acolhe e nos une, no Espírito Santo. Todos aqueles que acolherem a palavra de
Jesus são filhos de Deus e irmãos entre si. Acolher a palavra de Jesus
torna-nos irmãos entre nós, faz de nós a família de Jesus. Falar mal dos
outros, destruir a fama dos outros, torna-nos a família do diabo.
Aquela resposta de Jesus não é uma falta de respeito para com a sua mãe e os seus familiares. Aliás, para Maria é o maior reconhecimento, pois precisamente ela é a discípula perfeita que obedeceu em tudo à vontade de Deus. Que a Virgem Mãe nos ajude a viver sempre em comunhão com Jesus, reconhecendo a obra do Espírito Santo que age n’Ele e na Igreja, regenerando o mundo para a vida nova.
Papa Francisco
(Angelus, 10 de junho de 2018)
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