A minha reflexão, mês a mês, sobre cada livro.
1º livro - Mês de Outubro de 2015 - "Nascemos e Jamais Morreremos" de Cristiana Paccini e Simone Troisi
Em termos gerais o livro
marcou-me porque realça como é possível viver de Deus no meio das maiores
dificuldades e sofrimento. Outro aspeto interessante é que se trata de um casal
que vive em pleno séc. XXI. É de hoje e
não de antigamente e ainda por cima bastante jovem.
Mais do que tudo o que
verdadeiramente me impressionou foi a forma como foram crescendo no amor entre
eles e no amor a Deus.
Dá para comentar que é através do
exemplo de pessoas (casais) como estas que se pode entrever o quanto Deus ama
cada um de nós.
Se este casal se amou tanto, isto
é, se se amaram tanto entre si e aos outros com quem conviveram, como será o
amor de Deus por nós!
Por outro lado gostei de
constatar que não são só os padres, as religiosas, a hierarquia da Igreja que
são chamados a viver de Deus no concreto das sua vidas, mas que todos os
cristãos seja qual for a sua situação, podem amar totalmente a Deus no momento
da sua existência.
Por fim não posso deixar de me
referir ao título do livro: "Nascemos e jamais morreremos", pois
creio, no mais profundo do meu coração que todos os que vão partindo permanecem
vivos na eternidade de Deus e fazem mesmo a comunhão connosco.
2º livro - Mês de Novembro de 2015 - "Preço A Pagar Por Me Tornar Cristão" de Joseph Fadelle
Em termos gerais, este livro é um tributo a todos os que sofreram, ou estão a sofrer ainda hoje, ao serem perseguidos, porque amam Jesus e desejam que Ele seja conhecido e amado por toda a humanidade. É também de realçar a intervenção daqueles que, ao longo do caminho, correndo riscos incalculáveis, se predispõem a ajudar os que buscam a Deus. Esta parte da vida de Massoud é impressionante e há momentos, que nos são apresentados, que nem ouso comentar, por aquilo que podem representar, não só para os cristãos, mas para toda a família humana. Ficou também bem vincada, em mim, a força, a perseverança, de quem corre por e com Cristo. Apetece-me exclamar como S. Paulo, na epístola aos romanos, “nada nos pode separar do amor de Deus”.
Obrigada por ter escolhido este livro! Valeu.
Mais em pormenor realço as seguintes passagens:
Pág.22 – “O que me espanta
mais … é sobretudo a capacidade de ouvir a minha história com uma atenção pouco
habitual…” Mais do que as palavras, a capacidade de acolhimento do outro, o
amor com que se escuta o que nos é dito, é que toca o coração.
Pág.24/pág25 – “Já leste o
Alcorão?”…”Mas leste mesmo?” Estranha
esta pergunta quando feita a um muçulmano. E, no entanto, o coração de Massoud
começa a mudar a partir da leitura aprofundada do Alcorão. Quantas vezes
cumprimos rituais sem conhecermos os princípios, os fundamentos da fé que
professamos! Também nos podiam pôr a mesma questão a nós, cristãos: já
leste/escutaste, no teu coração, os Evangelhos? Mas leste mesmo?
Pág.32 – “Neste
marasmo…continuo a crer em Alá, na sua bondade…, maior do que o próprio Alcorão
e do que Maomé…”. Deus é sempre o fundamento e, penso eu, crer n’Ele é a
certeza de estarmos no bom caminho.
Pág35 – “Pousando sobre mim
um olhar de uma doçura infinita…Para atravessares o ribeiro precisas de comer o
pão da vida.” Este momento impressiona sobretudo por aquilo que vai representar
na vida deste muçulmano.
Pág.36/37/38 – Esta páginas,
no seu todo, são sublimes, são um alimento para a alma. Revelam a descoberta de
Deus Amor, enamorado da sua criatura mais preciosa - o ser humano. Massoud faz
a experiência do encontro com Deus Amor e expressa de uma forma tão bela o que
sente! É quando uma alma se encontra assim com Deus, no mais íntimo de si
mesma, que se dá uma tal transformação no seu ser, que leva a encetar uma
caminhada que só pode terminar no encontro face a face com Deus, acho eu.
3º livro - Mês de Dezembro de 2015 - Carta Pastoral "Maria, Mãe de Ternura e de Misericórdia" de D. António Marto
Em
relação ao livro do mês de dezembro do nosso clube de leitura, começo por
considerar que foi feliz a escolha desta temática para o tempo do Advento e,
ainda mais importante, foi o poder enquadrar este “livro” no Ano Santo da
Misericórdia, pois permite-nos refletir sobre a Mensagem de Fátima à luz do que se vive na Igreja também nos dias
de hoje. Nesta linha de leitura, realço a seguinte frase do bispo de
Leiria-Fátima: “O
grande protagonista do acontecimento Fátima é o próprio Deus misericordioso”
Analisando
alguns aspetos, mais em pormenor, começo
por selecionar esta frase, pois ajuda-nos a posicionar a nossa devoção a Nossa
Senhora “O nosso amor a Maria é
muito mais do que uma mera devoção sentimental; é, antes,
a contemplação da beleza do amor misericordioso de Deus por nós, pela
humanidade dispersa que Ele quer reunir; é a contemplação da beleza da Igreja
como Povo do Senhor, de que ela é membro eminente e mãe amorosa; e da beleza da
vida com Cristo, de quem ela foi mãe e primeira e perfeita discípula.”
Passo
ao nº18, em que é realçada a ligação
da mensagem de Fátima à Eucaristia “É este mistério de amor misericordioso que celebramos na
Eucaristia e que está no centro da espiritualidade de Fátima, seja na adoração
eucarística seja na Comunhão reparadora, para, na união com Cristo, vivermos a
orientação da nossa vida e renovar o sim da oferta de nós mesmos a favor dos
outros.”
Saliento
também o nº26 em que me agradou
bastante o facto de a mensagem sobre Nossa Senhora ter sido centrada em Jesus
Cristo, com a citação do papa Paulo VI “Cristo veio a nós por Maria, recebemo-lo dela; se
queremos pois ser verdadeiros cristãos, devemos reconhecer a relação essencial
e vital que une Nossa Senhora a Jesus e que nos abre o caminho que a Ele conduz”.
Gostei
especialmente do nº28 pela forma
feliz como D.António Marto sintetiza, de uma forma muito bela e profunda, o
papel de Maria como figura e modelo da Igreja em toda a sua vivência
espiritual, mas também concretizada em cada dia: “Maria: modelo da Igreja discípula crente, que acolhe com fé e põe em
prática a Palavra de Deus; da Igreja mãe, cuja missão é tornar Cristo vivo nos
corações dos fiéis; da Igreja virgem na fidelidade de todo o coração ao
Senhor; da Igreja orante no louvor e ação de graças como Maria
no Magnificat e no
cenáculo; da Igreja profeta anunciadora
da Palavra e da justiça; da Igreja oferente, que faz da própria vida e
missão uma entrega a Deus e caminho de santificação como Maria na apresentação
de Jesus no templo e junto à cruz; da Igreja peregrina no meio das tribulações a caminho da
Pátria da bem-aventurança; da Igreja do Espírito do Pentecostes, animada, unida e guiada por Ele na sua
comunhão e missão; da Igreja missionária, em
saída, como na Visitação a Isabel, para
levar a ternura e a misericórdia de Deus a todos, sobretudo aos pobres e aos
aflitos lembrados no Magnificat (Cf.
MC 16-22).”
Foi muito bom redescobrir a Mensagem de
Fátima. Obrigada ao sr. Bispo da diocese de Leiria-Fátima, que escreveu a
mensagem pastoral e ao sr. Pe. José Alves, que nos motivou para a sua leitura.
4º livro - Mês de Janeiro de 2016 - "Francisco - de Roma a Jerusalém" de Henrique de Cyberman e Jorge Reis-Sá
Em termos gerais gostei do
livro, pela forma como os vários aspetos da visita do Papa Francisco a Jerusalém
nos são apresentados: seja pela escolha de um verbo para alguns dos temas
escolhidos pelos autores, seja pela indicação do nome da pessoa que proferiu as
palavras selecionadas por Henrique e Jorge. Ainda, falando na globalidade, uma
das razões que me fez gostar do livro foi o tom próximo com que nos foram
contando o que, por certo, mais os marcou em toda a viagem. Fizeram-no de tal
forma que me senti como se estivesse a viajar com eles e a desejar que o Papa
Francisco consiga encontrar, com a ajuda de todos, os caminhos que levem a paz,
um dia, também àquelas paragens. Foi envolvente a leitura deste livro.
Particularizando:
Pág.24 – Verbo estar –
“Cansado, vencido pela idade e pela cúria Bento XVI renunciou”…”Mas sem ele sem
a sua abnegação, a igreja continuaria imersa na praça, fechada nas colunas, em
redor do obelisco em movimentos circulares e sem ousar que um par de gaivotas
se levantasse do telhado” – Não concordo
totalmente com esta conclusão, mas considero também que o ato de abdicação do
papa Bento XVI foi um marco de viragem na história da igreja e que revela um
amor imenso à igreja e a Deus por parte do papa emérito.
Pág.34 –– “Com a unção do
Espírito a nossa humanidade é marcada pela santidade de Jesus Cristo e
tornamo-nos capazes de amar os irmãos com o mesmo amor com que Deus ama
…Peçamos ao Pai que nos unja para nos tornarmos plenamente seus filhos,
configurados cada vez mais a Cristo, a fim de nos sentirmos todos irmãos e,
assim, afastarmos de nós rancores e divisões e nos podermos amar
fraternalmente.” - Este é, para mim, um
dos desafios mais importantes e
prementes que o papa Francisco lança a cada cristão. Lembro-me sempre de ele
ter dito, logo no início do seu pontificado, que se devia dizer das nossas
comunidades o que se comentava em relação aos primeiros cristãos “vede como
eles se amam”. A forma como se amavam uns aos outros era a sua marca.
Pág.35 - Palavras do papa
Francisco – “Pedimos ao Espírito Santo que prepare os nossos corações para o
encontro com os irmãos, independentemente das diferenças de ideias, língua,
cultura, religião; que unja todo o nosso
ser com o óleo da sua misericórdia, que cura as feridas dos erros, das
incompreensões, das controvérsias; pedimos à graça que nos envie, com humildade
e mansidão, pelas sendas desafiadoras, mas fecundas, da busca da paz.” – Esta oração agradou-me especialmente porque
nos mete dentro do processo de construção da paz, digamos que é preciso que nós
nos envolvamos e deixemos Deus agir através de nós.
Pág.37 – Verbo preparar – “Da
outra margem vemos um homem de branco, sozinho, procurando Cristo nas águas e
dentro de si. E pedindo Àquele que o guia que lhe dê forças para continuar a
tentar estender a paz a quem a procura – mesmo que ainda o não saibam porque a dor e a guerra lhe tolhem a
clareza.” – Parece-me que este excerto do
livro encerra o espírito fundamental desta visita do papa a Jerusalém,
trabalhar pela paz naquela região, sabendo de antemão que é difícil, mas
acreditando também que é o que todos aqueles homens querem e que vale a pena
tentar.
Pág.40 – Verbo tornar – Sabe-se
pecador e sabe também que o perdão de Deus não acaba. Que todos os dias lho
devemos pedir, porque todos os dias Ele no-lo dará. «Deus nunca se cansa disso.
Nós é que nos cansamos de pedir perdão» - Este,
para mim, é o segredo do papa Francisco: acreditar verdadeiramente no Amor de
Deus por cada ser por Ele criado.
Pág.43 – Francisco
compadece-se dos outros porque também ele viu passar tanto por si. …«O limite
do homem, como diz, é a dor. Mas a procura é a de plenitude e felicidade»
- Percebe-se,
a partir destes acontecimentos passados com o padre Jorge Bergoglio, que é
também da escola da vida que o papa Francisco traz muito do que diz e do como
faz.
Pág 45 – Palavras de Alícia
– “Ele é um homem de Deus, porque se envolveu muitíssimo com os que mais
sofrem. Lembro-me sempre de quando fomos ao hospital pediátrico, onde estão os
doentes terminais. Foi uma das vezes que o vi com um maior gesto de tristeza,
de sensibilidade. Dizia que não tinha explicação perante a morte de uma
criança. Momentos muito fortes…” – Este
episódio da vida do papa revela a sua dimensão humana e, vê-lo assim, ajuda-nos
a perceber o quanto deve sofrer quando vê a situação de tantas crianças hoje em
dia. Daí a forma como fala de tantas injustiças que ocorrem nos nossos tempos.
Pág.52/53 – Gostei de como o papa agradece tanto às autoridades
da Jordânia a forma como foi recebido, como também todo o trabalho feito a
favor dos refugiados, e ainda a assistência prestada pelas instituições da
Igreja naquela parte do mundo. É bom ver como se dirige aos jovens e pede para
serem artífices construtores da paz, pedindo-lhes mesmo para oferecerem a Deus
as suas fadigas diárias como oração pela paz.
Pág.62/63/64 – Destaco estas páginas, pois nelas se reflete
todo o amor e carinho que tem pelas crianças, nas quais vê o sinal da presença
de Deus, como no menino nascido em Belém: “O menino Jesus, nascido em
Belém, é o sinal dado por Deus a quem esperava a salvação, e permanece para
sempre o sinal da ternura de Deus e da sua presença no mundo”. Mas para o papa Francisco as crianças são
ainda sinal de diagnóstico da saúde: da família, da sociedade, do mundo
inteiro.
Pág.113 - Palavras do papa
Francisco –“Um peregrino é uma pessoa que se faz pobre, que se põe a caminho,
propende para uma grande e suspirada meta, vive da esperança de uma promessa
recebida. …Não podemos jamais considerar-nos autossuficientes, senhores da
nossa vida; não podemos limitar-nos a ficar fechados, seguros nas nossas
convicções. Diante do mistério de Deus somos todos pobres, sentimos que devemos
estar prontos para sair de nós mesmos, dóceis à chamada que Deus nos dirige,
abertos ao futuro que Ele quer construir para nós.” – A tudo isto só posso dizer “Ámen” e louvar a Deus porque continua a
fazer maravilhas nas pessoas de hoje, neste caso através do papa Francisco.
Pág.131 + pág.133 – Verbo
chorar - “Francisco tem nele o cansaço de saber que em cada homem há um mundo
inteiro. E quando se perde um homem, perde-se a imagem e semelhança de Deus.
Quando se perdem seis milhões pela morte e muitos pelo crime que fizeram,
perde-se Deus. «Adão, onde estás?»”. – Perante
a morte de tantos homens, ontem, hoje e sempre, só podemos chorar. Que o Senhor
tenha compaixão de nós e nos ilumine para encontrarmos a melhor forma de
contribuir para o fim de tantas situações de morte nos nossos dias.
Pág.159 - Palavras do papa
Francisco – “Todos nós estamos expostos ao pecado, ao mal, à traição. Sentimos
a desproporção entre a grandeza da chamada de Jesus e a nossa pequenez, entre a
sublimidade da missão e a nossa fragilidade humana. Mas o Senhor, na sua grande
bondade e infinita misericórdia, sempre nos toma pala mão, para não nos
afogarmos no mar do acabrunhamento. Ele está sempre do nosso lado, nunca nos
deixa sozinhos. “ – Como Deus no ama
infinitamente. Obrigada Senhor por nos amares assim!
Pág.161 - Palavras do papa
Francisco – Esta página, toda ela, é uma catequese sobre o Cenáculo que nos
recorda : o serviço no lava-pés; o sacrifício na Eucaristia; a despedida do
Mestre e a promessa do reencontro; a mesquinhez, a curiosidade e a traição; a
partilha, a fraternidade, a harmonia e a paz; o nascimento da nova família – a
Igreja; o horizonte do ressuscitado e da Igreja.
E
fico-me por aqui…
5º livro - Mês de Fevereiro de 2016 - "Orando em Verso" de Joaquim Mexia Alves
Pessoalmente não tenho um
gosto especial pelos livros de poesia e quando o sr.pe. José Alves nos propôs,
para o mês de fevereiro, a leitura de um livro de poesia não fiquei muito
entusiasmada. Para mim, a maioria dos poetas, usa uma linguagem que recorre a
imagens que têm muitos sentidos e, por via disso, obrigam a um exercício de raciocínio
que não tem exatamente a ver com o que desejo quando leio um livro deste género. Mesmo assim aceitei o desafio e parti ao encontro de “Orando em Verso” de
Joaquim Mexia Alves.
Em termos globais, gostei do
que li. Os primeiros poemas foram-me introduzindo no estilo do autor e abrindo
o espírito para a parte final. Os poemas que mais apreciei estão, mais ou
menos, a meio do livro, fundamentalmente a partir da página 83. Porquê? Porque me foram revelando uma alma que se
abriu ao Senhor e se lhe entrega dia a dia, dentro de todos os problemas e
alegrias que a vida comporta. Enraizado no seu amor a Deus, o autor partilha
connosco, o que é para ele viver de Deus em situações que nos transportam para
a nossa própria vida, para vários dos acontecimentos com que nos debatemos
tantas vezes e ajuda-nos a entregarmo-nos a Deus Amor em todos esses momentos. Usa
uma linguagem poética, é certo, mas muito clara e bela. Percebe-se muito bem.
Fala ao coração de quem busca Deus no quotidiano da vida.
Mais em pormenor destaco os
poemas “Quem é o maior nos Reino dos Céus?”;
“Mestre que eu veja” ; “O Teu nome Senhor”; “Eucaristia”; “Quaresma”;
“Pés peregrinos”; “Onde está Deus?”; “Meu Deus e meu Senhor”; “Envergonhado”;
“Entraste na minha vida”; ”Cântico branco” e “A luz pequenina”. Em todos, de uma forma, ou de outra, senti-me
irmanada com o autor em muitas das vivências que partilha com o leitor. É bom
darmo-nos conta que Deus faz uma história de amor com cada um que ousa
abrir-lhe o coração de par em par. Este, do meu ponto de vista, é um livro de
alguém que no percurso da sua vida fez, no mais íntimo do seu coração, a
experiência do encontro com Jesus, pois o que diz, e a forma como o exprime,
soam a verdadeiro, a fé vivenciada, experimentada. O meu muito obrigada ao
autor por esta partilha de vida.
6º livro - Mês de Março de 2016 - "Da Cruz ao Sol Nascente" de José Alves Martins, S.J.
Iniciei a leitura deste
livro com uma expetativa diferente do habitual, pois a história de Timor,
fundamentalmente o ano de 1991, liga-se afetivamente com Portugal e trouxe-me à
memória vivências ainda muito presentes, ligadas ao grupo de Jovens de Porto de
Mós “AMICIDEI”.
Impressão geral:
Não sei se foi por ter
partido da ligação, que então criei com este país distante, que à medida que
fui avançando na leitura do livro do mês, mais fui sentindo que o autor me
transmitia um sentimento de dor e de sofrimento demasiado sofrido e sem
esperança. A realidade da guerra é sempre terrível, dramática, suja e feia.
Tudo o que nos conta traduz esta realidade.
Percebi também que viveu
toda uma vida dedicada ao povo de Timor, mas não me dei conta, na forma como transmite
os factos que vivenciou, da alegria com que, por certo, o fez, pois tem que
haver muito amor nesta entrega de si mesmo.
Análise mais em pormenor:
De tudo o que nos foi contado
realço “O Massacre de Santa Cruz” (pág 115-121), pois lembro-me perfeitamente
das imagens do massacre, então passadas na televisão portuguesa e que agora,
depois de ler o livro, sei que foram “colhidas pelo jornalista inglês Max Stahl
em condições muito perigosas e arriscadas. Foi, quando escutei a ave-maria,
rezada em português, lá tão longe, num país encravado num domínio da religião
islâmica, que me deixei envolver no movimento de solidariedade pelo povo de
Timor, que percorreu o nosso país de Norte a Sul. Por tudo isto senti com mais
intensidade, com mais emoção, tudo o que o Pe. José Alves Martins relata sobre
o que se passou nesse dia. É caso para agradecer ao jornalista que, mesmo com
tantas dificuldades, correndo tantos riscos, fez chegar ao mundo inteiro uma
parte do tanto que sofreu aquele povo.
Registo também alguma
frases, pois embora escritas no contexto do livro, ajudam-me no meu viver de
cada dia.
Pag. 139 – “É necessário
saber esperar. A hora de Deus chega sempre. Nada é definitivo neste mundo. Tudo
é provisório e passageiro.”
Pág. 195 – “Nos momentos
mais angustiantes e nos momentos mais alegres perguntava: O que significa isto?
Qual a mensagem de Deus para mim? Estou convencido desta realidade: Deus
fala-nos através da nossa história pessoal, dos nossos fracassos e sucessos…”
Pág.197 – “Cada um de nós
possui quatro vocações. A primeira é o chamamento que Deus faz a cada criatura,
chamando-a pelo nome… Vem a seguir a vocação cristã. …A terceira vocação é o
modo como me quero realizar como criatura e como filho de Deus. Chamo à quarta
vocação a minha vocação pessoal, isto é,
eu quero assumir um determinado estado de vida como o melhor para mim: à
vida consagrada ou ao estado matrimonial…”
Pág.199 – De facto só
percebemos a voz de Deus que fala, que passa como suave brisa, quando nos
colocamos à porta da gruta da nossa alma, como Elias no Monte Horeb. Todos os
esquemas teológicos, todos os livros cheios de sabedoria espiritual, nada nos
dizem se não experimentamos Deus.”
7ºlivro -Mês de Abril de 2016 - "O Hipopótamo de Deus" de José Tolentino Mendonça
Em
termos gerais:
Este
não é um livro como os outros, que nos foram propostos no clube de leitura
cristã, pelo Sr. Pe. José Alves, porque é escrito em pequenos textos, crónicas,
de uma, duas, ou três páginas e não como uma só temática do princípio ao fim. Cada
um desses textos, por si só, conduz a uma reflexão, daí a dificuldade em fazer
um comentário único, por isso em termos gerais só posso dizer, que gostei muito,
mesmo muito, do que li. Primeiro é a linguagem fresca, linda, bela. Neste livro
o autor explora, reflete, partilha a vida nos seus mais diversos aspetos. Escreve
de uma forma que ao mesmo tempo que cativa, desinquieta, faz refletir,
questionar. Depois, em todas as crónicas/textos, que fazem parte deste livro, leva
o leitor a ir mais longe, a deixar-se surpreender pela novidade que cada
momento da vida nos traz, a estar disponível para escutar, redescobrir o outro,
a deixar-se amar por Deus em cada situação do dia a dia. É um livro que desafia
a viver na esperança, na descoberta contínua do amor de Deus em todos os
momentos da vida. Leva a redescobrir a alegria de viver, a louvar a Deus pelo
dom da vida, pera maravilha da criação, pelos momentos bons e maus, enfim por
tudo.
Divinal! Obrigada sr.padre José Alves por nos ter proposto, no mês
de Abril, a leitura deste livro.
Mais
em pormenor:
Destaco
excertos que me marcaram profundamente, ou porque me fizeram viajar na minha
história pessoal, ou porque com eles estou em sintonia, ou ainda porque são um
desafio para ousar ir mais além.
Págs
39-40 – “Primeiro os cristãos regressam à condição de «pequeno rebanho». Com a
evaporação de um cristianismo que se transmitia geracionalmente por herança
inquestionada, os cristãos voltam a sê-lo por decisão pessoal, uma decisão
muitas vezes em contracorrente, maturada de modo solitário em relação aos
círculos mais imediatos de pertença. Já não é de modo previsível que nos
tornamos cristãos. Isso acontece e acontecerá cada vez mais como uma opção e
uma surpresa. Depois, à medida que se assiste a um enfraquecimento das Igrejas
no horizonte da sociedade, redescobrimos o valor e as possibilidades de uma
presença discreta no meio do mundo. Em tantas situações nesta diáspora cultural
onde estamos semeados, a única palavra verosímil é a do testemunho de uma vida
vivida com simplicidade e alegria no seguimento de Jesus.
E,
em terceiro lugar,…Os cristãos são chamados a viver a amizade como um ministério.
«Isto é o que vos ordeno: amai-vos uns aos outros como eu vos amei»”
Pág.42
– “A história contada faz mais do que refletir uma coisa: a essência nela
apostada perdura, habita-a por dentro. Por isso é que o que nós contamos volta
continuamente a ser uma força.”
Pág.46
– “«Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste?» Contemplamos neste grito o
mistério de Deus e o do Homem, no mais devastador silêncio que o mundo
conheceu. Contudo, é no lancinante silêncio que sucede ao seu grito que reside
a revelação pascal de Deus. “
Pág.47
– “O Cristianismo é também um sobressalto de infinito, paixão pelo absoluto,
uma epifania que nos transcende, uma inexplicável emoção que nos derruba nos
caminhos de Damasco que são o de todas as vidas”
Pág
56 – Citando o papa Francisco – “ Hoje é fundamental o diálogo ético, mas de um
ética com bondade. Tenho pânico dos defensores de um ética sem bondade.”
Pág.59-60
– “Jesus Cristo, sendo verdadeiramente homem, abre o Homem à possibilidade de
Deus. Reconfigura, assim o nosso plano histórico. Rasga o finito ao infinito,
abrindo portas no coração de cada homem para uma história maior. Potencia uma
vida humana onde aquilo que pensamos serem coisas relativas, como o amor, a
justiça, o bem e a beleza, podem ser vividas em absoluto, ou como patamares do
absoluto… O que fez foi inscrever na história a possibilidade do divino. O
divino é o elemento mais transformador e inssureto da História.”
Pág.64
– “O que os cristãos celebram na Páscoa é isso: como é que um destino que se
consuma da maneira aparentemente mais fracassada se torna fonte de uma
sabedoria referencial e inesgotável.”
Pág.66
– “A oração atualiza a certeza de que somos ouvidos, acolhidos, abraçados… Na
oração não ficamos apenas a olhar para Deus, mas o Espírito Santo ajuda-nos aí
a que nos olhemos ( a nós próprios e ao mundo!) com os olhos de Deus.
Pág.
69 – 70 “ Todas as vidas cabem na imagem quotidiana do pão que se parte e
reparte. As vidas são coisas semeadas, crescidas, maturadas, ceifadas,
trituradas, amassadas: são como o pão. Não apenas degustamos e consumismo o
mundo: dentro de nós vamos percebendo que o tempo também nos consome, nos gasta
nos devora. Somos uma massa que quebra, uma espessura que diminui. A questão é
saber com que sentido e intensidade vivemos esse tráfico inevitável. Todos nos
gastamos, certo. Mas em que comércio? Todos sentimos que a vida se parte. Mas
como tornar esse facto trágico numa afirmação fecunda e plena da própria
vida?... A Eucaristia…,é, na verdade o lugar vital da decisão sobre o que fazer
da vida. Todas as vidas são pão, mas nem todas são Eucaristia, isto é, oferta
radical de si, entrega, doação serviço. Todas as vidas chegam ao fim, mas nem
todas vão até ao fim no parto dessa utopia (humana e divina) que trazem
inscrita.”
“…
O silêncio do Sábado Santo é o nosso silêncio que Jesus abraça. O silêncio dos
impasses, das travessias, dos sofrimentos, das íntimas transformações. Jesus
abraça o silêncio desta sôfrega indefinição que somos entre já e ainda não.”
Pág.71
– Sobre os mistérios de Deus: “Entra apenas. Permanece até ao fim. E sai
mudado”
Pág.79
– “O nascimento humano de Deus inaugura, porém, um esperançoso contraciclo: a
nossa vida deixa de explicar-se como uma marcha do nascimento para a morte,
para efetivar-se na imagem de um incessante renascer. Contemplando a manjedoura
do Deus Menino, qualquer que seja a nossa idade e o peso dos anos, sentimos
como real aquele verso de Pedro Homem de Mello: «A minha (a nossa) infância
ainda não morreu».”
Pág.102-103
– “É preciso contrapor à experiência do mal uma sabedoria enriquecida pela
meditação interior, que dialogue com as transformações pelas quais passamos. O
modelo talvez seja realmente o dos trabalhos do luto. O luto é a aprendizagem
gradual da perda até senti-la dentro de nós como possibilidade de reencontro.
Chegarmos a sentir, por exemplo, que a morte dos que amamos ainda pode gerar
vida, no sentido de que não nos perdemos deles, mas continuamos a crescer e a
maturar conjuntamente, só que de maneira diferente. O luto, quando bem vivido,
é um trabalho espiritual, uma mudança qualitativa que nos entreabre a um outro
entendimento da vida. Em relação ao mal precisamos disso: aprender que a
experiência do mal não é uma faca que nos decepa a vida. Progressivamente, e
sublinhe-se aqui a importância da progressividade, podemos ir percecionando que
a experiência do mal não acarreta necessariamente a destruição de nós próprios.
Tornamo-nos então capazes de semear de novo, apesar de tudo e contra tudo o que
aconteceu. A ampliação da vida e o seu florescimento estão prontos para
acontecer.”
Pág.106-107
– (relativamente a um conto Raymond Carver) “O que aprecio nele é sobretudo
mostrar como as cenas da vida quotidiana, mesmo as mais dramáticas, nos podem
abrir aos grandes espaços da experiência interior. As palavras criam um clima
de acolhimento e escuta. O alimento consola, enxuga as lágrimas. Dentro das
personagens acontece uma espécie de ressurreição. De facto quando a gente
aceita que mesmo sobre aquilo que nos parece imperdoável há mais do que um
ponto de vista, ou quando compreendemos que, em grande parte das situações,
mais do que premeditação o que existe é ignorância, então estamos prontos para
encontrar perdão nos nossos corações. Torna-se finalmente claro que o conforto
que falta à nossa vida é bem mais pequeno do que supomos. Basta-nos o conforto
de atravessar, ao lado de outro, a nossa noite e assistir aí, esperançados, à
chegada da manhã.
Pág.125
– “O «ato gratuito» é um gesto que nos salva. Uma das mais belas orações que
conheço foi aquela encontrada entre os pertences pessoais de um judeu, morto
num campo de concentração. Diz o seguinte: «Senhor, quando vieres na tua glória,
não te lembres somente dos homens de boa vontade, lembra-te também dos homens
de má vontade. E, no dia do Julgamento, não te lembres apenas das crueldades e
violências que praticaram: lembra-te também dos frutos que produzimos por causa
daquilo que eles nos fizeram. Lembra-te da paciência, da coragem, da
confraternização, da humildade, da grandeza de alma e da fidelidade que os
nossos carrascos acabaram por despertar em cada um de nós. Permite então,
Senhor, que os frutos em nós despertados possam servir também para salvar esses
homens.”
Pág.
149 - "O outono não é,
portanto, o fim da história. Se o soubermos agarrar, é sim um ponto de partido
avançado, que nos permite essa coisa urgente que é a «transfiguração» da vida,
através de um paciente e esperançoso trabalho interior.”
Pág.151 – "Acredito num Deus que dança:
isto é, num Deus que não se isenta do devir, nem permanece neutral em relação
às nossas histórias. Acredito num Deus imiscuído, engajado, detetável até pelo
impreciso radar dos sentidos, suscetível de ser invocado pelos motores de busca
das nossas persistentes interrogações ou do nosso silêncio. Deus não está
unicamente para lá da fronteira do pensável e do dizível: está também aquém;
nós vivemos no espanto interminável da sua presença; e as nossas palavras, por
pobres que sejam, constituem pontes de corda lançadas sobre a amplidão do seu
mistério"
Pág. 153 -”Crer num Deus que dança implica
reconhecê-lo suspenso da corda das vítimas de todos os tempos, pregado ao
silêncio do sofrimento injustificável, amordaçado por todas as formas de
violência que se abatem sobre o Homem. Crer num Deus que dança é crer que na
nossa noite, entregues à solidão e aos seus terrores, nós não estamos sós. Como
não estamos sós na ronda da nossa esperança. Deus faz da sinfonia inacabada do
nosso júbilo a primeira palavra da sua alegria.
Pág.164- "Acho maravilhoso encontrar em
Deus a Trindade, essa relação de amor a três. É algo que encontramos justamente
no desejo de viver de cada um de nós. Assumimos aí o nosso papel no interior de
uma situação triangular: pai, mãe, filho. ... O facto de remontar à Trindade,
ou seja, aos três desejos divinos circundantes, é extraordinário, pois foi
assim que fomos concebidos."
Pág.185 – “Se a vida não decorre como
imaginamos, baixamos as persianas e preferimos não vivê-la. Ora, se não estamos
dispostos a aprender com a sabedoria dos pequenos passos e com a dinâmica do
provisório, dificilmente alcançaremos o segredo da alegria.
Pág.187 – “Muitas vezes achamos que precisamos
de mais isto e aquilo, quando, no fundo, precisamos é de aprender a tornar
fecundo o nosso ponto de partida (seja ele qual for).
Pág.190 – “Ouvir é oferecer um ombro, onde o
outro possa colocar a mão, para rapidamente se levantar. Ouvir é colaborar
amigavelmente num processo de discernimento cuja palavra derradeira cabe sempre
à liberdade do próprio. Mas podermos ser escutados, até ao fundo e até ao fim,
abre, só por si, horizontes mais amplos do que aqueles que sozinhos conseguiríamos
avistar e relança-nos no caminho da confiança.
Pág.194 – “Mas, sem esperança, nenhuma
obra-prima existe.(…) Mas a esperança é que nunca pode decrescer. A semente
para frutificar precisa da mão que a atira para mais longe. O barco precisa de quem,
enamorado pela viagem, seja capaz de o ajudar a deixar a quietude ilusória do
porto. A página precisa de quem arrisque contar uma história. Nas coisas mais
pequenas como nas grandes encontramos a mesma chamada à esperança. Naquele que
é talvez o mais belo poema sobre a esperança, Charles Péguy afirma: «A fé que
mais me agrada é a esperança.» Mas conta também como a esperança espanta a
todos, até ao próprio Deus, pois ela não se funda em diagnósticos, ou garantias
prévias, ou certezas estáveis. A esperança faz-nos entrar, muitas vezes, em
contradição com as próprias evidências. Impele-nos a remar contra a feição dos
ventos. Se víssemos já distintamente o que esperamos não era necessária a
esperança. A sua condição é acender-se no meio da opacidade, dizer-se na
travessia do silêncio, tornar-se mais forte perante a fragilidade. Por isso
espanta a esperança.”
Pág.202 – Em toda a tradição bíblica o repouso é uma oportunidade privilegiada para mergulhar mais fundo, mais dentro, mais alto. É aceitar o risco de sentir a vida integralmente e de maravilhar-se com ela: na escassez e na plenitude, na imprevisibilidade dolorosa e na sabedoria confiante.
Pág.203 – Às vezes tudo o que os falta é simplesmente caminhar com outro
passo. É abrir a janela devagar, tendo consciência de que a abrimos. É
reaprender outra qualidade para um quotidiano talvez demasiado deixado às
rotinas e aos seus automatismos. É, no fundo, degustar o sabor das coisas mais
simples.
Pág.231 "...É um combate, o fulgor. É um
esforço de todos os dias, esta procura de luz, de intensidade, este desejo de
uma cintilação na paisagem baça e opaca que, tantas vezes, parece ser a única
que nos resta. O fulgor abre-nos uma compreensão maior do próprio tempo.
Liga-nos ao que está mais adiante ou mais fundo. Rompe brechas. Faz-nos
teimosamente repetir: «Não pode ser só isto .»"
Pág.259 – “A liturgia é ação total. Romano
Guardini escreveu que só entenderemos a liturgia cristã se nos aproximarmos
dela como uma criança se abeira de um brinquedo. Isto é se mergulharmos
completamente e com todos os sentidos (naturais e sobrenaturais) em pura
apropriação e deleite. A liturgia inscreve-nos numa visualidade específica, num
tato e num sabor. Inicia-nos na efusão sagrada dos aromas. E é, plenamente,
audição, leitura, performance acústica, momento jubilatório da linguagem.
Pág.261 – Abraham Joshua Heschel - «Onde há uma
centelha de vida há um culto silencioso. O mundo está sempre a unir-se em
adoração. O homem é o cantor do universo e na sua vida revela-se o segredo da
oração cósmica. Cantar significa advertir e afirmar que o espírito é real e a
glória presente. O canto, e em particular o canto litúrgico, não é apenas um
ato de expressão da alma humana; é também um modo de fazer descer o espírito à
terra.»
Pág.263 - «É mais difícil crer do que não
crer», anotou Flannery O´Connor. «Mais lágrimas são choradas por súplicas
atendidas do que por aquelas que o não são» garantia Teresa de Ávila.
“É muito mais duro crer” e “A rapariga de
Amesterdão” levaram-me a descobrir Mary
Flannery O’Connor e Esther (Etty) Hillesum, dois seres de eleição que dão
testemunho de como é possível viver de Deus nas condições mais adversas, mais
inconcebíveis. Cada uma ao seu jeito, viveram verdadeiramente o Evangelho.
Fiquei com vontade de ler mais sobre a
vivência de cada uma delas. Não conhecia nenhuma. Foram uma maravilhosa descoberta.
Louvado seja Deus nos seus anjos e nos seus santos!
8º livro - Mês de Maio de 2016 - "O Diário de Anne Frank"
Em termos gerais:
Já
tinha lido o livro antes, com, mais ou menos, a idade de Anne, mas ao relê-o, agora, tantos anos
depois, o livro voltou a marcar-me pela forma como Anne torna presente essa
época tão negra da nossa História, que foi não só a guerra de 1939-1945, como
também e, pior ainda, o nazismo e o ambiente envolvente.
Gosto
da forma como Anne escreve, fá-lo de uma forma simples e clara e, quase sempre,
com um discurso muito bem organizado, no encadeamento das ideias. Tem
parágrafos que encantam pela beleza e, sentido de humor, com que descreve as
situações.
À
medida que vamos avançando nos dias, acompanhamos a transformação da criança
numa jovem mulher, com valores muito bem definidos e uma capacidade de análise
de comportamentos, de crítica (e autocrítica) e de sentido de justiça notáveis.
Como é que, nas condições que ela descreve, consegue ir formando a sua
personalidade, alicerçando-a em alguns valores tão importantes e, ao mesmo
tempo, tão contra a corrente do que se vivia no Anexo, é para mim uma
incógnita. Do que conta, acho que encontrou muitas das ideias que defende na
grande quantidade de livros que leu, mas a opção final foi dela. É espantosa a
transformação no construir do seu “ser pessoa”, a que vamos assistindo, ao
longo do diário.
De
tudo o que li realço a capacidade que Anne revela para: se adaptar a situações tão
adversas, sem se revoltar; apreciar a vida; aproveitar tudo para celebrar a
alegria de viver; ver um sentido positivo em tudo o que acontece; ter sempre
esperança; valorizar a dignidade humana; revelar o sentido de Deus em variadíssimas
situações.
A
guerra é sempre horrível! Sinto-me mais próxima dos refugiados depois de reler
este livro. O meu muito obrigada a Anne Frank.
Mais em pormenor:
Destaco
alguns dos excertos de que mais gostei e que revelam um pouco da pessoa e do
pensar de Anne Frank
Pág.267/268
-Enquanto isto existir – pensei -, este sol e este céu limpo, e enquanto eu
puder apreciá-lo, como é que posso estar triste?
O
melhor remédio para os que estão assustados, sós, ou infelizes é sair para a
rua, para um lugar onde possam estar sozinhos, a sós com o céu, a natureza e
Deus. Pois nessa altura, e só nessa altura, se consegue sentir que tudo é como
devia ser e que Deus quer que as pessoas sejam felizes, entre a beleza e a
simplicidade da natureza
Pág.268
– Esta manhã, quando estava sentada em frente da janela, olhando longa e
demoradamente para Deus e para a natureza, senti-me feliz, pura e simplesmente
feliz. Peter, enquanto as pessoas conseguirem sentir esse tipo de felicidade
dentro de si próprias, a alegria da natureza, da saúde e de muito mais, serão
sempre capazes de recapturar essa felicidade.
Pág.268
– Riquezas, prestígio, tudo isso se pode perder. Mas a felicidade no nosso
coração pode apenas ser ofuscada; estará sempre lá, enquanto vivermos, para nos
fazer felizes.
Pág.336 - Quando escrevo, consigo libertar-me das preocupações. A
minha dor desaparece, o meu espírito reanima-se. Mas, e esta é a grande
questão, conseguirei alguma vez escrever algo grande, tornar-me-ei algum a vez
uma escritora ou uma jornalista? Espero
que sim, oh, espero mesmo, porque
escrever permite-me registar tudo, todos os meus pensamentos, ideais e
fantasias.
Pág.372
- -Porquê esta guerra? Oh, porque é que as pessoas não conseguem viver juntas
em paz? Porquê esta destruição? A pergunta é compreensível, mas até agora
ninguém conseguiu encontrar uma resposta satisfatória… Não acredito que a guerra seja simplesmente
obra dos políticos e capitalistas. Oh, não, o homem comum é igualmente culpado,
se assim não fosse, as pessoas e as nações há muito que se teriam rebelado! Há
nas pessoas uma ânsia destrutiva, a ânsia da cólera, de assassinar e matar…
Tenho
estado muitas vezes em baixo, mas nunca desesperada. Encaro a nossa vida no
esconderijo como uma aventura interessante, cheia de perigo e romance, e cada
privação como uma adição divertida para o meu diário.
Pág.373
- Todos os dias me sinto a amadurecer,
sinto a libertação a aproximar-se, sinto a beleza da natureza e a bondade das
pessoas que me rodeiam. Todos os dias penso em como é fascinante e divertida
esta aventura! Com tudo isto, porque hei de desesperar?
Pág.407
– Ainda amamos a vida, ainda não esquecemos a voz da natureza, e continuamos
com esperança, com esperança de … tudo.
Pág.422
– Acredito que, no decorrer do próximo século, a noção de que o dever da mulher
é ter filhos mudará e dará lugar ao respeito e à admiração por todas as mulheres
que carregam os seus fardos sem queixumes nem grandes palavras pomposas!
Pág.429
– Os que não o sabem terão de descobrir por experiência própria que « uma
consciência tranquila dá força»!
9º livro - Mês de Junho de 2016 - "Etty Hillesum" - Um itinerário espiritual de Paul Lebeau
Em termos gerais:
Gostei
do livro, porque desvenda muito do que foi a tragédia do holocausto nazi, mas
também, e principalmente, porque é o retrato vivo de que é possível amar a Deus
e aos outros, mesmo quando tudo desaba à nossa volta e parece que só imperam o
ódio, a inveja, o egoísmo, a intriga, a opressão e o desespero. Aí, onde o mal
se impõe, Etty mostra como se vive amando, louvando, orando e celebrando a
vida.
Impressiona,
é desinquetante, a forma como Etty, podendo esconder-se e libertar-se do
sofrimento infligido ao povo judeu, se oferece para estar em Westerbork (local
de transição para os campos de extermínio), e aí ajudar e acompanhar no
sofrimento, na perseguição, todos os seus irmãos condenados ao extermínio,
apenas e só porque são judeus, como ela. Luta mesmo com os amigos, que a querem
esconder, para poder estar no meio dos seus que estão a sofrer.
Mas
o que me tocou, no mais profundo de mim mesma, foi a forma como Etty conseguia
olhar para os soldados alemães e ver neles, para além do carrasco, o ser humano
que tinha família, que tinha sentimentos, que amava os seus, que era também um
filho de Deus. Etty transmite-nos a verdadeira dimensão do amor, que toca o
divino, e em Deus alcança todo e qualquer ser vivo, seja cristão, judeu,
muçulmano, ou de outra qualquer religião, pois, seja quem for, trata-se de um
ser criado por Deus, à sua imagem e semelhança. Indescritível, como é que num
campo de morte se atinge uma dimensão do amor desta natureza! Só em Deus isto é
possível.
Há
épocas, na história da humanidade, demasiado negras. Mas, neste livro, o que
mais ressalta é a luz interior desta mulher, que descobre Deus, no mais íntimo
de si mesma e O transmite aos que com ela convivem, ou se cruzam. Tem
expressões de uma enorme profundidade e também de uma beleza cintilante.
Foi
pena não termos lido mesmo o diário de Etty, pois, embora a seleção, feita pelo
autor, pareça ótima, não deixa de ser uma visão condicionada pela opinião de
quem leu o texto original. Se fosse outra pessoa a ler o diário de Etty,
provavelmente teríamos um livro bem diferente. Mas, mesmo assim gostei muito do
livro, só que fiquei com o desejo de ler o texto original do diário de Etty.
Mais em pormenor:
Destaco
alguns dos excertos de que mais gostei e que revelam um pouco da pessoa e do
pensar de Etty Hillesum:
"O amor não é, em primeiro lugar, dar-se, unir-se a
alguém... É a ocasião única de amadurecer, de tomar forma, de cada um se
tornar, ele próprio, um mundo para o amor do ser amado (...). Este amor que
preparamos, lutando arduamente: duas solidões que se protegem, se completam, se
limitam, se inclinam uma diante da outra" Etty Hilessum - pag. 81
"Ainda
que eu fale as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver amor, sou como um
bronze que soa ou um címbalo que retine. Ainda que eu tenha o dom da profecia e
conheça todos os mistérios e toda a ciência, ainda que eu tenha tão grande fé
que transporte montanhas, se não tiver amor, nada sou. (...) O amor é paciente,
o amor é prestável, não é invejoso, não é arrogante nem orgulhoso, nada faz de
inconveniente, não procura o seu próprio interesse, não se irrita nem guarda ressentimento..." (1ºcor 13,1-5)
E que
se passa em mim, enquanto estava a ler este texto? Ainda não o posso expressar
bem. Tinha a impressão de que uma varinha mágica batia na superfície endurecida
do meu coração e dela fazia irromper nascentes escondidas. E ali estava eu,
como que liberta, subitamente de joelhos junto da minha mesinha, enquanto o
amor me percorria por inteiro, liberta da inveja, dos ciúmes, das
antipatias..." Etty Ellisum, Um itinerário espiritual, pag. 85
"Acho que vou fazê-lo: todas as manhãs, antes de me pôr
ao trabalho, dedicar uma meia hora a «voltar-me para o interior», a ouvir o que
se passa em mim…O homem é corpo e espírito. Meia hora de ginástica e meia hora
de "meditação" podem fornecer uma boa base de concentração para o dia
todo. "…"Criar no interior de si mesmo uma grande e vasta planície
desimpedida de gravetos manhosos que barram a vista, esse deveria ser o
objetivo da meditação. Deixar entrar um pouco de "Deus" em si, como há um pouco de "Deus"
na Nona de Beethoven. Deixar entrar em si também um pouco de "Amor"…,
mas um amor do qual se consegue transpor alguma coisa para a modesta prática
quotidiana. " Etty Ellisum, Um itinerário espiritual, pag. 130
"De facto a minha vida é um hineinhorche contínuo, em mim mesma, nos
outros, em Deus. E quando digo que eu “hineinhorche”,
(que eu escuto no fundo, no interior), isso quer afinal dizer que é o próprio
Deus que escuta no mais profundo de mim. O que existe de mais essencial e de
mais profundo em mim escuta o que existe de mais essencial e de mais profundo
no outro. Deus fala a Deus. " Etty Hillesum, Um itinerário espiritual,
pag. 137
"Se a paz se instalar, um dia, não poderá ser uma paz
autêntica senão na medida em que cada indivíduo fizer, em primeiro lugar, paz
consigo próprio, extirpar todo o sentimento de ódio para com qualquer raça, ou
povo, que seja. Ou ele domina esse ódio, ou o transforma em outra coisa: talvez
até, a longo prazo em amor – ou será pedir muito? Mas é a única solução. Eu
poderia continuar assim por páginas inteiras. Mas posso parar por aqui. Este
bocadinho de eternidade que trazemos em nós, podemos evoca-lo em apenas uma
palavra, tanto como em dez grossos tratados. Eu sou uma mulher feliz e canto os
louvores da vida – sim, claro! -, no ano do Senhor – e ainda e sempre – de
1942, o ano não sei quantos(?) da guerra. " Etty Hillesum, Um itinerário
espiritual, pag. 170 e 171
"Acertei as minhas contas com a
vida". Quero dizer com isso que: a eventualidade da morte está integrada
na minha vida. Olhar para a morte cara a cara e aceitá-la como parte integrante
da vida é alargar esta vida. Inversamente, sacrificar desde já à morte um
pedaço desta vida, por medo da morte e recusa de a aceitar, é o melhor meio
para conservar apenas um pequeno resto de vida mutilada, que quase nem merecia
o nome de vida. Isto pode parecer paradoxal: ninguém vive plenamente se excluir
a morte da sua vida, e quem acolher a morte no coração da sua vida amplia e
enriquece a vida" - Etty Hillesum, Um itinerário espiritual, pag. 194
"A nossa única obrigação moral é conseguir
descobrir em nós mesmos vastas clareiras de paz e alargá-las, pouco a pouco,
até que esta paz irradie sobre os outros. E quanto mais paz houver nos seres,
mais haverá também neste mundo em ebulição"
in - Etty Hillesum, Um intenerário Espiritual, pag. 205
in - Etty Hillesum, Um intenerário Espiritual, pag. 205
"Impõe-se-me cada vez mais claramente a
ideia de que o amor do próximo, de todo o ser humano que encontramos, mesmo por
acaso, de toda a "imagem de Deus", deveria prevalecer sobre o amor
fundado nos laços do sangue. Entendam-me bem, peço-vos. Bem sei que se pode
pensar que há aqui um sentimento contra-natura. Mas apercebo-me de que é ainda
demasiado difícil explicá-lo por escrito, ao passo que vivê-lo é tão simples.
Etty Hilessum, - Lebeau, Paul in Intenerário Espiritual, pag. 253
"Eu queria apenas dizer-vos: a miséria é
grande e, mesmo assim, acontece-me muitas vezes, à noite, quando o dia findo se
sumiu, atrás de mim, nas profundezas, caminhar com passo leve ao longo da cerca de arame farpado e acontece-me sentir
sempre subir do meu coração – nada posso contra isso, é assim, aquilo vem de
uma força elementar – o mesmo encantamento: a vida é uma coisa maravilhosa e
grande." Etty Hilessum, - Lebeau, Paul in Intenerário Espiritual, pag. 255
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