quarta-feira, 29 de maio de 2024

 SOLENIDADE DO SANTÍSSIMO CORPO E SANGUE DE CRISTO

A Igreja, consciente da grandeza do mistério que hoje celebramos e do significado profundo da instituição da Eucarística, introduziu, no seu calendário litúrgico, a solenidade que estamos hoje a celebrar. E fê-lo para afirmar a sua fé e o seu amor para com Cristo, presente no Santíssimo Sacramento, mas também para poder cantar, festivamente, os louvores de Deus, na Pessoa de Jesus Ressuscitado, presente na hóstia e no vinho consagrados.

Com esta celebração, a Igreja convida os seus fiéis a refletirem e a interiorizarem a riqueza do amor de Deus, oculto e manifesto na presença real de Cristo, na Eucaristia; convida-os, enfim, a dar graças a Cristo, pelo dom da sua entrega por nós: Ele é «corpo entregue»; Ele é «sangue derramado».


A primeira leitura (Ex 24, 3-8) indica-nos algumas das características da Antiga Aliança: Deus manifesta a sua divina vontade ao povo de Israel, através da mediação de Moisés; o Povo compromete-se a fazer tudo o que o Senhor disser; Moisés ergue um altar e levanta doze pedras, para significar todo o Povo (uma por cada tribo); manda imolar algumas vítimas; toma sangue dessas vítimas e, com ele, asperge o altar, as doze pedras e o Povo. Está feita a aliança: Deus falou, o Povo respondeu e o pacto foi selado com sangue. O sangue sanciona a aliança. O mesmo sangue das vítimas uniu o altar (símbolo de Deus), as doze pedras (símbolo do povo inteiro) e o próprio povo presente (que se comprometera a ser fiel à vontade divina). A partir de então estavam todos reunidos: Deus com o Povo, o Povo com Deus e os membros do Povo uns com os outros.

Mas esta aliança não passava duma simples figura simbólica: o sangue dos animais não tinha eficácia, em si mesmo, para unir os homens com Deus; apenas revelava o desejo de que isso pudesse acontecer.

(D. Manuel Madureira Dias, in Maravilhas de Deus – Homilias de um Bispo )

“Naqueles dias, Moisés veio comunicar ao povo todas as palavras do Senhor e todas as suas leis. O povo inteiro respondeu numa só voz: «Faremos tudo o que o Senhor ordenou». Moisés escreveu todas as palavras do Senhor. No dia seguinte, levantou-se muito cedo, construiu um altar no sopé do monte e ergueu doze pedras pelas doze tribos de Israel. Depois mandou que alguns jovens israelitas oferecessem holocaustos e imolassem novilhos, como sacrifícios pacíficos ao Senhor. Moisés recolheu metade do sangue, deitou-o em vasilhas e derramou a outra metade sobre o altar. Depois, tomou o Livro da Aliança e leu-o em voz alta ao povo, que respondeu: «Faremos quanto o Senhor disse e em tudo obedeceremos». Então, Moisés tomou o sangue e aspergiu com ele o povo, dizendo: «Este é o sangue da aliança que o Senhor firmou convosco, mediante todas estas palavras».”

Na 2ªleitura (Hebr 9, 11-15) S. Paulo torna mais claro para nós o mistério que hoje celebramos. Jesus, Filho Eterno do Pai, fez-se Homem no seio de Maria. Ao fazer-se homem, sem deixar de ser o Filho eterno de Deus, assumiu a capacidade de poder dar-se e entregar-se como homem, sujeitando-se à própria morte. A partir da Encarnação, Jesus, o Filho de Deus, tem poder de dar a vida e de retomá-la, ou seja, tem poder de a oferecer.

Ele, o Filho de Deus feito homem, pode derramar o seu sangue, pode dar a vida ao Pai, em favor dos homens, cuja natureza assumiu.

E Jesus realizou, de facto, tudo isto, ao dar a vida por nós, na cruz. O seu sangue humano é sangue do Filho de Deus. Foi derramado não sobre as nossas cabeças, mas sobre todo o nosso ser humano, porque Ele era humano. Não foi símbolo duma purificação que nos atingisse no exterior, mas expressão da verdadeira identidade do querer humano com o querer divino. A Aliança perfeita aconteceu! A vontade humana de Jesus identificou-se, em pleno, com a sua vontade divina.
Fomos redimidos das nossas infidelidades! Estamos salvos!

(D. Manuel Madureira Dias, in Maravilhas de Deus – Homilias de um Bispo )

“Irmãos: Cristo veio como sumo sacerdote dos bens futuros. Atravessou o tabernáculo maior e mais perfeito, que não foi feito por mãos humanas, nem pertence a este mundo, e entrou de uma vez para sempre no Santuário. Não derramou sangue de cabritos e novilhos, mas o seu próprio Sangue, e alcançou-nos uma redenção eterna. Na verdade, se o sangue de cabritos e de toiros e a cinza de vitela, aspergidos sobre os que estão impuros, os santificam em ordem à pureza legal, quanto mais o sangue de Cristo, que pelo Espírito eterno Se ofereceu a Deus como vítima sem mancha, purificará a nossa consciência das obras mortas, para servirmos ao Deus vivo! Por isso, Ele é mediador de uma nova aliança, para que, intervindo a sua morte para remissão das transgressões cometidas durante a primeira aliança, os que são chamados recebam a herança eterna prometida.”

No evangelho (Mc 14, 12-16.22-26) Jesus realizou a sua última ceia pascal com os Doze Apóstolos. Toma o pão e diz: «Isto é o meu Corpo, entregue por vós». Toma o cálice, com vinho e diz: «Este é o meu Sangue, o Sangue da nova e eterna aliança, derramado por todos».
A nossa Eucaristia é Ceia, é Aliança, é Páscoa, é Cruz, é Ressurreição, é Redenção, é identificação com a vontade de Deus, é Corpo entregue e Sangue derramado pelos homens. Por isso a verdadeira celebração da Eucaristia inclui sempre a doação de nós mesmos aos irmãos.

(D. Manuel Madureira Dias, in Maravilhas de Deus – Homilias de um Bispo )

“No primeiro dia dos Ázimos, em que se imolava o cordeiro pascal, os discípulos perguntaram a Jesus: «Onde queres que façamos os preparativos para comer a Páscoa?». Jesus enviou dois discípulos e disse-lhes: «Ide à cidade. Virá ao vosso encontro um homem com uma bilha de água. Segui-o e, onde ele entrar, dizei ao dono da casa: «O Mestre pergunta: Onde está a sala, em que hei de comer a Páscoa com os meus discípulos?». Ele vos mostrará uma grande sala no andar superior, alcatifada e pronta. Preparai-nos lá o que é preciso». Os discípulos partiram e foram à cidade. Encontraram tudo como Jesus lhes tinha dito e prepararam a Páscoa. Enquanto comiam, Jesus tomou o pão, recitou a bênção e partiu-o, deu-o aos discípulos e disse: «Tomai: isto é o meu Corpo». Depois tomou um cálice, deu graças e entregou-lho. E todos beberam dele. Disse Jesus: «Este é o meu Sangue, o Sangue da nova aliança, derramado pela multidão dos homens. Em verdade vos digo: Não voltarei a beber do fruto da videira, até ao dia em que beberei do vinho novo no reino de Deus». Cantaram os salmos e saíram para o monte das Oliveiras.”


Prezados irmãos e irmãs, bom dia!

Hoje, na Itália e noutros países, celebra-se a Solenidade do Corpo e Sangue de Cristo. O Evangelho apresenta-nos a narração da Última Ceia (Mc 14, 12-16, 22-26). As palavras e os gestos do Senhor tocam o nosso coração: Ele toma o pão nas suas mãos, pronuncia a bênção, parte-o e dá-o aos discípulos, dizendo: «Tomai, isto é o meu corpo» (v. 22).

É assim, com simplicidade, que Jesus nos concede o maior sacramento. O seu é um gesto humilde de doação, um gesto de partilha. No ápice da sua vida, não distribui pão em abundância para alimentar as multidões, mas parte-se a si mesmo na ceia pascal com os discípulos. Deste modo, Jesus mostra-nos que a meta da vida consiste em doar-se, que o mais importante é servir. E hoje encontramos a grandeza de Deus num pedacinho de Pão, numa fragilidade que transborda de amor e de partilha. Fragilidade é precisamente a palavra que eu gostaria de frisar. Jesus torna-se frágil como o pão que se parte e se esmigalha. Mas é precisamente na sua fragilidade que está a sua força. Na Eucaristia, a fragilidade é força: força do amor que se faz pequeno para ser acolhido e não temido; força do amor que se parte e se divide para alimentar e dar vida; força do amor que se fragmenta para reunir todos nós em unidade.

E há outra força que sobressai na fragilidade da Eucaristia: a força de amar quem erra. Na noite em que é traído Jesus dá-nos o Pão da vida. Concede-nos o maior dom enquanto sente no coração o abismo mais profundo: o discípulo que come com Ele, que se serve do mesmo prato, atraiçoa-o. E a traição é a maior dor para quem ama. E o que faz Jesus? Reage ao mal com um bem maior. Responde ao “não” de Judas com o “sim” da misericórdia. Não castiga o pecador, mas dá a vida por ele, paga por ele. Quando recebemos a Eucaristia, Jesus faz o mesmo em relação a nós: conhece-nos, sabe que somos pecadores e sabe que cometemos muitos erros, mas não renuncia a unir a sua vida à nossa. Sabe que precisamos disto, pois a Eucaristia não é a recompensa dos santos, não, é o Pão dos pecadores. É por isso que nos exorta: “Não tenhais medo! Tomai e comei!”.

Cada vez que recebemos o Pão de vida, Jesus dá um novo sentido às nossas fragilidades. Recorda-nos que aos seus olhos somos mais preciosos do que pensamos. Diz-nos que se sente feliz quando partilhamos com Ele as nossas fragilidades. Repete-nos que a sua misericórdia não teme as nossas misérias. A misericórdia de Jesus não tem medo das nossas misérias. E acima de tudo, cura-nos amorosamente daquelas fragilidades que não podemos curar sozinhos. Quais fragilidades? Pensemos. A de nutrir ressentimento para com aqueles que nos fizeram mal, não a podemos curar sozinhos; a de nos distanciarmos dos outros e nos isolarmos em nós mesmos, não a podemos curar sozinhos; a de nos comiserarmos e de nos queixarmos sem encontrar a paz, também não a podemos curar sozinhos. É Ele que nos cura com a sua presença, com o seu Pão, com a Eucaristia. A Eucaristia é remédio eficaz contra estes fechamentos. Com efeito, o Pão da vida cura a rigidez, transformando-a em docilidade. A Eucaristia cura porque une a Jesus: faz-nos assimilar o seu modo de viver, a sua capacidade de se partir a si mesmo e de se entregar aos irmãos, de responder ao mal com o bem. Dá-nos a coragem de sair de nós próprios e de nos debruçarmos com amor sobre as fragilidades dos outros. Como Deus faz em relação a nós. Esta é a lógica da Eucaristia: recebemos Jesus que nos ama e cura as nossas fragilidades para amar os outros e para os ajudar nas suas fragilidades. E isto, durante a vida inteira. Hoje, na Liturgia das Horas, recitamos um hino: quatro versos que são o resumo de toda a vida de Jesus. Dizem-nos que, ao nascer, Jesus se fez companheiro de viagem na vida; depois, na ceia, entregou-se como alimento; em seguida, na cruz, na sua morte, fez-se “preço”, pagou por nós; e agora, reinando nos Céus, é a nossa recompensa que vamos buscar, aquela que nos espera.

Que a Santa Virgem, em quem Deus se fez carne, nos ajude a receber com coração grato o dom da Eucaristia e a fazer também da nossa vida uma dádiva. Que a Eucaristia faça de nós um dom para os outros.

Papa Francisco

( Angelus, 6 de junho de 2021)

Festividade do Corpo de Deus - Ecclesia

sábado, 25 de maio de 2024

SOLENIDADE DA SANTÍSSIMA TRINDADE


Hoje, a Igreja está novamente em festa, pois celebra a festa do Amor, de Deus Uno e Trino. E é, neste mistério de três pessoas distintas, numa só natureza, que participamos a partir do momento em que somos batizados.  É na comunhão de Amor Divino que somos mergulhados, quando recebemos o sacramento do Batismo, passando a fazer parte da Igreja, a “esposa”, eternamente amada por Deus. É caso para dizemos que esta é a melhor forma de voltarmos ao tempo comum, de o reiniciarmos alicerçados no essencial da nossa fé, que é a verdadeira essência do nosso Deus: o Amor. Deus é todo Amor, por mim, por ti, por cada um de nós individualmente, pela humanidade inteira, pela Criação.  Em Jesus Cristo, Deus Trindade faz-Se um connosco, verdadeiramente habita-nos, por inteiro, vive em cada um de nós. Bendito e louvado seja Deus, por nos amar assim, perdidamente.

Na 1ªleitura (Deut 4, 32-34.39-40) entramos em contacto com o Deus da nossa história, fazendo memória do caminho que Deus fez com o Seu povo. Somos convidados a olhar para todas as provas do Amor do Senhor, e da Sua fidelidade, apesar de tantas infidelidades do povo de Israel, como garantia de que fará o mesmo com cada um de nós, isto é, nunca nos deixará sós, estará sempre connosco, até ao fim dos tempos, amando-nos infinitamente.

"Moisés falou ao povo, dizendo: «Interroga os tempos antigos que te precederam, desde o dia em que Deus criou o homem sobre a terra. Dum extremo ao outro dos céus, sucedeu alguma vez coisa tão prodigiosa? Ouviu-se porventura palavra semelhante? Que povo escutou como tu a voz de Deus a falar do meio do fogo e continuou a viver? Qual foi o deus que formou para si uma nação no seio de outra nação, por meio de provas, sinais, prodígios e combates, com mão forte e braço estendido, juntamente com tremendas maravilhas, como fez por vós o Senhor vosso Deus no Egito, diante dos vossos olhos? Considera hoje e medita em teu coração que o Senhor é o único Deus, no alto dos céus e cá em baixo na terra, e não há outro. Cumprirás as suas leis e os seus mandamentos, que hoje te prescrevo, para seres feliz, tu e os teus filhos depois de ti, e tenhas longa vida na terra que o Senhor teu Deus te vai dar para sempre»."

Na 2ªleitura (Rom 8, 14-17)   S.Paulo centra-nos na nossa identidade de filhos, no Filho. Somo-lo mesmo, filhos de Deus, por isso deixemo-nos abraçar por Ele e chamemos-Lhe Abá. Entreguemo-nos de coração a este amor sem limites. Deus continua enamorado da Sua Igreja, de cada um e de todos nós.

“Irmãos: Todos os que são conduzidos pelo Espírito de Deus são filhos de Deus. Vós não recebestes um espírito de escravidão para recair no temor, mas o Espírito de adoção filial, pelo qual exclamamos: «Abá, Pai». O próprio Espírito dá testemunho, em união com o nosso espírito, de que somos filhos de Deus. Se somos filhos, também somos herdeiros, herdeiros de Deus e herdeiros com Cristo; se sofrermos com Ele, também com Ele seremos glorificados.”

No evangelho (Mt 28, 16-20) Jesus dá-nos a missão de O anunciarmos nos nossos ambientes e  periferias, ou por onde nos deslocarmos, na continuidade do que disse aos Seus discípulos.

“Naquele tempo, os Onze discípulos partiram para a Galileia, em direção ao monte que Jesus lhes indicara. Quando O viram, adoraram-n’O; mas alguns ainda duvidaram. Jesus aproximou-Se e disse-lhes: «Todo o poder Me foi dado no Céu e na terra. Ide e ensinai todas as nações, batizando-as em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, ensinando-as a cumprir tudo o que vos mandei. Eu estou sempre convosco até ao fim dos tempos»”

Senhor, que o meu coração se abra à ação do Teu Santo Espírito.

Amados irmãos e irmãs, bom dia!

(...) O trecho evangélico (cf. Mt 28, 16-20) mostra-nos os Apóstolos reunidos na Galileia, «no monte que Jesus lhes tinha indicado» (v. 16). Aqui tem lugar o último encontro do Senhor Ressuscitado com os seus na montanha. A “montanha” tem uma forte carga simbólica. Numa montanha, Jesus proclamou as Bem-aventuranças (cf. Mt 5, 1-12); nas montanhas, retirou-se para rezar (cf. Mt 14, 23); ali acolheu as multidões e curou os doentes (cf. Mt 15, 29). Mas desta vez, na montanha, já não é o Mestre que age e ensina, cura, mas o Ressuscitado que pede aos discípulos para agir e proclamar, confiando-lhes o mandato de continuar a sua obra.

Investe-os da missão junto de todos os povos. Ele diz: «Ide, pois, e fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, ensinando-as a cumprir tudo quanto vos tenho mandado» (vv. 19-20). Os conteúdos da missão confiada aos Apóstolos são estes: proclamar, batizar, ensinar e percorrer o caminho traçado pelo Mestre, ou seja, o Evangelho vivo. Esta mensagem de salvação implica antes de mais o dever do testemunho - sem testemunho não se pode anunciar - ao qual também nós, discípulos de hoje, somos chamados, para dizer a razão da nossa fé. Face a uma tarefa tão exigente, e pensando nas nossas fraquezas, sentimo-nos inadequados, como certamente se sentiram os próprios Apóstolos. Mas não devemos desanimar, recordando as palavras que Jesus lhes dirigiu antes de subir ao Céu: «E Eu estarei convosco todos os dias, até ao fim do mundo» (v. 20).

Esta promessa assegura a presença constante e consoladora de Jesus entre nós. Mas como  se realiza esta presença? Através do seu Espírito, que leva a Igreja a caminhar na história como companheira de viagem de cada homem. Este Espírito, enviado por Cristo e pelo Pai, opera a remissão dos pecados e santifica todos aqueles que, arrependidos, se abrem com confiança ao seu dom. Com a promessa de permanecer connosco até ao fim dos tempos, Jesus inaugura o estilo da sua presença no mundo como  Ressuscitado. Jesus está presente no mundo mas com outro estilo, o estilo do Ressuscitado, ou seja, uma presença que se revela na Palavra, nos Sacramentos, na ação constante e interior do Espírito Santo. A festa da Ascensão diz-nos que Jesus, embora tenha subido ao Céu para habitar gloriosamente à direita do Pai, está ainda e sempre entre nós: disto deriva a nossa força, a nossa perseverança e a nossa alegria, precisamente da presença de Jesus entre nós com o poder do Espírito Santo.

Que a Virgem Maria acompanhe a nossa viagem com a sua proteção materna: dela aprendemos a doçura e a coragem de sermos,  no mundo, testemunhas do Senhor Ressuscitado.

Papa Francisco

( Regina Caeli, 24 de maio de 2020)

I Jornada Mundial das Crianças - Roma 2024 - Ecclesia


1ºDia

sábado, 18 de maio de 2024

  SOLENIDADE DE PENTECOSTES

Hoje celebramos a Festa do Pentecostes, fazemos memória do nascimento da Igreja, da descida do Espírito Santo sobre Maria Santíssima e os Apóstolos reunidos no Cenáculo. 

Para dar continuidade ao que era pedido no domingo passado, os apóstolos e nós, homens e mulheres de hoje, necessitamos de nos deixar repassar pelo Espírito Santo, que Jesus nos envia, de junto do Pai. Terminado o tempo pascal é a hora de, cheios do Espírito Santo, anunciarmos na vida, do dia a dia, no que somos e na forma como agimos: o Amor infinito de Deus, por cada ser vivente; o triunfo do Amor em Jesus que está ressuscitado, vive em nós e venceu a morte. 

Na 1ª leitura (Atos 2, 1-11) S. Lucas situa-nos num mesmo lugar, com os apóstolos, ainda cheios de medos e angústias, sem saberem o que fazer. E é neste contexto que percebemos a ação do Espírito Santo. 

É Deus que se faz ouvir, entender, por todos aqueles povos de diferentes línguas, através dos apóstolos, que se lhe entregaram, com a toda a sua fragilidade, mas também com toda a confiança. É Deus que se revela através deles e continua a manifestar-se através de outras pessoas, tendo chegado até aos dias de hoje. Façamos como os apóstolos. Agora é a nossa vez!

Subitamente, fez-se ouvir, vindo do Céu, um rumor semelhante a forte rajada de vento, que encheu toda a casa onde se encontravam. Viram então aparecer uma espécie de línguas de fogo, que se iam dividindo, e poisou uma sobre cada um deles. Todos ficaram cheios do Espírito Santo e começaram a falar outras línguas, conforme o Espírito lhes concedia que se exprimissem. Residiam em Jerusalém judeus piedosos, procedentes de todas as nações que há debaixo do céu. Ao ouvir aquele ruído, a multidão reuniu-se e ficou muito admirada, pois cada qual os ouvia falar na sua própria língua. Atónitos e maravilhados, diziam: «Não são todos galileus os que estão a falar? Então, como é que os ouve cada um de nós falar na sua própria língua? Partos, medos, elamitas, habitantes da Mesopotâmia, da Judeia e da Capadócia, do Ponto e da Ásia, da Frígia e da Panfília, do Egipto e das regiões da Líbia, vizinha de Cirene, colonos de Roma, tanto judeus como prosélitos, cretenses e árabes, ouvimo-los proclamar nas nossas línguas as maravilhas de Deus».” 

Na 2ªleitura (1 Cor 12, 3b-7.12-13) S. Paulo projeta-nos para a nossa missão de batizados no Espírito Santo. Cada batizado, que se deixa guiar por Jesus, que se deixa moldar pelo Seu Santo Espírito, que se encontra com Ele, no mais íntimo de si mesmo, porá a render os dons que o Senhor lhe confiou, para a continuação da construção do Seu Reino de Amor. Somos todos necessários ao “bem comum”, à Igreja, cada um ao seu jeito, com a sua missão. 

“Irmãos: Ninguém pode dizer «Jesus é o Senhor» a não ser pela ação do Espírito Santo. De facto, há diversidade de dons espirituais, mas o Espírito é o mesmo. Há diversidade de ministérios, mas o Senhor é o mesmo. Há diversas operações, mas é o mesmo Deus que opera tudo em todos. Em cada um se manifestam os dons do Espírito para o bem comum. Assim como o corpo é um só e tem muitos membros e todos os membros, apesar de numerosos, constituem um só corpo, assim também sucede com Cristo. Na verdade, todos nós – judeus e gregos, escravos e homens livres – Todos ficaram cheios do Espírito Santo. E a todos nos foi dado a beber um único Espírito.”

No Evangelho (Jo 20, 19-23)  somos reconduzidos ao mesmo acontecimento da 1ªleitura, só que, desta vez, por S. João, que nos centra no nascimento da Igreja, na missão que Jesus confiou aos seus apóstolos. Deixemos que o Espírito Santo continue, em nós, a missão iniciada com os primeiros apóstolos, com os que, naqueles primeiros tempos, se deixaram habitar totalmente pelo Espírito Santo de Deus. 

“Na tarde daquele dia, o primeiro da semana, estando fechadas as portas da casa onde os discípulos se encontravam, com medo dos judeus, veio Jesus, apresentou-Se no meio deles e disse-lhes: «A paz esteja convosco». Dito isto, mostrou-lhes as mãos e o lado. Os discípulos ficaram cheios de alegria ao verem o Senhor. Jesus disse-lhes de novo: «A paz esteja convosco. Assim como o Pai Me enviou, também Eu vos envio a vós». Dito isto, soprou sobre eles e disse-lhes: «Recebei o Espírito Santo: àqueles a quem perdoardes os pecados ser-lhes-ão perdoados; e àqueles a quem os retiverdes ser-lhes-ão retidos».”


"Senhor, Deus do universo, que no mistério de Pentecostes, santificais a Igreja, dispersa entre todos os povos e nações, derramai sobre a terra os dons do Espírito Santo, de modo que também hoje se renovem nos corações dos fiéis os prodígios realizados nos primórdios da pregação do Evangelho".


Prezados irmãos e irmãs, bom dia!

O livro dos Atos dos Apóstolos (cf. 2, 1-11) narra o que aconteceu em Jerusalém cinquenta dias depois da Páscoa de Jesus. Os discípulos estavam reunidos no cenáculo e com eles estava a Virgem Maria. O Senhor ressuscitado disse-lhes para permanecer na cidade até receber do alto o dom do Espírito. E isto manifestou-se com um «fragor» que, repentinamente, se ouviu vindo do céu, como um «vento impetuoso» que encheu a casa onde eles estavam (cf. v. 2). Portanto, trata-se de uma experiência real mas também simbólica. Algo que aconteceu, mas que também nos transmite uma mensagem simbólica para toda a vida.

Esta experiência revela que o Espírito Santo é como um vento forte e livre, ou seja, dá-nos força e liberdade: um vento forte e livre. Não pode ser controlado, impedido, nem medido; nem sequer se pode prever a sua direção. Não se deixa enquadrar nas nossas exigências humanas - procuramos sempre enquadrar as coisas - não se deixa enquadrar nos nossos esquemas e preconceitos. O Espírito procede de Deus Pai e do seu Filho Jesus Cristo, e irrompe na Igreja, irrompe em cada um de nós, dando vida à nossa mente e ao nosso coração. Como diz o Credo: «É Senhor e dá a vida». Tem o senhorio porque é Deus, e dá vida.

No dia de Pentecostes, os discípulos de Jesus ainda estavam desorientados e apavorados. Ainda não tinham a coragem de sair em público. E também nós, às vezes acontece, preferimos permanecer entre as paredes de proteção dos nossos ambientes. Mas o Senhor sabe chegar até nós e abrir as portas do nosso coração. Ele envia sobre nós o Espírito Santo que nos envolve e vence todas as nossas hesitações, abate as nossas defesas, desmantela as nossas falsas seguranças. O Espírito faz de nós novas criaturas, tal como fez naquele dia com os Apóstolos: renova-nos, faz de nós criaturas novas.

Depois de ter recebido o Espírito Santo, eles deixaram de ser como antes - Ele transformou-os - mas saíram, saíram sem medo e começaram a anunciar Jesus, a pregar que Jesus ressuscitou, que o Senhor está connosco, de tal modo que cada um os compreendia na própria língua. Pois o Espírito é universal, não nos priva das diferenças culturais, diferenças de pensamento, não, é para todos, mas todos o compreendem na própria cultura, na própria língua. O Espírito muda o coração, dilata o olhar dos discípulos. Torna-os capazes de comunicar a todos as grandes obras de Deus, sem limites, indo além das fronteiras culturais e religiosas com as quais estavam habituados a pensar e a viver. Torna os Apóstolos capazes de alcançar os outros, respeitando as suas possibilidades de escuta e de compreensão, na cultura e linguagem de cada um (vv. 5-11). Em síntese, o Espírito Santo coloca em comunicação pessoas diferentes, realizando a unidade e a universalidade da Igreja.

E hoje diz-nos muito esta verdade, esta realidade do Espírito Santo, onde na Igreja existem pequenos grupos que procuram sempre a divisão, separar-se dos outros. Este não é o Espírito de Deus. O Espírito de Deus é harmonia, unidade, une as diferenças. Um bom Cardeal, que foi Arcebispo de Génova, dizia que a Igreja é como um rio: o importante é permanecer dentro; não interessa se estás um pouco deste lado e um pouco do outro, o Espírito Santo faz a unidade. Ele usava a figura do rio. O importante é permanecer na unidade do Espírito e não olhar para as pequenas coisas, se estás um pouco deste lado e um pouco do outro, se rezas desta maneira ou daquela... Isto não vem de Deus. A Igreja é para todos, para todos, como mostrou o Espírito Santo no dia de Pentecostes.

Hoje peçamos à Virgem Maria, Mãe da Igreja, que interceda para que o Espírito Santo desça em abundância, encha o coração dos fiéis e acenda em todos o fogo do seu amor.

Papa Francisco

( Regina Caeli, 23 de maio de 2021)

sábado, 11 de maio de 2024

  DOMINGO VII DA PÁSCOA

ASCENSÃO DO SENHOR

As leituras do Domingo da Ascensão centram-nos, ao mesmo tempo, em duas realidades diferentes: por um lado somos convidados a contemplar a subida de Jesus aos céus, é o momento da partida, da separação; mas, por outro lado, porque Jesus foi preparando a Sua subida para o Pai, damo-nos conta de um movimento, de um impulso, para sairmos de nós próprios e, conscientes de que Ele continua connosco, “partirmos”, em conjunto com os apóstolos, a anunciar o amor de Deus a todos aqueles que, nos nossos caminhos, O procuram de coração sincero.

Na 1ªleitura (Atos 1, 1-11) também nós escutamos a pergunta feita pelos dois homens vestidos de branco: «Homens da Galileia, porque estais a olhar para o Céu? Esse Jesus, que do meio de vós foi elevado para o Céu, virá do mesmo modo que O vistes ir para o Céu». E, porque os Apóstolos continuaram a missão que Jesus lhes confiou e, assim, a Boa Nova de Jesus Ressuscitado, por nosso amor, chegou até nós, homens e mulheres do séc.XXI, recebemos, naquela refeição, mas também em cada  eucaristia em que participamos, as palavras de Jesus como missão também dirigida a cada um de nós, hoje e sempre: «mas recebereis a força do Espírito Santo, que descerá sobre vós, e sereis minhas testemunhas em Jerusalém e em toda a Judeia e na Samaria e até aos confins da terra». Que na nossa vida quotidiana sejamos testemunhas do Amor de Deus!

“No meu primeiro livro, ó Teófilo, narrei todas as coisas que Jesus começou a fazer e a ensinar, desde o princípio até ao dia em que foi elevado ao Céu, depois de ter dado, pelo Espírito Santo, as suas instruções aos Apóstolos que escolhera. Foi também a eles que, depois da sua paixão, Se apresentou vivo com muitas provas, aparecendo-lhes durante quarenta dias e falando-lhes do reino de Deus. Um dia em que estava com eles à mesa, mandou-lhes que não se afastassem de Jerusalém, mas que esperassem a promessa do Pai, «da qual – disse Ele – Me ouvistes falar. Na verdade, João batizou com água; vós, porém, sereis batizados no Espírito Santo, dentro de poucos dias». Aqueles que se tinham reunido começaram a perguntar: «Senhor, é agora que vais restaurar o reino de Israel?». Ele respondeu-lhes: «Não vos compete saber os tempos ou os momentos que o Pai determinou com a Sua autoridade; mas recebereis a força do Espírito Santo, que descerá sobre vós, e sereis minhas testemunhas em Jerusalém e em toda a Judeia e na Samaria e até aos confins da terra». Dito isto, elevou-Se à vista deles e uma nuvem escondeu-O a seus olhos. E estando de olhar fito no Céu, enquanto Jesus Se afastava, apresentaram-se-lhes dois homens vestidos de branco, que disseram: «Homens da Galileia, porque estais a olhar para o Céu? Esse Jesus, que do meio de vós foi elevado para o Céu, virá do mesmo modo que O vistes ir para o Céu».”

Na 2ªleitura (Ef 1, 17-23) S.Paulo relembra-nos a imensa graça que temos pelo facto de sermos crentes, de termos fé e o Espírito Santo nos habitar. E, quando nos reconhecemos assim amados por Deus, todo o nosso ser exclama e agradece, desejando que as outras pessoas, principalmente aquelas que conhecemos, na família, no trabalho, na nossa rua, ou que, ocasionalmente, se cruzam connosco, se sintam também assim, verdadeira e infinitamente amadas por Deus, tal qual são.

“Irmãos: O Deus de Nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai da glória, vos conceda um espírito de sabedoria e de revelação para O conhecerdes plenamente e ilumine os olhos do vosso coração, para compreenderdes a esperança a que fostes chamados, os tesouros de glória da sua herança entre os santos e a incomensurável grandeza do seu poder para nós os crentes. Assim o mostra a eficácia da poderosa força que exerceu em Cristo, que Ele ressuscitou dos mortos e colocou à sua direita nos Céus, acima de todo o Principado, Poder, Virtude e Soberania, acima de todo o nome que é pronunciado, não só neste mundo, mas também no mundo que há de vir. Tudo submeteu aos seus pés e pô-l’O acima de todas as coisas como Cabeça de toda a Igreja, que é o seu Corpo, a plenitude d’Aquele que preenche tudo em todos.” 

No Evangelho (Mc 16, 15-20) recebemos de Jesus a missão de levar o Evangelho a todo o lugar onde estivermos e/ou por onde andarmos. Não podemos deixar de o fazer, pois todos têm o direito a ser felizes, a conhecerem o quanto Deus os ama. Façamos a nossa parte.

“Naquele tempo, Jesus apareceu aos Onze e disse-lhes: «Ide por todo o mundo e pregai o Evangelho a toda a criatura. Quem acreditar e for batizado será salvo; mas quem não acreditar será condenado. Eis os milagres que acompanharão os que acreditarem: expulsarão os demónios em meu nome; falarão novas línguas; se pegarem em serpentes ou beberem veneno, não sofrerão nenhum mal; e quando impuserem as mãos sobre os doentes, eles ficarão curados». E assim o Senhor Jesus, depois de ter falado com eles, foi elevado ao Céu e sentou-Se à direita de Deus. Eles partiram a pregar por toda a parte e o Senhor cooperava com eles, confirmando a sua palavra com os milagres que a acompanhavam.” 

Envia Senhor sobre mim o Teu Santo Espírito, para que, sob a Sua ação, eu seja Tua testemunha, por onde quer que ande.

Queridos irmãos e irmãs, bom dia!

Hoje, em Itália e em muitos outros países, celebra-se a solenidade da Ascensão do Senhor. Esta festa inclui dois elementos. Por um lado, orienta o nosso olhar para o céu, onde Jesus glorificado está sentado à direita de Deus (cf. Mc 16, 19). Por outro, recorda-nos o início da missão da Igreja: porquê? Porque Jesus ressuscitado e elevado ao céu envia os seus discípulos a difundir o Evangelho por todo o mundo. Portanto, a Ascensão exorta-nos a elevar o olhar para o céu, para o dirigir logo a seguir para a terra, cumprindo as tarefas que o Senhor ressuscitado nos confia.

Eis quanto nos convida a fazer a página evangélica hodierna, na qual o evento da Ascensão vem imediatamente depois da missão que Jesus confia aos discípulos. Trata-se de uma missão incomensurável — ou seja, literalmente sem confins — que supera as forças humanas. Com efeito, Jesus diz: «Ide por todo o mundo e pregai o Evangelho a toda criatura» (Mc 16, 15). Parece deveras demasiado audaz a missão que Jesus confia a um pequeno grupo de homens simples e sem grandes capacidades intelectuais! Contudo, esta restrita companhia, irrelevante diante das grandes potências do mundo, é enviada para levar a mensagem de amor e de misericórdia de Jesus a todos os recantos da terra.

Mas este projeto de Deus só pode ser realizado com a força que o próprio Deus concede aos Apóstolo. Neste sentido, Jesus garante-lhes que a sua missão será apoiada pelo Espírito Santo. Diz: «descerá sobre vós o Espírito Santo e vos dará força; e sereis minhas testemunhas em Jerusalém, em toda a Judeia e Samaria e até aos confins do mundo» (At 1, 8). Por conseguinte, foi possível realizar esta missão, e os Apóstolos deram início a esta obra, que depois foi continuada pelos seus sucessores. A missão confiada por Jesus aos Apóstolos prosseguiu através dos séculos, e prossegue ainda hoje: ela exige a colaboração de todos nós. Com efeito, cada um de nós, em virtude do Batismo que recebeu, está habilitado por sua vez a anunciar o Evangelho. É precisamente o batismo que habilita e também nos impele a ser missionários, que anuncia o Evangelho.

A Ascensão do Senhor ao céu, enquanto inaugura uma nova forma de presença de Jesus no meio de nós, pede-nos para ter olhos e coração para o encontrar, para o servir e para o testemunhar aos outros. Trata-se de ser homens e mulheres da Ascensão, ou seja, buscadores de Cristo pelas sendas do nosso tempo, levando a sua palavra de salvação até aos confins da terra. Neste itinerário, encontramos o próprio Jesus nos irmãos, sobretudo nos mais pobres, em quantos sofrem na própria carne a dura e mortificadora experiência de antigas e novas pobrezas. Assim como inicialmente Cristo Ressuscitado enviou os seus apóstolos com a força do Espírito Santo, também hoje Ele nos envia, com a mesma força para dar sinais concretos e visíveis de esperança. Porque Jesus que nos dá a esperança, foi elevado ao céu, abriu as portas do céu e a esperança que nós para lá iremos.

A Virgem Maria que, como Mãe do Senhor morto e ressuscitado, animou a fé da primeira comunidade dos discípulos, nos ajude também a manter «elevados os nossos corações», como a Liturgia nos exorta a fazer. E, ao mesmo tempo, nos ajude a ter “os pés no chão”, e a semear com coragem o Evangelho nas situações concretas da vida e da história.

Papa Francisco

( Regina Caeli, 13 de maio de 2018)