domingo, 2 de junho de 2019

A força da gravidade que nos atrai para o alto

"Ascensão" Giotto
A ascensão é a navegação do coração, que te conduz do fechamento em ti ao amor que abraça o universo (Bento XVI). A esta navegação do coração, Jesus chama os onze, um grupinho de homens amedrontados e confusos, um núcleo de mulheres corajosas e fiéis. Desafia-os a pensar em grande, a olhar longe, a ser a narrativa de Deus «a todos os povos».
Depois condu-los para fora, rumo a Betânia, e, erguendo as mãos, abençoa-os (Lucas 24,46-53). No momento do adeus, Jesus acolhe nos braços os seus discípulos, congrega-os e aperta-os a si, antes de os enviar.

A ascensão é um ato de enorme confiança de Jesus naqueles homens e mulheres que o seguiram durante três anos, que não entenderam muito, mas que muito o amaram: confia à sua fragilidade o mundo e o Evangelho, e abençoa-os.
É o seu gesto definitivo, a última imagem que nos resta de Jesus, uma bênção sem palavras, suspensa para sempre entre Céu e Terra.
Enquanto os abençoava, separou-se deles e foi levado para o Céu. Jesus não foi para longe ou para o alto, para qualquer canto remoto do cosmos. Elevou-se para a profundidade das coisas, para o íntimo da criação e das criaturas, e de dentro prime como bênção, força ascensional para uma vida mais luminosa.
Não existe no mundo só a força de gravidade para baixo, mas também uma força de gravidade para o alto, que nos faz erguidos, que faz verticais as árvores, as flores, a chama, que levanta a água das marés e a lava dos vulcões. Como uma nostalgia de céu.
Com a ascensão, Jesus sobe à profundeza das criaturas, inicia uma navegação no coração do universo, o mundo é batizado, isto é, imergido em Deus. Se apenas fosse capaz de me dar conta disto e de disto me alegrar, descobriria a sua presença em todo o lado, caminharia pela Terra como dentro de um único sacrário, num batismo infinito.
Lucas conclui, de surpresa, o seu Evangelho, dizendo: os discípulos voltaram a Jerusalém com grande júbilo. Em vez disso, deviam estar tristes, acabava uma presença, foi-se embora o seu amor, o seu amigo, o seu mestre. Mas a partir daquele momento, sentem dentro de si um amor que abraça o universo, capaz de dar e receber amor - amei cada coisa com o adeus (Marina Cvetaeva).
Os discípulos veem em Jesus que o homem não acaba com o seu corpo, que a nossa vida é mais forte que as suas feridas. Veem que um outro mundo é possível, que a realidade não é só isto que se vê, mas abre-se sobre um “além”; que em cada sofrimento, Deus inseriu centelhas de ressurreição, clarões de luz no escuro, fissuras nos muros das prisões. Também nós vemos que fica comigo «o meu Deus, perito em evasões» (M. Marcolini).
Ermes Ronchi 

Fonte: Avvenire 
Trad.: Rui Jorge Martins 
Imagem: "Ascensão" (det.) | Giotto 
Publicado no site da "Pastoral da Cultura" em 30.05.2019

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