DOMINGO XXIV DO TEMPO COMUM-2025-ANO C
FESTA DA EXALTAÇÃO DA SANTA CRUZ
A Igreja celebra hoje a festa da Exaltação da Santa Cruz. Somos convidados à contemplação e meditação diante da cruz, já não como instrumento do suplício e da tortura, mas sim como instrumento de salvação... A Cruz já transformada pela Páscoa... A Cruz que fala do Amor louco de Deus e da sua vitória sobre as forças do mal... A Cruz como uma árvore, uma árvore sobre a qual Jesus morre e sobre a qual renasce o primeiro nascido dentre os mortos. É uma árvore que dá fruto. É a árvore da vida nova.
Na 1ª leitura (Num21,4b-9) vemos, como o
modo de reagir, do povo de Israel, às provações sofridas durante a caminhada da
saída do Egito até alcançarem a Terra Prometida, por vezes surgiu sob a forma
de revolta contra Deus e contra Moisés. Foi preciso que Moisés orasse e
intercedesse pelo povo ao Senhor, que acolhe sempre os corações arrependidos.
“Naqueles dias, o povo de Israel impacientou-se e
falou contra Deus e contra Moisés: «Porque nos fizeste sair do Egito, para
morrermos neste deserto? Aqui não há pão nem água e já nos causa fastio este
alimento miserável». Então o Senhor mandou contra o povo serpentes venenosas que
mordiam nas pessoas e morreu muita gente de Israel. O povo dirigiu-se a Moisés,
dizendo: «Pecámos, ao falar contra o Senhor e contra ti. Intercede junto do
Senhor, para que afaste de nós as serpentes». E Moisés intercedeu pelo povo. Então
o Senhor disse a Moisés: «Faz uma serpente de bronze e coloca-a sobre um poste.
Todo aquele que for mordido e olhar para ela ficará curado». Moisés fez uma
serpente de bronze e fixou-a num poste. Quando alguém, era mordido por uma
serpente, olhava para a serpente de bronze e ficava curado.”
“Cristo Jesus, que era de condição divina, não Se valeu da sua igualdade com Deus, mas aniquilou-Se a Si próprio. Assumindo a condição de servo, tornou-Se semelhante aos homens. Aparecendo como homem, humilhou-Se ainda mais, obedecendo até à morte e morte de cruz. Por isso Deus O exaltou e Lhe deu um nome que está acima de todos os nomes, para que ao nome de Jesus todos se ajoelhem no céu, na terra e nos abismos, e toda a língua proclame que Jesus Cristo é o Senhor, para glória de Deus Pai.
O evangelho de João (Jo 3, 13-17) é a continuação do encontro com Nicodemos, em que Jesus lhe tinha dito que,
para entrar no Reino dos céus, seria preciso renascer de novo. Este diálogo com
Nicodemos ajuda-nos a compreender melhor o evangelho de hoje. Ao contemplar
a Cruz reconhecemos quão grande e infinito é o Amor de Deus por cada um de nós,
pela Criação inteira, a ponto de Jesus Se ter entregue para nos salvar. Só Tu,
que nos conhece intimamente, nos podes amares assim, tão loucamente! Obrigada
Senhor! Bendito e louvada sejas Senhor, hoje e sempre, pelos séculos sem fim!
"Naquele tempo, disse Jesus a
Nicodemos: «Ninguém subiu ao Céu senão
Aquele que desceu do Céu: o Filho do homem. Assim como Moisés elevou a
serpente no deserto, também o Filho do homem será elevado, para que
todo aquele que acredita tenha n’Ele a vida eterna. Deus amou
tanto o mundo que entregou o seu Filho Unigénito, para que todo o
homem que acredita n’Ele não pereça, mas tenha a vida eterna. Porque Deus não enviou o seu Filho ao mundo para condenar o mundo, mas
para que o mundo seja salvo por Ele»."
Senhor, meu Deus, que eu nunca duvide do Teu Amor!
A cruz é um
patíbulo de morte, mas, neste dia de festa, celebramos a exaltação da Cruz de
Cristo. Porque, naquele madeiro, Jesus tomou sobre Si o nosso pecado e o mal do
mundo, e derrotou-os com o seu amor. É por isso que fazemos festa hoje. A
Palavra de Deus que escutamos narra-nos isso mesmo, contrapondo, por um lado,
as serpentes que mordem e, por outro, a serpente que salva. Detenhamo-nos sobre
estas duas imagens.
Em primeiro
lugar, as serpentes que mordem. Atacam o povo, que se deixou cair
mais uma vez no pecado da murmuração. Murmurar contra Deus não significa apenas
falar mal e lamentar-se d’Ele; quer dizer também, e mais profundamente, que, no
coração dos israelitas, esmoreceu a confiança n’Ele, na sua promessa. Com
efeito, o povo de Deus encontrava-se a caminhar no deserto rumo à Terra
Prometida e sente-se dominado pelo cansaço, não suporta a viagem (cf. Nm 21, 4).
Então desanima, perde a esperança e, a certa altura, é como se esquecesse a
promessa do Senhor: aquelas pessoas já não têm a força de acreditar que é Ele
quem guia o seu caminho para uma terra rica e fecunda.
Não é por
acaso que o povo, tendo-se esgotado a confiança em Deus, acaba mordido por
serpentes que matam. Eles lembram-se da primeira serpente de que fala a Bíblia
no livro do Génesis: o tentador que envenena o coração do homem para o fazer
duvidar de Deus. De facto o diabo, precisamente sob a forma de serpente,
enfeitiça Adão e Eva, gera neles a desconfiança convencendo-os de que Deus não
é bom, antes é invejoso da sua liberdade e felicidade. E agora, no deserto,
voltam as serpentes, «serpentes ardentes» (Nm 21,
6);
isto é, volta o pecado das origens: os israelitas duvidam de Deus, não se fiam
d’Ele, murmuram, rebelam-se contra Aquele que lhes deu a vida e, assim, vão ao
encontro da morte. Eis aonde leva a desconfiança do coração!
Queridos
irmãos e irmãs, esta primeira parte da narração pede para vermos atentamente os
momentos da nossa história pessoal e comunitária nos quais veio a faltar a
confiança no Senhor e entre nós. Quantas vezes estiolamos, desanimados e
impacientes, nos nossos desertos, perdendo de vista a meta do caminho! Aqui, no
Cazaquistão, também existe o deserto que, a par da paisagem esplêndida que nos
oferece, fala-nos simultaneamente do cansaço, da aridez que às vezes trazemos
no coração: são os momentos de cansaço e de prova, em que já não temos forças
para olhar para cima, olhar para Deus; são as situações de vida pessoal,
eclesial e social em que somos mordidos pela serpente da desconfiança,
injetando em nós os venenos da desilusão e do desconsolo, do pessimismo e da
resignação, fechando-nos no nosso eu, apagando o entusiasmo.
Mas, na
história desta terra, não faltaram outras mordeduras dolorosas: penso nas
serpentes ardentes da violência, da perseguição ateísta, penso naquele caminho
por vezes conturbado durante o qual foi ameaçada a liberdade do povo e ferida a
sua dignidade. Faz-nos bem guardar a recordação daquilo que sofremos: certas
brumas, é preciso não as cancelar da memória; caso contrário, pode-se pensar
que sejam água passada e que o caminho do bem esteja delineado para sempre. E
não! A paz nunca está conquistada duma vez por todas; há de ser conquistada
cada dia, como também a convivência entre etnias e tradições religiosas
diversas, o desenvolvimento integral, a justiça social. E, para que o
Cazaquistão cresça ainda mais «na fraternidade, no diálogo e na compreensão
(...) para “lançar pontes” de cooperação solidária com os outros povos, nações
e culturas» (S. João Paulo
II, Discurso na cerimónia de boas-vindas,
22/IX/2001), há necessidade do empenho de todos. E ainda antes há
necessidade dum renovado ato de confiança no Senhor: olhar para cima, olhar
para Ele, aprender com o seu amor universal e crucificado.
Passamos assim
à segunda imagem: a serpente que salva. Enquanto o povo vai
morrendo por causa das serpentes ardentes, Deus escuta a oração de intercessão
de Moisés e diz-lhe: «Faz para ti uma serpente abrasadora e coloca-a num poste.
Sucederá que todo aquele que tiver sido mordido, se olhar para ela, ficará
vivo» (Nm 21,
8).
De facto, «quando alguém era mordido por uma serpente e olhava para a serpente
de bronze, vivia» (21,
9).
Poderíamos, porém, interrogar-nos: porque é que Deus, em vez de dar estas
instruções laboriosas a Moisés, não destruiu simplesmente as serpentes
venenosas? Este modo de proceder revela-nos o seu modo de agir perante o mal, o
pecado e a difidência da humanidade. Então como agora, na grande batalha
espiritual que habita a história até ao fim, Deus não aniquila as baixezas que
o homem segue livremente: as serpentes venenosas não desaparecem, continuam a
existir; estão à espreita, sempre podem morder. Que mudou então? Que faz Deus?
Jesus
explica-o no Evangelho: «Assim como Moisés ergueu a serpente no deserto, assim
também é necessário que o Filho do Homem seja erguido ao alto, a fim de que
todo o que n’Ele crê tenha a vida eterna» (Jo 3,
14-15).
Eis aqui a viragem! Chegou entre nós a serpente que salva: Jesus, elevado no
poste da cruz, não permite às serpentes venenosas, que nos assaltam, não lhes
permite levar-nos à morte. Perante as nossas baixezas, Deus aponta-nos uma nova
altura: se mantivermos o olhar voltado para Jesus, as mordeduras do mal já não
nos podem dominar, porque Ele, na cruz, tomou sobre Si o veneno do pecado e da
morte, e aniquilou a sua força destruidora. Aqui temos o que fez o Pai perante
a propagação do mal no mundo; deu-nos Jesus, que Se aproximou de nós como nunca
poderíamos ter imaginado: «Aquele que não havia conhecido o pecado, Deus O fez
pecado por nós» (2
Cor 5, 21). Tal é a grandeza infinita da
misericórdia divina: Jesus que Se «fez pecado» em nosso favor, Jesus que na
cruz – poderíamos dizer – «Se fez serpente» a fim de que, olhando para Ele,
possamos resistir às mordeduras venenosas das serpentes malignas que nos
assaltam.
Irmãos e
irmãs, esta é a estrada, a estrada da nossa salvação, do nosso renascimento e
ressurreição: olhar para Jesus crucificado. Daquela altura, podemos ver de
maneira nova a nossa vida e a história dos nossos povos. Porque, a partir da
Cruz de Cristo, aprendemos o amor, não o ódio; aprendemos a compaixão, não a
indiferença; aprendemos o perdão, não a vingança. Os braços abertos de Jesus
são o abraço de ternura com que Deus nos quer acolher. E mostram-nos a
fraternidade que somos chamados a viver entre nós e com todos. Indicam-nos o
caminho, o caminho cristão: não o da imposição e constrição, da força e da
exuberância; nunca o que levanta a cruz de Cristo contra outros irmãos e irmãs
por quem Ele deu a vida! É outro o caminho de Jesus, o caminho da salvação: é
o caminho do amor humilde, gratuito e universal, sem «se» nem «mas».
Sim, porque, no madeiro da cruz, Cristo tirou o veneno à serpente do mal, e ser cristão significa viver sem venenos: não nos mordermos entre nós, não murmurar, não acusar, não criticar os outros, não disseminar as obras do mal, não poluir o mundo com o pecado e a desconfiança que vem do Maligno. Irmãos e irmãs, renascemos do lado aberto de Jesus na cruz: não haja em nós qualquer veneno de morte (cf. Sab 1, 14). Pelo contrário, rezemos para que, pela graça de Deus, possamos tornar-nos cada vez mais cristãos: testemunhas alegres de vida nova, de amor, de paz.
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